30 mil
famílias moram no Assurini, destas 20 mil são famílias assentadas pela reforma
agrária em inúmeros projetos de assentamento, entre eles, Sol Nascente, Morro
dos Araras, Itapuama. Existem ainda sítios e fazendas, além de áreas de garimpo,
e proximidade com territórios indígenas e um modal de unidades de conservação,
entre elas Riozinho do Anfrisio e Verde Para Sempre. A guerra dos mapas ocorre
no município de Altamira, sudoeste do Pará, região irrigada pelo rio Xingu, e
que é impactada pelos grandes empreendimentos, como a construção de Belo Monte
e o projeto de mineração da canadense Belo Sun.
Tudo soa
grande na Amazônia. O território do município soma 159 695,938 km². É o maior em extensão territorial do
país. Área equivalente a países como Portugal, Irlanda e Suíca. Fosse um
estado, seria o 16º, maior que o Acre e o Ceará. Encontra-se numa zona proxima
a importantes cidades polos, como Marabá, sudeste do estado, e Santarém, no
Baixo Amazonas, todas marcadas pelo capital de grandes corporações, induzidas
de inúmeras formas pelo Estado Brasileiro, em particular o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O banco tem se constituído como o
principal financiador de megas projetos na Pan-Amazônia, beneficiando empresas
como Alcoa, Vale, Votorantim e a Camargo Corrêa.
A população
de Assurini começou a ganhar musculatura quando a área indígena entrou em
refluxo, idos da década de 1970, marcada por políticas de integração econômica
da região e a construção de rodovias, entre elas a Cuiabá-Santarém (BR 163) e a
Transamazônica (BR 230), que serpenteia a região. A União tutela boa parte do
território, graças ao Decreto Lei 1.164, de 1971, onde a federação passou a
controlar 100 km de cada lado das rodovias federais, em seguida incentivou a
colonização com a criação dos Projetos Integrados de Colonização (PIC´s). Medidas
realizadas sob a doutrina de segurança nacional, que efetivou ainda institucionalidades
como o Grupo Executivo de Terras do Baixo Amazonas (Gebam) e o Grupo Executivo
de Terras do Araguaia-Tocantins (Getat), uma espécie de Incra de gandola.
Antes dos
planos militares, a seca no Nordeste nos anos 1950 provocou a migração, e cimentou
mão de obra barata para o extrativismo da seringa, da castanha e da extração
ilegal de madeira. A atividade ilegal de madeira persiste, e tem pressionado as
áreas de unidades de conservação da região. O migrante nordestino ajuda a conforma
a multifacetada feição camponesa do Xingu.
A
precariedade na condição de subsistência, a rotatividade dos “donos” dos lotes,
a qualidade do solo, a flutuação dos preços e a distância da sede das cidades
influenciam para a permanência ou não do colono ou assentado ainda hoje. Soma-se
ao cenário a incerteza se o local poderá ou não ser afetado pelos
empreendimentos intensivos em capital, que hegemonizam o processo de
redefinição dos territórios xinguanos.
Assurini por dentro - Assurini é
a maior comunidade agrícola do município, e chegou a ser responsável pelo
abastecimento da cidade, informam moradores antigos. A população da agrovila é
maior que muitos municípios do próprio Pará, como cidades do Marajó, a exemplo
de Ponta de Pedras e Cachoeira do Arari.
Os cinco
quilômetros no rio Xingu que separam a zona rural da sede do município é
percorrido de balsa em 45 minutos. Entre outras externalidades o aumento do custo
de vida é um dos rebatimentos que marca a implantação dos grandes projetos na
região. Alimentação, aluguel de casas, diária de hotel, condução e o preço do
translado pela balsa sofreram incremento. No caso da balsa em mais de cem por
cento.
No começo
do ano a tarifa paga para o deslocamento de uma moto era de R$3,00, no fim do
ano alcançou a casa dos R$7,00. Uma casa simples em Altamira em área que será
deslocada pode custar até mil reais. As cidades vizinhas vivem realidade
semelhante, que tem desdobramentos no campo social, tais como: desagregação
familiar, aumento da violência doméstica, do alcoolismo, do uso de drogas e de homicídios.
A via
terrestre de acesso à comunidade, Transassurini, passa por reforma, mas mantém pinguelas – precárias pontes feitas de
madeira. No percurso é possível avistar castanheiras e açaizais. Entre a
paisagem empoeirada de fim de verão avista-se o gado. Babaquara e Conradinho
são considerados os principais igarapés. O reparo da estrada se deve ao avanço
das obras de Belo Monte e das prospecções da Belo Sun. Existe a promessa de
asfaltamento. Moradores atestam que a ideia é viabilizar a comunicação
terrestre com o município de São Félix do Xingu, conhecido pela bacia leiteria.
O vizinho do sul do estado experimenta passivos de projetos de mineração da
Vale.
Em setembro
o projeto de energia rural alcançou perto de 300 famílias no Assurini. No
entanto os agricultores reclamam da péssima qualidade do serviço da Rede Celpa.
Já ocorreram casos da queda de energia ultrapassar a casa dos vinte dias. Outro
descontentamento é o preço da tarifa, alguns moradores receberam conta de até R$1.200,00,
sem ter com quem reclamar. Cacau, castanha, pesca, caça, criação de pequenos
animais garante a sobrevivência da população.
