A mãe tem feição indígena. Garante o sustento numa bodega simples, escondida numa viela próxima a uma BR. Entende-se melhor com os números. Desde os 17 anos de idade trata com o assunto. Pedreiro, aposentados, funcionários públicos e biscateiros frequentam o lugar. A filha, ao contrário, parece uma jovem saída de romance parnasiano.
Iara, a rainha das águas, tem 16 anos. Nunca fumou. Mas, padece de enfisema e outras chagas da respiração. É bem clarinha e magra. Cabelos encaracolados. Nos derradeiros dias tem se indisposto com Maquiável, O Príncipe. Até onde a minha ignorância deixa alcançar, - tão robusta - a obra é fundamental para se entender coisas sobre a política.
Em tempos de hiperconectividade, Iara parece uma menina fora do comum, fora do eixo, fora do esquadro. A mãe da adolescente gasta tempo em visitas a sebos. Explica que o quarto é cheio de livros. Queixa-se dos preços dos livros novos.
A jovem que se declara incondicional admiradora de Clarice Lispector aguarda a digestão de O Príncipe para encarar Utopia de Tomas Morus. Alan Poe já foi devorado pelo apetite literário da rainha das águas, que aprendeu inglês por conta própria, e exercita a língua estrangeira com os filhos do pastor da igreja que frequenta. Um estadunidense.
A menina que adora ler, quase nunca ver TV, surpreende com a intenção profissional. Ela deseja ser engenheira civil. As primeiras pedras para a construção do alicerce são as melhores, uma leitura bacana, ainda que ela confesse simpatia por Agatha Christie.
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