Agosto amazônico. Calor causticante. Sol inclemente. Uma leseira toma o corpo como
se malária fosse. Como se cardume de puraquê acertasse o corpo em cheio num
nocaute elétrico. Abrupto esporão de arraia cravado no pé bom de bola.
O suor da testa alcança o olho. Cega. Trópico. Úmido e quente.
Quente pra burro. Tal uma buceta em anseio na festa da carne. Bingo de
quermesse. Catedral do amor. Abismo de
rosas. O corpo reclama igarapé. Banho de
bubuia. O cio balbucia.
A rua do bairro distante é de terra batida. A rua é assim em todo
bairro distante, onde o esgoto viceja como se furo encarnasse. Quando o sol
derreia, bacurizinhos tomam as portas das casas de madeira. A sombra rareia. Os
adultos disputam um punhado. É assim todas as tardes.
As crianças soltam pipas, brincam de futebol, tocam campainhas de
outras casas em estado menos precário, mães e pais fazem barricadas de fofoca.
Tiram meleca do nariz. Cospem no chão. Coçam o saco, ajeitam as calcinhas, ao
menos as que usam o apetrecho. Tomam um trago de café quente.
Na rua sem saída, as casas são de madeira e cobertas por telha
Brasilit. Inferno de Dante. É a casa que
a fome possibilitou erguer. Casas de gente pobre. Humilde. Barracão de zinco,
que a lua quando alumeia toma as frestas do teto; e quando em chuva, irriga a
miséria. Casa de gente de outros mundos.
Casa de penca de filhos.
Os gitinhos se misturam com a terra. Capitães de areia e de terra.
Um exército. Celebram a vida em meio a
cães, aves, urubus e a fome. Mais urubus
que cães. A fome é robusta por estas
bandas. A fome mata. A fome não dá trégua, enquanto uma mulher vasta em toalha
mínima estende roupas no varal que fica à rua. Cães e aves convivem em harmonia.
As crianças das bandas de cá seriam anfíbios como os filhos do
Arapiuns? Os bacurizinhos da rua sem saída estão longe do rio. O rio não dista tanto assim da rua sem saída.
Na rua sem saída, sem asfalto, o esgoto corre a céu aberto. Uma escola municipal
homenageia uma família de Confederados.
Uma frutaria poderia ser montada em uma das casas. O quintal vasto
abriga açaí, carambola, jambo, manga, jaca, coco, goiaba e outras árvores que
não sei identificar. Em um canto da rua sem cercas, abundam pés de mamão,
goiaba e banana. Qualquer um é livre para apanhar. Um monte de cheiros.
A dona do quintal de muitas frutas é uma mulher baixinha. Coleciona enlaces amorosos. Pelo menos uns três. É temente a Deus. Vez em quando entoa louvores. Os netos a seguem. Todos desafinados. Os galos fazem a segunda voz.
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