Marabá, sudeste do Pará. Tempo de sol. O calor é intenso. Quase insuportável. A floresta cedeu lugar ao
pasto desde idos dos anos de 1960. O Estado
financiou a destruição, a concentração da terra e da renda, toda ordem de
violência contra as populações locais, em particular camponeses.
A opção desenvolvimentista a partir do grande capital consagrou o
sul e o sudeste paraense como as mais letais do país quando o tema é a luta
pela terra. Um cenário que permanece. Assim
como a impunidade.
Na noite de ontem, 18, com um auditório lotado, Campus I da
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), filhos, filhas,
viúvas e amigos de dirigentes sindicais, defensores dos direitos humanos e do
meio ambiente celebraram os seus mortos e o bom combate realizado por eles.
A data foi selecionada por conta da passagem dos 40 anos do
assassinato do advogado Gabriel Pimenta. O defensor de camponeses foi morto
quando somava apenas 27 anos. Ele havia vencido na Justiça um fazendeiro que
desejava expropriar camponeses.
Pedro Batista, jornalista radicado em Brasília, que assina um
artigo sobre o irmão dele, João Batista, igualmente assassinado nos anos de
1980, prestigiou o evento, e exaltou a iniciativa e compromisso da universidade
pública em alinhamento com as bandeiras populares. O jornalista também é autor
de um livro sobre a trajetória de João.
Dona Maria Joel, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores e das
Trabalhadoras Rurais (STTR) de Rondon do Pará, viúva de Dezinho (José Dutra da
Costa), chegou escoltada por dois PMs. Faz
21 anos que Dezinho foi assassinado em Rondon do Pará. Foi morto na porta de
casa, quando o natal se avizinhava.
O fato da viúva chegar ao local escoltado por PMs em um ato de
celebração em memória dos lutadores do povo, evidencia a delicada conjuntura e
a continuação do espectro da violência como um elemento que estrutura as
políticas de desenvolvimento. Violência naturalizada. Ambiente que o momento do
primeiro lançamento presencial do livro afronta. “Não queremos mártires. O que desejamos contar é a história dos nossos
vivos.”, refletiu dona Joel.
Dona Joel e família assumiram a bandeira de luta de Dezinho. Todos
os filhos, filhas e netos prestigiaram o lançamento do livro Luta pela terra na
Amazônia: mortos na luta pela! Vivos na luta pela terra! O livro resulta de um
projeto de extensão da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA),
iniciativa animada pelos professores Rogerio Almeida (UFOPA) e Elias Sacramento
(UFPA), em diálogo com o MST, Federação dos Trabalhadores na Agricultura no
Pará (Fetagri), Sociedade Paraense de Defesa de Direitos Humanos (SDDH) e a
Comissão Pastoral da Terra (CPT).
“Fazia tempo que a gente não via esse auditório tão cheio por gente
do povo” comentou o professor Evandro Medeiros, da Faculdade de Educação do Campo,
da Unifesspa. Uma mística de jovens estudantes e dos movimentos comoveu a
todos. Eles recitaram poemas com temáticas de luta pela terra, a começar por
João Cabral de Melo Neto. Poemas e canções precedem os 20 trabalhos
contemplados do livro, que recupera parte da saga de camponeses e seus apoiadores.
Assim como dona Joel, o professor Medeiros defende a necessidade de
construirmos narrativas sobre os combatentes vivos.
O livro aglutina diferentes gerações de lutadores. Os filhos dos
sindicalistas mortos, e experientes ativistas, a exemplo de Emanuel Wambergue,
um leigo francês que aportou em Marabá nos de 1970 e nunca mais arredou o pé.
Mano, como é conhecido na região foi o segundo coordenador da CPT
Norte. Na mesma toada educador Raimundo Gomes da Cruz Neto, conhecido como
Raimundinho. Para ele a obra deve servir como um elemento animador da luta.
Além de Marabá, o livro será lançado em Belém, Xinguara, Rio Maria e
Santarém, no estado do Pará, e em Imperatriz, no Maranhão, e no segundo semestre,
no Rio de Janeiro, com possibilidades de ser lançado também em Brasília e São
Paulo.
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