No Pará, por entre as “frestas” da Lei e inépcia do estado, o crime compensa
No dia 30 de abril do corrente ano o juiz da Vara de
Execução de Pena Privativa da Comarca de Belém, Deomar Alexandre de Pinho Barroso expediu
alvará de soltura ao pistoleiro Wellington de Jesus
Silva, foragido
de justiça desde 2007. O assassino havia sido condenado por unanimidade a 29 anos de
prisão em abril do mesmo ano.
Silva somava 19 anos quando matou com três tiros de revólver
calibre 38 o dirigente sindical José Dutra da Costa (Dezinho), em Rondon do Pará,
sudeste do Pará, no dia 21 de novembro de 2000. Dezinho foi assassinado na
porta de sua casa, diante da esposa e dos quatro filhos pequenos.
Wellington de Jesus Silva foi preso por populares na ocasião da execução de Dezinho, que apesar de baleado, entrou em luta corporal com o assassino, caindo sobre o corpo dele em uma vala na rua onde morava.
Não é praxe a agilidade do setor de segurança pública e da justiça do
estado alcançar pistoleiros e a cúpula desta modalidade de crime que desde os
anos de 1980 impera no Pará sob o manto da impunidade.
Quem financiou a fuga, a subsistência, o ocultamento e advogados do
pistoleiro, que em 2019 impetraram novo processo com base em prescrição, é um elemento que intriga a família.
Na véspera do Dia das Mães, o sentimento da família do sindicalista é de perplexidade, revolta e de tensão. Maria Joel, viúva de Dezinho, após a morte do sindicalista assumiu a direção do Sindicato dos Trabalhadores Rurais em Rondon, e desde então é obrigada a andar com escolta policial por conta de ameaças de morte.
O caso Dezinho – outros envolvidos
Por intermediar a morte do sindicalista, Rogerio
Dias de Oliveira, irmão do pistoleiro, foi condenado a 16 de prisão em dezembro
do ano passado. 22 anos após a execução
do sindicalista, e 20 anos de foragido. Oliveira foi preso em Minas Gerais, provável
paradeiro de Wellington. Nestes casos, a morosidade impera.
Em 2013 o fazendeiro Lourival de Souza Costa e
seu capataz Domício de Souza Neto foram absolvidos. Em 2019 o fazendeiro Décio
José Barroso Nunes, conhecido pela alcunha de Delsão, uma espécie de “dono” da
cidade de Rondon, foi condenado a 12 anos de prisão. Todavia, responde em
liberdade. Igosmar Mariano, primo de Rogerio e Wellington encontra-se foragido.
Tulipa Negra, o grilo que motivou o crime
Dados sistematizados pela CPT de Marabá
sinalizam que no mês de junho de 2000, 150 famílias organizadas por Dezinho
ocuparam a Fazenda Tulipa Negra, uma área de 3 mil hectares, que pertenceria ao
fazendeiro Kyume Mendes Lopes.
O título da fazenda teria sido expedido pelo governo
do Pará em 1918. No entanto, o documento expedido pelo estado possuía uma área
maior, 44 mil hectares. A Tulipa Negra seria uma espécie de desmembramento desta
área.
Desde outubro Dezinho estava convencido da
falsificação do título, posto que o estado do Pará não titulava terras no ano
de 1918, em áreas no que hoje é o território de Rondon do Pará. Em resumo, a
área em disputa e vizinhança foram/são terras griladas.
Como em outras casos de sindicalistas e pares, a morte de Dezinho poderia ter sido
evitada. O estado do Pará tinha conhecimento das ameaças. Havia sido formalmente
informado pelas instituições que mobilizam a luta pela reforma agrária no
sudeste do estado.
O enredo das mortes sem fim em terras do Pará
é conhecido, impera a morosidade, negligência em
investigação, quando não conivência com os acusados em execuções e chacinas contra
os defensores da reforma agrária, meio ambiente e direitos humanos.
O livro
sobre a luta pela terra na Amazônia lançado no ano passado, projeto de extensão
da UFOPA, escrito por educadores, familiares, jornalistas e amigos de pessoas
envolvidas nestes casos, evidencia isso. Baixe AQUI
Veja o documentário sobre Dezinho produzido pelo professor Evandro Medeiros AQUI