terça-feira, 17 de setembro de 2024

A Cristaleira

No roer das horas o asfalto a tudo devora. Matas, rios, jacarés, passarinhos e encantarias. Assim, por aqui sucedeu. Sucede. Um beijo de Judas, deus progresso. Um punhado de moedas e alguns montam na onça. A cidade a se reconfigurar ao dissabor do muque capital.

“A cidade não para. A cidade só cresce. O de cima sobe. O debaixo desce” é Science na veia do mangue. Por estas paragens, a Av. Fernando Guilhon (PA 453) subjugou matas e rios. Matar é a ordem do desenvolvimento. Rodovia, navalha é uma artéria da cidade de Santarém/PA. Ela faz convergência com a BR 163 (Cuiabá- Santarém) e com a PA 257 (Everaldo Martins). A avenida integra uma geografia de expansão do município polo do oeste paraense.

Nunca mais naquela estação encontrei meu coração. Samba triste traficando melancolias. Nesta quadradura, prédios, loteamentos, grilagens, ocupações vicejam com desenvoltura. O preço de imóveis é algo transcendental. Seja lote, terreno, casa, apartamento ou prédio.   A rodovia liga o Centro ao Aeroporto, e possibilita acesso ao território do povo Borari (Alter do Chão). O progresso a tudo fagocita. A todo momento reclama sangue, plasma, placenta, corações, rins, pâncreas e tristeza. O cabra é de morte! É de matar! Matas, rios, risos, jacarés, passarinhos e encantarias.  

O negócio seguinte. Cemitérios de vidro. Shoppings. Coral de cães desafinados no natal. Farmácias, laboratórios, padarias, pizzarias, petshop, botecos, pequenos comércios - que bravamente resistem aos atacarejos -, hotéis, hamburguerias, motéis, movelarias e afins espocam por todos os flancos. Um campo minado.  “A cidade não para. A cidade só cresce”. Muitos para o beleléu, alguns para o céu. Jogo de poder. Malícia. Carícia em criptomoeda.

Faz calor. A fuligem de queimadas precipita sobre solidões, políticos anões, depressivos e suicidas. Na ópera de sobrevivência, sob o ruído de automóveis, depois das 18h vendedores de churrasquinhos despontam ao pôr do sol. Avista-se de longe os fios de fumaça. Negociantes de frutas e peixes completam a aquarela. Territorialidades ao sabor do improviso. Outros mundos em universo de escassez. Comunhões de excluídos. Seios e culhões à mostra. Procissão de mortos vivos ruma em busca de algum templo.

Cisco nos olhos. Tudo embaçado, de cabo a rabo. Entre mesas, bancos, cadeiras, beliches e outros tipos de movelaria funcional, era possível avistar uma cristaleira na loja Pica Pau.  A peça destoava de tudo ao redor. Quase um mutante entre os convencionais. Era negra. Elegante. Faltava-lhe um vidro na composição da porta. Não era grande. Nem pequena.

A exibição sucedia de forma descuidada. A peça estava sempre empoeirada. Por mais de 12 meses a contemplamos. Checamos o preço. Fora da nossa realidade. Transbordava o precário orçamento de educador. Não havia espaço que a acomodasse no acanhado lar. Em meio à fumaça, não se avista a lua. Tenho a vista fraca. Um palmo diante do nariz nada enxergo. Tudo é brasa.

O realejo histórico explica que a cristaleira existe desde o século XVII. O mimo nasceu como distinção de classe. Louças, pratarias e talheres eram ali expostos.  Na casa, o móvel ocupava lugar privilegiado. Um empavulamento de poder. Uma carteirada.  Zero ternura, mermão.

“O cara tava me devendo um troco. Não tinha como pagar. O que possuía de valor era a cristaleira. Tomei!”, explicou o vendedor em uma das muitas incursões à mal ajambrada loja.  Segundo ele, para a venda fez uma redução radical do preço original com vistas a despachar o móvel com maior brevidade possível.

Existe amor em Santarém? Em recente visita à loja para verificar preço de uma banqueta, indagamos a outro vendedor o destino tomado pela cristaleira. Estávamos curiosos em saber quem a adquiriu. Com desenvoltura o senhor explicou que o dono original a resgatou. 

