segunda-feira, 6 de julho de 2020

Nada segura o trem da Vale, nem a pandemia


Ação de quilombolas do Maranhão contra a duplicação da Ferrovia/ Justiça nos Trilhos

O ranger do peso dos vagões sobre os trilhos é ouvido em quase toda a cidade de Marabá, sudeste paraense. O maior trem do mundo não cessa. Todos os dias, durante o dia todo os ruídos lembram do saque.

O trem carrega minério de ferro de melhor teor do mundo da Serra de Carajás, até São Luís, no Maranhão, de onde ganha o mercado asiático.  Faz mais de 30 anos.  

Tantos são os navios de grande porte, que as praias de São Luís lembram uma pintura de tempos coloniais, com a esquadra de naus a espreitar a cidadela.  A ferrovia que foi duplicada, tem perto de mil de quilômetros.

Carajás abriga umas 4 bilhões de toneladas de minérios. A estimativa era que o minério duraria uns quatro séculos. O mercado, as tecnologias de exploração reduziram para menos de cem anos.

O maior trem do mundo mede 3,3 quilômetros extensão, possui 330 vagões, puxados por quatro locomotivas, que varam perto de 30 cidades dos dois estados, e perto de 100 comunidades.

O site da firma informa que por ano transporta 120 milhões de toneladas. Cada vagão tem a capacidade de 104 toneladas. Para viabilizar o transporte a firma possui 10.7656 vagões e 217 locomotivas. 

Em 2011 foram necessário cinco rebocadores mobilizados de todo o país para atracar o Vale Brasil, navio com capacidade de carregar 400 mil toneladas de ferro rumo à China. 

Os portos de Roterdã e o de São Luís são os com capacidade de receber os navios de grande envergadura por conta da oscilação da maré.  A baía de São Marcos, em São Luís, desde séculos imemoriais afunda navios. 

Mesmo nos dias de hoje os acidentes persistem, e  tendem a provocar problemas ambientais por conta de vazamentos de óleo e minério. Em fevereiro deste ano a Marinha afundou o Stellar Banner, navio com capacidade de quase 300 mil toneladas da empresa sul-coreana Pollaris Shipping a serviço da Vale. 

E o trem danou-se naquelas brenhas do Pará e do Maranhão. Estados iguais em desgraça, onde  o barulho, a poeira, as casas rachadas, as mortes de pessoas e de animais não integram os cálculos contábeis da mineradora Vale.

Há uns quatro anos ela investiu 60 bilhões de reais para viabilizar a exploração da Serra Sul (S11D), localizada em Canaã dos Carajás.  O projeto é o mais expressivo no portfólio da mineradora que feriu de morte Mariana e Brumadinho, e nocauteou Itabira de Drummond.

Especialistas advertem que a estimativa de lucro para o último trimestre do ano é de U$$ 3 bilhões de dólares. No fim do ano passado ela anunciou a distribuição de U$$ 7,25 bilhões a seus acionistas.

Mais que o dobro que pagou em possíveis compensações às famílias impactadas pelos crimes ambientais em Minas Gerais. Por conta dos crimes, o conselho administrativo da firma havia colocado em suspensão a remuneração dos acionistas.

Os valores sempre estratosféricos do mercado aprofundam a condição colonial da região como exportador de produto primário.

Nesta peleja de Davi contra Golias, os coletivos Justiça nos Trilhos e Atingidos pela Vale atuam em rede no sentido em visibilizar os abusos da mineradora.  

A gênese do projeto consta nos anais da historia da ditadura civil-militar.. A política desenvolvimentista do regime representa um divisor de água na lógica do saque sobre a região. Ele ergueu institucionalidades, possibilitou políticas de crédito, promoveu a expropriação de comunidades indígenas, quilombolas e camponesas. E, continua na mesma toada. 

Por cá, vidas não importam.

A Vale é um estado dentro do estado do Pará. O minério de ferro representa o principal produto da balança comercial do estado, perto de 90%.

A região de Carajás da Vale não se coaduna com o universo da sociedade local, que coleciona os principais indicadores em desmatamento, morte de camponeses, trabalho escravo, péssimos números em educação, saneamento e por aí vai.

Nada cessa o trem da Vale. Crimes ambientais, indignação ou pandemia.   

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