Mobilização por direitos - O
Movimento de Atingidos por Barragens (MAB) e segmentos da Igreja Católica,
entre outros sujeitos do campo democrático mobilizam as comunidades no sentido
de garantia de direitos. Nesta semana realizaram uma reunião que contou com a
participação de perto de 60 pessoas. A comunidade será afetada pelo
empreendimento de Belo Monte.
Os moradores
elaboraram uma pauta para diferentes setores públicos e privados, e convidaram
os mesmos para a efetivação de um diálogo. Ibama, Norte Energia, Rede Celpa,
INCRA e EMATER foram convidados. Destes somente INCRA e EMATER compareceram. Populares
queixam-se que omitir e sonegar informações tem sido prática recorrente da
Norte Energia, que as vezes não recebe nem pesquisadores.
A pauta de reinvindicações
para o consórcio exige o cumprimento do Plano Básico Ambiental (PBA) e do Termo
de Compromisso firmado com o INCRA em 2010. Em tese as obras só poderiam ter iniciado
após o reassentamento das populações atingidas. Entre outras questões a pauta
dirigida para a Norte Energia trata do reassentamento das famílias, subsídio do
translado da balsa, manutenção do preço do pé de cacau em R$98,00 e a
responsabilização sobre a manutenção de 100 operários da empresa Naturasul, que
deve em breve ocupar área no projeto de assentamento Sol Nascente. A população
teme pela acentuação da desagregação e insegurança da comunidade.
Para o
INCRA os moradores exigem a desapropriação de grandes áreas. A questão fundiária
é a mais delicada. Nos assentamentos há casos de lotes terem sido negociados
várias vezes, apesar da proibição em lei. O local conhecido como Paial sofrerá
com a construção da barragem. Os agricultores temem perder a terra. O representante do INCRA garantiu que o morador
que comprou terra de forma ilegal, mas que tem vocação para o trabalho rural será
reconhecido. A presença de fazendeiros é outro ponto a ser equacionado.
Na quebra
de braço entre o grande capital e as populações locais, a Norte Energia tem
tomado como base jurídica legislação da década de 1940, que concede ao setor
privado o poder em desapropriar. O remanejamento da população de Santo Antônio
no Xingu tem sido o caso mais emblemático da assimetria de força entre os
envolvidos da disputa pelo território.
Como
metodologia para o afetado que optar por indenização o consórcio concede uma
carta de crédito. Em meio a um caos fundiário e grilagens de terras, o impactado
fica obrigado em conseguir encontrar uma terra com título legítimo, para que o processo
encerre.
Outro ponto
nebuloso é a não remuneração das áreas verdes dos lotes. A empresa indeniza
somente áreas que possuam plano de manejo, apesar do serviço ambiental prestado
e o respeito à legislação, que obriga a manutenção de 80% de reserva da
floresta. Moradores lembram que por conta das obras ocorreu um esvaziamento da
população mais jovem para a cidade de Altamira, e consequentemente para os
canteiros da barragem. O campo de futebol ficou relegado ao abandono. E não se
encontra gente disposta ao penoso trabalho na roça.
Pará grilado
6.102 títulos de terra registrados nos cartórios estaduais possuem
irregularidades. Somados, os papéis representam mais de 110 milhões de
hectares, quase um Pará a mais, em áreas possivelmente griladas. Os dados
resultam de três anos de pesquisa dos órgãos ligados à questão fundiária no
estado, através da Comissão Permanente de Monitoramento, Estudo e
Assessoramento das Questões Ligadas à Grilagem (Tribunal de Justiça, do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, Advocacia Geral da União,
Ordem dos Advogados do Brasil, Federação dos Trabalhadores na Agricultura,
Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos, Comissão Pastoral da Terra e
a Federação da Agricultura do Estado do Pará). O documento foi apresentado em
30 de abril de 2009 no auditório do Ministério Público Federal (MPF)
Conforme o site do MPF, a magnitude dos problemas nos registros –
que abrangem de fraudes evidentes a erros de escriturários - levou a um pedido,
dirigido à Corregedoria do Interior do Tribunal de Justiça, para que iniciasse
imediatamente o cancelamento administrativo de todos os títulos irregulares, já
bloqueados por medida do próprio TJ. Na época a desembargadora Maria Rita Lima
Xavier, corregedora do interior, negou o pedido no último mês de março.
O cancelamento dos títulos vai evitar a criação de seis mil
processos para o cancelamento dos títulos que podem durar infinitos anos no
tribunal já sobrecarregado. Com o indeferimento da desembargadora Maria Rita
Lima Xavier, a comissão recorreu ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para que
o mesmo defira pelo cancelamento dos títulos falsos.
Felício Pontes Jr, procurador da República e representante do MPF
na comissão, argumenta que os indícios de fraude são evidentes demais para
ficarem esperando processo judicial. O pedido de cancelamento dos títulos é
subscrito pelo Ministério Público do Estado, Instituto de Terras do Pará
(ITERPA) e a Procuradoria Geral do Estado (PGE) e foi enviado ao CNJ através
dos Correios no mesmo dia de apresentação dos dados.
Entre os
episódios de grilagem mais famosos do Pará está o do “fantasma” Carlos
Medeiros, ente jurídica e fisicamente inexistente que acumula 167 títulos de
terra irregulares. Todos os títulos de Medeiros que somam 1,8 milhões de
hectares estão bloqueados. As terras se espraiam em dez municípios paraenses. A
mesma situação nubla os empreendimentos da Agropecuária Santa Bárbara Xinguara S/A.,
no sudeste do estado, do banqueiro Daniel Dantas.
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