Deus duvidará de algo? O prestador de serviço conta com entusiasmo juvenil que o dono havia se enrabichado por uma enteada. Ganhou o mundo movido pelo mais pueril amor. A longevidade do romance durou menos que um algodão doce em quermesse de tarde modorrenta.  Música para televisão.  

Inúmeras vezes contemplado com chifres pela Lolita, drasticamente decidiu em retornar para o município, onde de imediato readquiriu o móvel.   Sabe-se que hoje vive em exílio amoroso em algum ramal na estrada que leva até Alter. E, que arrumou a cristaleira, que por mais de um ano tomou poeira e chuva à sua espera.

Em meio a tempestades de mágoas, encontros e desencontros, uma moça vasta em trajes mínimos, empacota diuturnamente em um mercantil, toneladas de tédios.  Rareia no peito da vida bom coração.

terça-feira, 27 de agosto de 2024

Alenquer, pacata?

Mercado Municipal de Alenquer, 100 anos. 
 

Aparentemente pacata, a cidade de Alenquer, Baixo Amazonas, foi sacudida por uma chacina de três jovens no fim de semana. Em todo canto o assunto era a pauta. No grupo de executados um jovem somava 18 anos e o outro 21. Fala-se que foi acerto de contas. Parada do tráfico.

Os tiros foram desferidos na cabeça, o que caracteriza execução. Os moradores comentam que infelizmente o município faz parte da rota. Além do tráfico, desponta na cidade de Benedicto Monteiro a prática da agiotagem.  Na segunda passada o clima era de receio. 

Tanto uma atividade, quanto outra empenham recurso em candidatos para o Legislativo. Uma prática que parecia uma especificidade dos grandes centros urbanos.

Uma outra questão diz respeito ao uso indiscriminado do agrotóxico. Os ximangos refletiam sobre o incremento de câncer no município. No mercado municipal, que somou 100 anos, os moradores sinalizaram para a atividade da pecuária e de monocultivos. Reclamavam que além da ausência de habilidade no uso dos venenos, a situação piora com a questão do descarte.

O aumento de suicídio de jovens foi um outro tema. Na cidade onde ainda é possível encontrar carro de boi e gente andando a cavalo no perímetro urbano, o aspecto pacato parece eclipsado. Para além das fumaças de queimadas.

 

quinta-feira, 22 de agosto de 2024

Ovo gelado

O dia caiu. A noite não acudiu. Ruídos de animais. Sombras de palmeiras. Assobio de vento invoca curupira, matinta, boitatá. O mundo não tem solução. Temerária equação em carnaval de lama. Cozido, em um canto, logo cedo, o ovo foi resgatado.  Ele escapara de ter virado recheio de pastel em dias pretéritos. O ovo que sonhara em ser astronauta, navegava em  galáxias de solidão em geladeira sem luz. Alvo. Quase transparente, nunca tomou um fio de sol.  Não foi à praia. Nunca flertou em samba ou fez serenata, ofertou flores à musa. Aos pés da Santa Cruz jurou honrar os pais. Mal sabia que iria virar desjejum de faminto de amor. Um ovo só, é apenas um ovo só. Ovo gelado combina com doce, Docinho?  O que passou pela cabeça do ovo ao ser destroçado, untado por sal de segunda, e em seguida sufocado por um bom punhado de farinha? Farinha baguda. Bruta.  O ovo cozido, em breve, será adubo, coco, sem nunca ter tocado uma gaita ou flauta. Usado óculos escuros para as suas lágrimas esconder.

Doutor Honoris: Ufopa concede título ao alenquerense Benedicto Monteiro


O Conselho Superior da UFOPA (Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), em reunião no dia 21, ontem, decidiu em conceder o título de doutor honoris a Benedicto Monteiro. Ele foi advogado, político, gestor público, jornalista, professor, abnegado defensor de democracia e dos direitos humanos. 

