O padre negro do Bico do Papagaio era conhecido pela perseverança e uso de sandálias surradas
Padre Josimo,, morto quando somava apenas 33 anos. Foto: internet
Ricardo
Rezende*
Em
10 de maio de 1986, padre Josimo Moraes foi assassinado em Imperatriz,
Maranhão, por Geraldo Rodrigues da Costa, contratado pelo interesse do
latifúndio.
A União Democrática Ruralista - UDR - tinha sido criada. Seu presidente era Ronaldo Caiado. A organização promovia leilões de gado, ameaçava os camponeses, e eram criadas as milícias armadas a serviço dos grandes proprietários. Em Goiânia, a Solução, coordenada por coronéis, em Cuiabá, a Sapucam. Em Marabá, o grupo mais importante de pistoleiro era coordenado por Sebastião da Terezona.
Caiado,
após o assassinato do jovem sacerdote disse para a imprensa: "Quem planta
vento, colhe tempestade". Criminalizar a vítima era e tem sido uma prática
comum neste país da casa grande.
O pistoleiro tinha tentado matar Josimo em abril de 1986 com diversos tiros contra o carro que ele dirigia. Sobreviveu. Estivemos no final de abril, cinco bispos e eu, em Brasília com o presidente Sarney. Informamos o atentado e os riscos que continuava a correr. Apesar da promessa de protegê-lo, nada foi feito. Dez dias depois, subindo as escadas do prédio onde funcionava a CPT do Bico do Papagaio, em Imperatriz, com cópias do poema Páscoa Paz que havia escrito, foi alvejado pelas costas.
Em reunião na diocese de Tocantinópolis, poucos dias antes o clero e o bispo sugeriram que ele saísse da região. Josimo disse que não o faria, pois os trabalhadores rurais, também ameaçados, não podiam sair, e que ele não tinha ninguém para chorar por ele: nem esposa ou filhos. Tinha a mãe, dona Olinda, e sabia que cuidariam dela. Foi seu testamento espiritual.
Mas
em um aspecto ele errou. Quando o corpo foi levado para Tocantinópolis,
chegavam caminhões de lavradores de toda a região. Homens e mulheres vinham em
prantos... choravam certamente por Josimo, mas também por si próprios e o tiro
nos atingia a todos.
Domingo era dia das mães. No sábado à noite, o corpo de Josimo foi, por insistência minha e de frei Henri, transferido do salão paroquial onde estava para a catedral de Tocantinópolis. A igreja estava preparada para as celebrações voltadas para a festa das mães. Mas o corpo estava em frente ao altar. Era um grito que irrompia, uma denúncia que apontava os crimes do latifúndio, da ausência de uma política pública adequada, da ausência da Reforma Agrária prevista na lei do país e não executada.
Na
celebração de despedida do corpo, a catedral era pequena para conter toda a
gente que chegava das dioceses e de outras regiões do país. Entre os presentes,
além dos amigos camponeses, padres e agentes de pastoral, o ministro da Reforma
Agrária, Nelson Ribeiro, que tantas vezes havia recebido lavradores e o próprio
Josimo em sua sala.
O
ministro remava inutilmente conta a corrente. Sarney, o presidente, o utilizava
para amortecer as pressões e não dava seguimento aos processos de
desapropriação. As pilhas de processo se acumulavam no Palácio de Planalto e
não eram assinadas. A emoção era grande, todos choravam: os bispos, que
celebravam, os fiéis e o próprio ministro.
A
caminho do cemitério, Pedro Tierra, pediu ao ministro que renunciasse. Eu já
havia dito isso ao próprio ministro logo após audiência com o presidente. O
presidente não confiava nele, mas nos chefe da Casa Civil.
Poucos dias depois, Nelson Ribeiro renunciou...
Poucos dias depois, Nelson Ribeiro renunciou...
Geraldo,
o pistoleiro, foi condenado em 1997 e morreu na prisão. Foram condenados, no
mesmo ano, como mandantes, Geraldo Vieira, seu filho Adailson, e Guiomar
Teodoro Filho.
É
professor da UFRJ, na época era agente da CPT em Conceição do Araguaia/PA.
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