sábado, 6 de março de 2021

Tapajós de Fato: coletivo de jovens comunicadores cria site para narrar as sagas de suas gentes

 O avanço do grande capital sobre os territórios ancestrais é um dos motivos para a criação do canal de comunicação popular. 



Pessoa, o poeta, defende que é mais belo o rio que corre na minha aldeia. E, como existem furos, paranás, igarapés e rios que correm em nossas aldeias, assentamentos da reforma agrária, unidades de conservação, territórios quilombolas, entre tantos outros, a conformar a bela e estonteante bacia Amazônica.

O rio encanta. Arapiuns, Jamanxim, Crepori, Juruena, Arapiuns, Curucu, rio das Tropas, Maicá, Tapajós, Amazonas, onde, a depender do local de partida, leva mais de dia para se alcançar o local de destino, e a imposição em experimentar variadas modalidades de transporte.  Por cá, o rio é mar.  O rio é a rua do meu lugar.

Igarapés, furos, paranás, rios e gentes que poucos que pleiteiam a instalação de grandes projetos conhecem. Não sabem do que existe para além dos rios, das florestas que os comprimem, dos peixes e outros bichos que lhe conferem vida. Ignoram os encantados, as magias, bem como a dinâmica do ciclo da lua, que guia o plantar e o pescar das gentes de cá desta margem do mundo.

E, se conhecem, demonstram-se indiferentes. Relatos e mais relatos a perder de vista aos montes seguem a mesma trilha, a invisibilidade ou a desqualificação. Relatos de religiosos, saqueadores, viajantes, naturalistas e escritores.

Nos dias de hoje, realidades estas marcadas pela pressão do grande capital, que coloca em xeque a sobrevivências dessas gentes de saberes milenares.  “É mais belo o rio que corre na minha aldeia. É mais livre e maior o rio da minha aldeia”, fraseia Pessoa. Balsas e navios de soja não sabem da ternura e vida do rio da minha aldeia. 

Em corrente inversa aos estranhos que pretendem a posse das terras ancestrais, três jovens filhos destes rios e destas gentes indígenas, campesinas e quilombolas abriram uma janela para o mundo sobre suas realidades. E, decidiram em cantar a (s) sua (s)  aldeia (s) a partir de um site de jornalismo, batizado de Tapajós de Fato.

A janela que se abriu no ano passado, tem como linhas de frente o artista, devoto do samba, Clara de Nunes e do candomblé, o publicitário Marcos Wesley.  O comunicador foi embalado em sua infância pelas pelejas sindicais da sua família na cidade de Belterra, vizinhança de Santarém, a cidade polo do oeste paraense.

Ele explica que o avanço da fronteira do grande capital sobre a região o inquietou, e junto com outros amigos resolveram em criar o canal de comunicação. Wesley integra inúmeros coletivos da região, e já assessorou o Sindicato dos Trabalhadores e das Trabalhadoras Rurais (STTR) de Santarém. Em uma prosa ligeira manifestou interesse em incrementar os seus conhecimentos com uma pós graduação em que possa refletir sobre os territórios comunais da região.  

A produção dos podcast do canal Tapajós de Fato é de responsabilidade de Isabelle Maciel. As mulheres arretadas da família servem de farol para a apresentadora do programa Voz para Todas na rádio Geração FM, da cidade de Mojuí dos Campos. A cidade, assim como Santarém e Belterra, experimenta a reconfiguração do seu território por conta do avanço do monocultivo da soja.  A emancipação feminina é a pauta preferida da jornalista.

Gabriel Siqueira é o terceiro combatente da comunicação popular do site. O estudante de jornalismo, como os demais, além de integrar coletivos de comunicação, faz parte de fronts de resistência como o Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), e do Tapajós Vivo.

Em comum, além da idade, 23 anos apenas, os jovens destoam da maioria das pessoas da sua geração. Cá, o trio mobiliza o coletivo de comunicação e empenha esforços em correr o trecho da região, em conhecer e narrar as lutas das suas gentes, e em interpretar as ameaças que nublam  a vida dos rios em que  foi criado e vive. Rios, ora, ameaçados de todas as formas pelo avanço do grande capital. Rios, suas gentes, fortunas e encantados.  

Tal experiências pretéritas, a exemplo do boletim do STTR de Santarém, Lamparina, o jornal dos movimentos populares do sudeste do Pará, o Grito da PA 150, o Jornal Resistência produzido em Belém, o Varadouro do Acre, e tantos outros, o site Tapajós de Fato tem a possibilidade de espelhar as principais pelejas das gentes ancestrais das terras, florestas e rios das bandas do Baixo Amazonas. 

A exemplo da cobertura sobre o transbordamento da bacia de rejeitos da mineração Alcoa, em Juruti. Corre, espia AQUI.

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