Vivo fosse, Bené, com era tratado pelos mais próximos, somaria 100 anos. Ao longo do ano, o defensor de posseiro tem sido pauta de homenagens, republicação de parte de sua obra, palestras e webinários em diferentes partes do país. A exemplo da agenda na Feira Panamazônica do Livro, em Belém, no dia 24, a partir das 19h. Wanda Monteiro, poeta e filha de Benedicto será a palestrante.

A iniciativa da chancela partiu do curso de Gestão Pública e Desenvolvimento Regional (Santarém e Alenquer), graduação vinculada ao Instituto de Ciências da Sociedade (ICS), que também endossou a comenda em reunião de seu conselho.

A turma do curso de Alenquer, cidade natal do escritor, vem realizando inúmeros eventos em favor da publicização sobre a obra do autor. A Câmara de vereadores fez uma moção de aplausos sob a iniciativa do vereador e aluno do curso de Gestão, Luiz Alberto Freire. 

Obra

A Terceira Margem integra o que ficou consagrado como a tetralogia (Verde Vagomundo, Minossauro e Aquele Um) do autor ximango (alenquerense), Benedicto Wilfred Monteiro, nascido no dia 29 de fevereiro de 1924 nas paragens de Alenquer, no Baixo Amazonas, ou oeste paraense.

Por se tratar de um ano bissexto o registro de nascimento consta como  nascido no dia 01 de março. Decisão tomada pelos pais Ludgero Burlamaqui Monteiro e Heribertina Batista Monteiro.

Bené foi um homem múltiplo. Colheu na oralidade/sabença do universo da várzea de sua terra natal, por entre furos, paranás, igapós e rios, a seiva que servirá de nutriente de sua obra. Como salienta o professor Darci Ribeiro, Monteiro apresenta ao mundo a civilização da várzea, as suas tramas, dramas, contradições e possibilidades.

Abílio Pacheco, professor da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), em Marabá, assina uma tese sobre a obra de Benedicto. O trabalho foi realizado na Universidade de Campinas (Unicamp).  O professor tem feito par com Wanda Monteiro em palestras e seminários.  A tese pode ser acessada AQUI.

Acesse o documento que serviu de base para o título de doutor honoris AQUI

domingo, 4 de agosto de 2024

Frashdance TF: Terra Firme ambienta longa-metragem do jornalista e diretor Ismael Machado.

A atriz e diretora de teatro Vlad Cunha assina roteiro em parceria com Machado. Frashdance  foi o único projeto paraense aprovado no edital de 2022 da Ancine. 


Foto: divukgação

Único projeto paraense aprovado no Edital Ancine 2022 Novos Realizadores, o longa-metragem de ficção Flashdance TF iniciou as filmagens no fim do mês passado, em Belém. O filme é uma realização da produtora paraense Floresta Urbana e tem filmagens previstas por todo o mês de agosto, com locações no bairro da Terra Firme e centro da capital.

Com direção de Ismael Machado e roteiro dele em parceria com Vlad Cunha, o filme tem uma peculiaridade. Praticamente todos os atores e atrizes são oriundos do bairro da Terra Firme. A preparação do elenco ficou a cargo de Cláudio Barros. Um número significativo da equipe técnica também é do mesmo bairro.

A história do filme se passa um ano depois de uma noite de chacina que dizimou 15 pessoas no bairro da Terra Firme. Uma das vítimas foi o pai dos personagens Greyce e JP. O casal de irmãos forma um minigrupo de dança, ‘agenciado’ informalmente por um amigo chamado Pato. O trio se divide entre ensaios e a luta pela sobrevivência no cenário de pobreza que é o cotidiano de cada um.

A dupla irmã costuma se apresentar no bairro fazendo ‘street dance’. Sem jeito para dança, Pato atua como um empresário informal da dupla. É um jovem que vive de pequenos ‘expedientes’, malandro, que se dá bem com todo mundo, mas é enrolado e vive no limite entre a legalidade e a marginalidade.

 No dia do ato em protesto pela impunidade da chacina, o grupo fica sabendo que foi selecionado num concurso de dança contemporânea no imponente Teatro da Paz. No mesmo dia, Pato testemunha uma espécie de ‘sequestro’ de um amigo seu, Colorau. Pato filma a cena com seu celular, e depois que o corpo do amigo é encontrado num matagal, sem pensar nas consequências, compartilha o vídeo da última vez em que Colorau foi visto, colocando a própria vida em risco.

