terça-feira, 26 de agosto de 2025

Neguim


Av Fernando Guilhon/Santarém/PA. Foto: R. Almeida


Neguim é neguinho. É miúdo. É pouquim.  Quase ninguém. Um invisível na fila do pão. A dose de pinga de cada dia ajuda na manutenção do calibre franzino. Assim como enfrentar os aperreios. Nem só de pinga vive Neguim. Vez em quando derruba uma breja. Talvez para engambelar o corpo.

Neguim tem a pele da face tostada pelo sol e marcas de algumas quedas.  Para as batalhas diárias Neguim calça chinelo de dedo, combinando com bermuda jeans e qualquer camiseta ao menos lavada.

Ele já puxou três anos de cadeia. Meteu peixeira em bucho de desafeto pelas bandas de Tucuruí.  Houve um tempo que peixeira e o tresoitão encarnavam os principais argumentos na equação de diferenças de opinião na região.

Ele não deixou claro o motivo da cizânia. E, nem se o cabra foi a óbito. Todavia, esclareceu que também morou em Marabá. Tucuruí e Marabá integram a mesma região sudeste do Pará. Terra de valentia. Terra de saque.  É onde os fracos não têm vez. 

Neguim é cabra de feira. Vende banana onde é possível o comércio em Santarém. Corre a cidade inteira: Cohab, Mercadão 2000 e preferencialmente senta praça na Av. Fernando Guilhon. Território de expansão do município marcado por grilagens, loteamentos, especulação, ocupação e verticalização.

A partir da Guilhon alcança-se o aeroporto e o centro de convenções, recém inaugurado e a PA que leva ao território do povo Borari (Alter do Chão).  Além de dois grandes mercados atacadistas, a avenida é povoada de mercados populares e lojas de material de construção. O fluxo de veículos é intenso. Beira a saturação.

Neguim é econômico nas palavras.Apesar de ter um cantinho em um deposito de frutas, vez em quando, dominado pelo álcool, repousa sobre a primeira banca que encontra desocupada.  Ninguém bole nele.  

O depósito era de um venezuelano encorpado. Neguim conta que ele era canguinha. Não gastava com nada.  Juntou um troco por vários anos e voltou para a terra natal. Diz que juntou mais de meio milhão.

Neguim é amigo de João, igualmente neguinho. João torce pelo Vaskin. Ao contrário de Neguim, João não bebe nada alcoólico, apesar de já ter corrido o trecho em tudo que é tipo de garimpo no Tapajós.

Neguim e João pareiam em idade. Casa dos 40 anos nos costados. João é aposentado. Ao menos diz ser. Ao defender um troco em carpintaria sofreu um acidente que desgrenhou os dedos da mão direita.

Neguim chama João de puxa saco. Faz poucos dias o ex garimpeiro e auxiliar de carpinteiro pegou um pé na bunda da parceira. Neguim diz que era uma mulher enormeeeee. 

Além da aposentadoria, João negocia umas quinquilharias na porta de um comércio. Caixinhas de som, carregador de celular, lanterna, óculos escuros, boias para veraneios e praias. A contrapartida da licença é ele ajudar em algumas tarefas.

Neguim quando carente de um xodó afronta o Mercadão. Paga umas brejas maneiras para a dama.E, alguns croquetes depois,  avança para o quarto. Honra a chave da casa e o prolabore da moça. Ele diz que é mais de cem contos a missão. Mas, ele paga meia.  

Sequim completa o trio ternura. Soma mais de 60 verões. Faz jus ao apelido. É do Maranhão. Defende-se como estivador e negociante de frutas. Raro usar camisa.  Tal Neguim, tem na pinga o socorro de lonjuras, tristezas e alegrias.

Tem, tem, tem três neguins....todos em Santarém...a se defenderem das intempéries do jeito que é possível....esses dias o calor tá de matar.

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