terça-feira, 13 de março de 2012

Canções de Alinhavo - Poema de Drummond para Dalcídio Jurandir


Chove no campos de Cachoeira

e Dalcídio Jurandir já morreu.

Chove sobre a campa de Dalcídio Jurandir

e sobre qualquer outra campa, indiferentemente.

A chuva não é um epílogo,

tampouco significa sentença ou esquecimento.

Falei em Dalcídio Jurandir

como poderia falar em Rui Barbosa

ou no preto Benvindo da minha terra

ou em Atahualpa.

Sobre todos os mortos cai a chuva

com esse jeito cinzento de cair.

Confesso que a chuva me dói: ferida,

lei injusta que me atinge a liberdade.

Chover a semana inteira é nunca ter havido sol

nem azul nem carmesim nem esperança.

É eu não ter nascido e sentir

que tudo foi roto para nunca mais.

Nos campos de Cachoeira-vida

chove irremissivelmente.
 
  



Carlos Drummond de Andrade.
Livro Corpo - 2º edição - Editora Record, 1984.

O poeta escreveu  para o prosista  Dalcidio (marajoara) 


Enviado por Maria de Nazaré


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