O edital Ancine Novos Realizadores 2022 foi um certame nacional, envolvendo produtoras audiovisuais de todos os quadrantes. Apenas seis projetos da Região Norte foram selecionados. Flashdance TF foi o único paraense incluído na lista.

 


Búfalo antigo, livro de Charles Trocate encarna um contrato em favor da utopia

Lançado pela Mezanino Editorial, Búfalo antigo é a oitava cria da lavra de errâncias do pensador do front amazônico. Em primeira mão o poeta apresenta as suas armas e acende a fogueira de indignações e furor diante  da encruza civilizatória


Charles Trocate é caboclo Amazônida, nascido e criado nas transitoriedades do Pará, e nosso intelectual corre-mundo como escreveu o professor Paulo Nunes em texto de orelha do livro em questão. Em poesia é sua oitava aparição desde que decidiu escrever para driblar a miséria que confrontava sua adolescência. Nas últimas duas décadas transformou-se em militante político e escritor, e escritor e militante político, pelo último livro que agora vem a público é fácil perceber que não se rendeu em nenhuma das frentes, alterando de maneira permanente estes lugares que escolheu para viver e imaginar.. A seguir, um dedo de prosa com o autor. 

Blog furo: Em que consiste Búfalo Antigo – ou Gabriel e outras orquídeas no bolso?

CT: : É um livro que levei alguns dias para escrevê-lo, e foi a demora necessária sem a qual, não teria êxito algum. Pude com esta paciência captar as confrontações da linguagem, e no transmudo assumir estas escolhas rítmicas que me alegra pelo resultado. Diria que ele é o imitável do que se move na floresta sonora – não tem compromisso só com a palavra bem escrita, mas com a extinção que ela provoca quando se externaliza na mercadoria, ‘sobretudo mercadorias privadas’, dos efeitos subjetivos que cria – ou mesmo quando se personifica no sujeito oculto, mas do que socializa a circunstância. Ainda posso afirmar que é o livro de como percebo a lâmina da faca e a carne que ela corta tentando me opor ao esmeril em sono sonâmbulo.

Blog Furo: “Me opor ao esmeril em sono sonambulo” como metáfora, isso se traduz em que?

 CT:  É a minha compreensão de que o mais singelo ato da vida cotidiana está hegemonizado ou mediado pela distopia, se dissecarmos a literatura e sua busca por frivolidades, por exemplo, iremos constatar que estamos presos há algo que não muda, de que tudo está limitado a rotina da frase perfeita. No entanto, se opor a isso é consumir o tempo por outras abstrações, é se livrar da epígrafe canônica – do belo e do herói à bancarrota, e acreditar que se, humanamente chegamos a esta realidade, só nos resta humanamente sairmos dela sem outro alarde na liturgia, ou seja, o sono sonâmbulo como antítese do que fazer experênciando a poesia que protagonize.

 Blog Furo:  Mas precisamente, o que pode fazer a poesia rente a distopia?

CT: Vamos lá, “Búfalo- Antigo” é um poema só, assinado em lugares e datas diferentes e sem cabeçalhos, quer dizer, sem títulos, começa com a seguinte construção – “em todo caso sei espantar a mosca, torcer a roupa que o corpo inventa”... e conclui, “e o charque repõe divisas nas preciosas pedras de amolar canivetes”. Isto para mim é o que pode fazer a poesia sobre este fatídico indivíduo que assimilamos e deve estar no centro das linguagens para libertar os entreatos da cooperação, ou ainda, renomear as coisas em equilíbro com a economia, a natureza e a sociedade, não pode ser texto para prazeres extra questões, só assim se tencionará para não ser escrita acessório à cata ventos.    

Blog Furo: Pensando aqui o livro que nos apresenta como “floresta sonora”, pode precisar este movimento da floresta?

Ao centro, Charles Trocate, ladeado dos editores da Mezanino. Foto: arquivo do poeta

CT: Este é um livro também “animista”, parte desta compreensão de que minha vida se sofistica com a dos outros animais nunca ao contrário, e é arte também a forma de percebê-la, nas outras vidas que tornamos moribunda e a expressão disso é a floresta, úmida, cultural, diversa. De certa forma, o livro se sobressai como protesto por esta “forma de matar, e por este jeito de morrer”, por este equívoco imperativo, de que podemos, mas que as outras vidas, no fundo, estamos eletrificados por esta perspectiva, e subverter isso pressupõem alterarmos o currículo da nossa forma de ser. Quando escrevo “eu beijei um a um membro efetivo da canga mineral, são os animais que bestializamos e tornamos sal e estrume esquecidos dentro do objeto industrial”, não é só a adesão solitária do indivíduo mimico, ou a comoção do eu lírico, é a forma de dizer que esta modernidade que nos dedicamos tanto a ter, a possuir sem pudor, se retroalimenta de algo finito, inclusive, nos arremessa à fábula da inevitabilidade, de que esta transgressão ecológica é o nosso ponto final.

Blog Furo: O livro ainda será lançado, mas já recebi em primeira mão, por isto, te indago, é um livro contra ordem, sobretudo pela poesia de densidade mineral que há nele?

CT: Diria que sim, e que também é um livro dialético, no entanto, sua mecânica não é para apascentar a ordem, torná-la aprazível, é contra sua forma de ser, arbitrária do moinho satânico e o seu tilintar cotidiano, seja pelas extremidades que provocam no sumiço repentino de geologias e os aforismos que há neles, como também pela cegueira política que abona tudo isso. Por exemplo, tem bienais de arte, as mais famosas delas, grandiosas festas literárias financiadas pelo dinheiro da commodity mineral, um sem fim de artistas que não quero aqui julgá-los, mas que, conscientes ou inconscientes, são envolvidos sem se perguntar – o que continua a ocorrer, no país, em Mariana e Brumadinho (MG), Barcarena (PA), quanto custa a natureza exaurida por esta forma de minerar e de lucrar, e financiar a arte? O que sei é que quando a arte e o artista se alienam da natureza, e as corporações da mineração constroem suas próprias subjetividades, estamos não só no limite ético, como estético também! Creio que não há mais espaço para esta acepção de que estamos bem, vivendo bem, neste modelo empresarial “que ergue e destrói coisas belas.”

Blog Furo: Qual tarefa tem o artista e a arte nessa fase de crise ecológica e transição energética?

CT: Há um pensamento em Umberto Eco – que “a arte só faz sentido para aqueles que não estão prisioneiros dos meios de comunicação de massas”. Eis aí uma questão para os movimentos políticos, contestatórios, de como fazer e comunicar a arte por outros meios? E isso quer dizer muito, de como estamos interpretando a crise climática e sobretudo – o que significa no fundamental a transição enérgica para as nossas vidas e qual o sentido ela trará para a arte? Por exemplo, até quando a técnica coordenará a política produzindo esse avesso das necessidades humanas, ainda que seja produto da sua criação? Parece decisivo que ocorra o contrário! No entanto, sei que a arte é a imitação da realidade, se ela estará prisioneira das corporações a nos assombrar pelo volume de capital que se realiza nela – nos grandes eventos de galeria como refinada maquiagem de que tudo está mudando para não mudar, ou seguirá autônoma, porém, limitada pela barbárie que assola o artista.

Blog Furo: Que fé depositar no artista?

CT: O que imagino sobre estas tensões é que o artista não pode fazer tudo, mas não pode se conformar, deve seguir com seu farol e agir sem parcimônia e habilitar-se, deve não só sentir, mas sem pedir licença, apresentar-se para evitar a queda do céu, como nos alertou Davi Kopenawa!

 

Blog Furo: Há uma fascistização da palavra em curso?  

