quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Um quarto de século do JP e a indiferança da academia

 
Bernardo Kucinski no livro Jornalistas e revolucionários, tese de doutorado que recupera fragmentos dos principais jornais do campo democrático do período da ditadura, sentencia que a longevidade das publicações não ultrapassava a casa de cinco anos. Tensão entre as correntes políticas, crise financeira e a distensão política são pontuados como elementos que colaboraram para o ocaso de inúmeras publicações.
 
Movimento, Opinião, Pif Paf, O Pasquim, Versus figuram como publicações históricas que buscaram denunciar a violação de direitos humanos e debater questões centrais da política, como a realização de uma Assembleia Nacional Constituinte. Na Amazônia figuram como importantes publicações o Jornal Varadouro do Acre, Resistência, de Belém, Pará, editado pela Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SPDDH) no fim da década de 1970 e início da década de 1980, e ainda o Bandeira3, sob a responsabilidade do jornalista Lúcio Flávio Pinto.
Na década de 1980, pós ditadura, Lúcio Flávio Pinto criou o Jornal Pessoal. Conforme ele esclarece, a motivação foi impedimento da publicação de uma  matéria no jornal O Liberal. A reportagem tratava da execução do advogado e deputado estadual pelo PC do B, Paulo Fonteles.
Em 2012 o JP completou um quarto de século. O tabloide quinzenário é tributário de importantes temas sobre a região mais discutida no mundo, a Amazônia. Grilagens de terras, grandes projetos, políticas de desenvolvimento, violência e o cenário político do estado são temas contemplados nas páginas do JP.
A relevância do profissionalismo do nanico pode ser medida em citações do mesmo como fonte de pesquisa em todos os cantos do mundo, e motivações de pesquisas sobre a obra. Na Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA\USP) existem algumas dissertações e teses.
 
Quando o JP somou duas décadas de vida, a professora Maria do Socorro Veloso, sob a orientação do jornalista e professor Laurindo Leal, defendeu a tese que recupera a trajetória do jornal pessoal de Lúcio Flávio. A obra, Imprensa, poder e contra hegemonia – 20 anos do Jornal Pessoal (1987-2007), pode ser baixada na grande rede.     
Nela a professora esclarece que a fonte de inspiração da linha editorial do JP foi a obra do jornalista estadunidense I. F Stone´s Weekly, que por 19 anos editou o próprio jornal. O jornal de Lúcio não tem anúncio. Ele argumenta que é para evitar qualquer tipo de pressão. Ao contrário do que advogam algumas pessoas que tratam do JP, ele não é o jornal de um homem só. Luiz Pinto, irmão do editor, é o responsável pela diagramação, as inventivas capas e ilustrações.
Assim como o Bandeira3, uma experiência realizada pelo editor do JP em 1975, o tabloide não tem vínculos com partidos políticos ou movimentos sociais, como era comum em tempos idos.
Ao lado do jornalista Alberto Dines, Lúcio Flávio foi homenageado este ano com a chancela especial do Prêmio Wladimir Herzog, a mais importante comenda nacional na área de direitos humanos.  O prêmio foi concedido pelo reconhecimento da obra do jornalista, que por conceder visibilidade a atos secretos das esferas do poder econômico, político e jurídico na Amazônia, coleciona processos.
 
Um dos casos mais escabrosos foi a penalização no processo impetrado pelo grileiro de terras Cecílio do Rego Almeida. O jornalista foi condenado a pagar idenização por denunciar a maior de grilagem de terras na Amazônia. No entanto, o mais interessante foi a mobilização em todo o país numa campanha de cotização para honrar os custos da pena.
 
Há elementos de sobra que podem ancorar pelo menos um debate sobre jornalismo, liberdade de expressão e direitos humanos na fronteira mais importante do mundo. Soa no mínimo estranho, o silêncio no universo acadêmico sobre a passagem dos 25 anos do principal jornal independente da Amazônia.

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