segunda-feira, 29 de maio de 2017

Parada de Trecho - Pernambuco, o ex drogado



Pernambuco tem quase 60 janeiros. Tem a cara amassada por inúmeras quedas. Algumas provocadas por conta do consumo de cachaça. A boca é meio pensa para o lado esquerdo.  A estatura é média. É mecânico de oficio. Mas, faz bico de que tudo que é coisa. No domingo de ramos danou a puxar prosa após matar algumas doses de pinga. 

Fazia sol no Bar do Carecão. O boteco do vascaíno fica na Cidade Nova, núcleo urbano da cidade de Marabá. Como uma obrigação religiosa, sempre que baixo na cidade, vou tomar benção ao seu Zé (Carecão).  Ex garimpeiro que um dia bamburrou em Serra Pelada. 

O local é um canto sagrado de veteranos que curtem dominó. Não é o meu caso. Seu Zé tem uma penca de filhos. Todos tomam benção a ele. Um o beija no rosto. Na prole, belas herdeiras. Eu opto em ocupar o balcão. Foi lá que a prosa brotou. 

“Fazia 12 anos que não falava com a minha mãe. Hoje eu consegui”, conta o emocionado “peão do trecho”. Lágrima sobre lágrima, ele conta que por 14 carnavais foi viciado em crack. “ A pedra quase me mata. Não tinha coragem de falar com a minha mãe sendo viciado”, dispara entre soluços e intercalando um cigarro e cusparadas na calçada. 

O peão conta que morou em Curionópolis. O amigo Pelado queria subir com ele para Marabá. Preferiu correr o trecho só. Um dia Pelado baixou na cidade, caçou confusão e o PM Paraná adiantou o encontro dele com o superior. 

Casado com uma cearense brava, ele promete que o dia faz uma merda e manda a cônjuge para o quinto dos infernos. Reclama que ela faz tudo que ele não gosta. “Ela pagou tatuagem para o meu menino. Para eu ficar mais chateado, também bancou um brinco”, narra contrariado o “pé inchado”. 

Na verdade o menino não é filho biológico. Trata-se de um sobrinho. Pernambuco rememora que a irmã foi embuchada por um vocalista da banda de forró Mastruz com Leite. “ Minha irmã é negra do beiço virado. Não quis a criança e eu fiquei”, recorda entre mais um punhado de lágrimas.  Segundo ele o rapaz de 21 anos faz faculdade. 

Por conta das inúmeras quedas e toucas que comete por conta do álcool, o filho balbuciou que tinha saudade quando ele usava somente a pedra. Segundo Pernambuco, o menino disse que ele fumava e dormia. Agora cai e dorme na rua, e o rapaz tem de apanhá-lo. 

Pernambuco é filho da pequena Trindade. Ex distrito de Ararapina. “ Olha, eu poderia tá bem. Minha família é bem lá.  Primos já foram prefeitos. Mas, não quero voltar”, narra o migrante. 

Quase meio dia. Os fregueses ganham o rumo. O bar fica vazio. Carecão fecha para o almoço, e só abre segunda. Um aperto de mão sela a nossa despedida. Até outro retorno a Marabá. O trindadense dá as costas e segue rumo a Transamazônica.

0 comentários: