A defesa do território e os direitos da mulher são as principais bandeiras da chapa coletiva Mulheres Amazônidas
À esquerda, Alessandra Caripuna, ao centro Claudiane Lírio (cabeça da chapa), à direita Tati Picanço, e sentada Luana Kumaruara,
Imagina ser mulher num país que possui cravado em seu DNA o gene do machismo. Imagina ser negra ou indígena num país desavergonhadamente racista e feminicida. Como se diz pelas paragens do Pará, PENSE em ser mulher, negra ou indígena, com filhos, por consequência, fazer parte da classe trabalhadora, e se meter em Política...
Já calculou quantos
obstáculos, barreiras e outros infortúnios a enfrentar no conjunto da
sociedade, e muitas das vezes no seio da própria família quando se exerce a
consciência de classe e investe em construir muralhas em defesa de seus
direitos num ambiente minado em suas raízes por profundas desigualdades e um
Estado autoritário e violento?
Agora, querida/o tente
visualizar quatro mulheres, sendo duas negras e duas indígenas, no interior da
Amazônia, a se rebarbar numa candidatura coletiva com vistas a exercer a
vereança em uma quebrada marcada por uma agenda desenvolvimentista que ameaça a
existência dos seus territórios ancestrais?
Pense nas pelejas das
meninas filiadas ao PSOL, cuja agenda reside em defesa de seus territórios e
outros direitos em viver de forma plena em uma arena política
controlada/hegemonizada por homens brancos, muitos deles provenientes do Sul do
país, “homens de negócios” da cadeia do agronegócio, e outras iniciativas à
cadeia relacionadas, como a construção de obras de infraestrutura, consultorias, etc?
É desafio para mais de
metro, e quando a gente conta a prosa, até o burro do carroceiro chora. As meninas do Brasil moram em Santarém,
cidade irrigada pelos caudalosos rios Amazonas e o Tapajós. A água de um é barrenta,
enquanto a outra carrega em azul. Terra de sociedades complexas dos ancestrais
indígenas, e em seguida, do povo negro.
Os sinais da presença
ancestral constam em todo canto. Apesar das tentativas de apagamento. Aldeia é
considerado um dos bairros mais antigos, e com maior extensão territorial da
cidade. Lembre-se: Santarém é uma grande sítio arqueológico. Território indígena.
O bairro é uma das
expressões da presença ancestral, bem como o pujante artesanato produzido a
partir dos mais diferentes suportes: cabaças, miçangas, fibras naturais,
escamas de peixe, o próprio peixe. Nas feiras, óleos e outras essências são
facilmente acessados. Sabença milenar. Já que estamos em tempo de Círio, a
maniçoba é cria nativa. É coisa de índio.
À beira dos rios, muitas
das embarcações resultam da engenharia da sabedoria do caboclo em selecionar a
madeira mais adequada. Tem ciência!. Ligue-se, para o festejo, roda de carimbó, a
dança circular, que celebra a igualdade, as riquezas naturais, a sabença do
povo antigo, a lua e o amor.
Terra de encantados, como
o muiraquitã. Terra do bravo povo mundurucu, que recentemente teve a luta de
uma de suas guerreiras laureadas com o prêmio internacional de defesa dos
direitos humanos, Alessandra Korap.
O Baixo Amazonas é terra
de cabanos, onde a comunidade de Cuipiranga é considerada por especialistas
como a derradeira frente de resistência a ser sufocada.
É deste rico solo/rios/florestas
que brotam as meninas do Brasil combativo.
A Alessandra Caripuna é filha da comunidade quilombola de Pacoval, município de
Alenquer. Formada em Administração é uma das principais referências femininas
do movimento negro em Santarém. Caripuna é mãe de Zinquê.
No campo da educação atuou na Coordenação de Educação e Diversidade Etnico-Racial, da Secretaria Municipal. Nesta frente mandava a letra na formação para as equipes escolares, visando a construção de uma educação anti racista.
Mulher é bicho danado. Bate
o tambor, canta e roda a saía. Caripuna faz parte da coordenação da Semana da
Consciência Negra em Santarém desde 2011, em momentos de “repouso” (entenda a
ironia) ocupa o front como comerciante da grife Afro Negrices Caripuna, e a
partir dela anima desde 2017 a Feira de Afroempreendedores Kitanda Preta em
Santarém Pará.
Como reconhecimento de suas
pelejas em 2018 foi homenageada pelos acadêmicos negros da UFOPA, onde
batizaram o coletivo como “Negro Alessandra Caripuna”. Uma espécie de centro
acadêmico.
A UFOPA é considerada a
universidade do Brasil com o maior contingente de negros e indígenas, numa
relação que não é nenhum rio de rosas.
O movimento estudantil serviu de berço para os primeiros passos políticos de Tati Picanço, que em seguida integrou o Grupo de Consciência Indígena (GCI), onde é ativa até os dias de hoje, com trabalho junto às mulheres indígenas e no fortalecimento do departamento de mulheres do CITA. .
A estudante de Antropologia
da UFOPA faz parte da Frente em Defesa da Amazônia, e colaborou na fundação do
coletivo feminista “Rosas de Liberdade”. Picanço é do povo Caribe. A mãe de três mulheres combate a violência doméstica e atua pela humanização do parto.
Luana Kumaruara é liderança
indígena no Baixo Tapajós. Mãe de Yara e Kauê. Por três anos atuou no Conselho
Distrital Saúde Indígena Guamá Tocantins - CONDISI DSEI GUATOC. Milita junto ao
Departamento de Mulheres do CITA (Conselho Indígena Tapajós Arapiuns). Na Universidade Federal do Pará (UFPA) cursa o
mestrado em Antropologia, e participa do projeto Mãe D´Água, que propõe
organizar vigilância do território Kumaruara.
Na produção de
conhecimento sobre o seu povo integra o grupo de pesquisadoras Amazônidas
"Cartografando Saberes", composto por mulheres indígenas e negras
intelectuais e integra ainda a ABIA (Articulação Brasileira de Indígenas Antropóloges).
Assim como a Caripuna, ela
foi homenageada por colegas que nomearam o Centro Acadêmico de Antropologia da
Ufopa como Luana Kumaruara, por ela ser a primeira indígena a se formar no
curso.
“Nós somos mulheres
preparadas e decididas, e estamos aqui por uma democracia popular. Eu acredito
que a Bancada de Mulheres – Vozes Amazônidas é uma virada de chave. Nós
mulheres somos a nova estética política, viemos para ocupar o nosso lugar.
Surara!”, defende, Luana Kumaruara.
O poeta entoaria, “mulher
tem nome de flor”, a cabeça da chapa tem flor no sobrenome. Trata-se da
Claudiane Lírio. A estudante de Ciência e Tecnologia da UFOPA integra a
Federação das Organizações Quilombolas de Santarém (FOQS), por cinco anos fez
parte Conselho Municipal de Saúde, e é ativista há mais de duas décadas.
Lírio defende que nesta
encruzilhada civilizatória em que vivemos é o momento adequado para os povos
originários, e em particular as mulheres tomarem assento na política. Com
relação ao começo do debate sobre formação da chapa coletiva, as ativistas
explicam que o conjunto de movimentos já vinha refletindo sobre a possibilidade,
e que ela se concretizou a partir de uma prosa sobre o tema.
A chapa das Mulheres Amazônidas não é a única a ser apresentada pelo Psol, noutro campo, a chapa do Bem Viver, tem a mesma perspectiva. Com relação de mulheres do campo popular no legislativo de Santarém, em 2012 a trabalhadora rural Ivete Bastos (PT) exerceu uma legislatura. Bastos é dirigente do Sindicado de Trabalhadores Rurais.
Como diz a canção de Bárbara Zidome; "
Toda mulher já nasce sabendo o que quer/Nem toda mulher é menina/Encara esse mundo de frente/Valente ou então Valentina.
Com informações da chapa Mulheres Amazônidas
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