sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

Dorothy Stang, 20 anos de martírio


 

Lúcio Flávio Pinto lança livro de memórias



Como me tornei um Amazônida: Memórias de um jornalista investigativo na maior floresta tropical do planeta é uma obra marcante que entrelaça as experiências pessoais de Lúcio Flávio Pinto com suas quase seis décadas de cobertura jornalística na Amazônia. Ao longo de 35 capítulos, o jornalista investigativo revela não apenas as transformações da região, mas também sua própria metamorfose de observador a defensor apaixonado da floresta.  Matéria do site Amazônia Real. 


Sobrados, butecos e óbitos

Tachinha bateu o catolé. Crioulo também. Rosa, a filha do poeta Tribuzzi teve o mesmo destino. Em único folego o cabra enfia um obituário noutro. Tanta gente. Muitos não tenho a exata recordação de convivência. Não recordo a aparência. Tempos distantes. Anos de 1980. Muitos simplesmente sumiram.  Uma longaaa lista.

Tachinha era colega de goró. Negro retinto. Derradeira vez que o vi defendia um troco como segurança no banco de sangue da cidade. Uma ironia para um biriteiro dedicado.  Ao passar, ele gritou pelo meu apelido da guarita. Combinamos uma cerveja que nunca sucedeu.

Crioulo já era um senhor prestes a se aposentar quando o conheci. Deveria ter um metro e oitenta de altura. Esguio. Piadista incorrigível. Ainda que radicado no Maranhão há anos, guardava o jeito de antigos malandros da Lapa, do Rio de Janeiro.

Trejeitos expressos no jeito de falar, andar, brincar com os parceiros de bar. Ao ser interpelado por algum colega, sempre retrucava: sóóóóó!

Rosa era alvinha. Filha de um português jornalista e poeta. O pai era próximo ao Sarney.   Fazer parte do reinado da família em certa medida sinalizava boa ventura. A casa da família era generosa. Ficava em frente da residência do poeta Nauro Machado. Reconhecido escrevinhador, traduzido para alguns idiomas.

A funcionária pública acendia um cigarro no fiofó do outro. Uma compulsão. Ela era elemento feminino raro em espaço onde predominava a macharada. Todos a respeitavam. Ainda que cuspissem no chão, coçassem o saco com desenvoltura e despejassem toda ordem de machismo.

Entre os cabras, não havia quem não desejasse petiscar um gomo daquele corpo boleado. Roçar a barba mal feita naquele rosto de bolacha Maria ou beijar aquela boca de nicotina de elevada concentração. Um cinzeiro, praticamente. 

O coração tombou Tachinha e Rosa. Crioulo rodou prestes a somar 90 verões. Morava só. A casa tinha um sistema de vigilância. Não sei se a parentela distante tinha acesso.  O buteco cheira a fim de festa.

Produtos rareiam na prateleira, onde um dia tudo abundava. Inclusive um robusto caderno de fiados. O odor de fungo toma o ambiente onde imperam gambiarras na elétrica e hidráulica.

Naquela manhã um faz tudo passou por lá. Indagou da possibilidade de fazer o reparo das goteiras. Chove a cântaros esses dias. O biscaite não rolou. O comerciante justificou falta de recurso.

O Centro da cidade denota solidão. Mais de cem anos. Sobrados de todos os tamanhos espelham abandono. Tijolos fecham janelas. Paredes possuem seus azulejos saqueados. Alguns prédios metamorfosearam-se em estacionamentos.

Pedintes, dependentes químicos, aposentados, pés inchados, prestadores de serviços sexuais vicejam sobre os paralelepípedos, por entre becos e vielas.  Foram-se as fofoqueiras do Poema Sujo. Teimam alguns pregoeiros. Negociantes de cuscuz e sorvetes típicos.

Uma tristeza sem fim. Tristeza não tem fim.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

Acampamento indígena de Belém esclarece manobras do governador Helder Barbalho

A coordenação do acampamento no prédio da Seduc e exige a revogação da Lei 10.820  e a exoneração do secretário 

Foto: @indiazinha.viajante


Os indígenas que ocupam o prédio da Seduc desde o dia 14 de janeiro informam que o movimento de ocupação continua e não houve, até então, nenhum acordo com o governo do Estado.

A agenda do governador Helder Barbalho na tarde de hoje, 3, foi com indígenas alinhados aos órgãos do próprio governo do Estado, alguns inclusive detentores de cargos comissionados. Eles não participam do movimento de ocupação e não têm legitimidade e nem autonomia para negociar a pauta do movimento indígena que ocupa a Seduc, uma vez que possuem estreitas relações com as autoridades que aprovaram a Lei 10.820, e atacam diretamente a educação pública, os povos indígenas e as comunidades tradicionais.

As lideranças que ocupam a Seduc estranham, também, a forma desigual e pouco isonômica com o que o governo do Estado trata os referidos movimentos, considerando que a reunião ocorrida na semana passada, articulada pelo Ministério dos Povos Indígenas, foi sob forte aparato militar, com indígenas sendo intimidados e até impedidos de fazer uso do celular na reunião.

Surpreendentemente, na reunião de hoje com indígenas alinhados ao governo do Estado, o governador Helder Barbalho não exigiu reunir apenas com uma comissão, não fez uma operação de guerra com fechamento do trânsito e aparato militar e nem proibiu filmagens e o uso de imagens, como se quisesse usar nossos povos de forma folclórica e como peça de propaganda governamental.

Os indígenas que ocupam a Seduc ressaltam que, a fim de repor a verdade dos fatos, a Defensoria Pública da União ingressou com uma ação civil pública, exigindo que o governo do Pará seja impedido de propagar informações falsas sobre as negociações com o movimento indígena.

Por fim, os indígenas reiteram o convite para que o governador Helder Barbalho compareça a ocupação da Seduc, que segue em defesa da revogação da Lei 10.820 e da exoneração do secretário Rossieli Soares.

 

Belém, 3 de fevereiro de 2025.