CT:  Este é um dos assuntos que tenho pensado demais, mas se consideramos que há um movimento social de ‘extrema direita’ na sociedade, é quase que natural que isso ocorra, e é deliberadamente sentido na repetição “da metafísica dos costumes”, o retorno ao passado, em tudo, a família era melhor no passado e etc... – minha impressão é que o neoliberalismo, se antes havia triunfado na economia e na desregulamentação no uso da natureza, por fim, transgrediu o indivíduo e a linguagem, e isto operacionaliza léxicos sociais do poder onde o consumo é a linguagem dos sentidos, claro que isto representa uma crise política estética onde tudo vira caricatura em estado degradante, onde o supérfluo se reconfigura pela padronização do gosto, seja nas amplificações de si para si  e do dinheiro que se ganha com isso – como também, se expressa no esvaziamento de que a literatura e a cultura são direitos sociais e devem, ao meu ver, serem reconduzidos ao centro dos nossos dilemas...

 

Blog Furo: Queres comentar, mas alguma questão...

CT: Paro por aqui, com o que diz o poeta Mexicano, Octavio Paz, fiquemos com “as perturbadoras propriedades das palavras”.

 

segunda-feira, 1 de julho de 2024

Incra do Oeste do Pará negligencia reforma agrária, denunciam entidades

A exclusão de várias entidades do processo de planejamento estratégico da instituição faz parte do rol das reclamações contra a direção do INCRA

 

Na data de 18 de junho de 2024, a Superintendência do Incra Oeste do Pará realizou o que se chamou de “Reunião de Monitoramento do Planejamento Estratégico Participativo do Incra”. Ocorre que,entidades representativas de moradores/as de assentamentos, trabalhadores e trabalhadoras rurais e comunidades não foram devidamente convidadas. Ainda que algumas pessoas e entidades tenham conseguido participar, considera-se como grave a ausência da maioria das lideranças interessadas, ausência esta ocasionada por falta de comunicação da superintendência. Tal atitude, contrária ao diálogo aberto e transparente, atenta contra a participação social como havia prometido o atual Superintendente José Maria Melo.

 Infelizmente não foi a primeira vez. Na data de 14 e 15 de março ocorreu o Planejamento Estratégico Participativo do Incra no auditório da UFOPA. Este planejamento foi avaliado como ruim pelas lideranças locais em razão de que não tinham sido convidadas com a devida antecedência. O que se conclui é que a gestão não tem sido participativa, e se for estratégica, não é para a agricultura familiar.

 

É importante destacar que desde 2022 o Incra vem reduzindo, cancelando e convertendo os assentamentos de Reforma Agrária no Oeste do Pará. Antes do Governo Lula, havia sido cancelado o PAC Bela Terra, cuja área hoje tem sua paisagem tomada por um imenso campo de soja. O PAC Araipacupu, no Médio Tapajós, foi convertido em PA convencional com redução de milhares de hectares. Tal como ocorreu com o PDS Esperança do Trairão (anteriormente chamado do PDS Presidente Lula). Em todos assentamentos falta o maior imbróglio para o Incra: a revisão ocupacional.

Em 2023, a Superintendência se justificou inúmeras vezes de que não poderia atuar, nem fazer revisão ocupacional de assentamento, por falta de orçamento. Neste ano, a situação mudou, mas pelo visto, os recursos disponíveis não estão com sua aplicação sendo planejada junto com as entidades representativas que se vêem deslegitimadas pelo atual superintendente. José Maria Melo, mesmo sendo filiado ao Partido dos Trabalhadores, o PT, parece não ter interesse na Reforma Agrária.

Em 2024, uma prioridade foi desconsiderada pelo Incra: as conclusões dos trabalhos de georreferenciamento no PAE Lago Grande. O maior assentamento da América Latina ainda não tem CCDRU, ou seja, o título coletivo que dá garantia do território a mais de 120 comunidades tradicionais da Amazônia. E sua priorização pelo Incra entra em xeque. Enquanto isso, ameaças às lideranças do PAE Lago Grande não cessam, e a pressão para abrir a terra para mineração de bauxita vem do município vizinho, Juruti, onde está implantada a ALCOA e de onde vem o atual superintendente do Incra Oeste do Pará.

O PAE Lago Grande, assim como os demais assentamentos, coletivos e convencionais, tem sido alvo de abertura da floresta nativa para pastagem, o que ocasiona o assoreamento das nascentes dos rios e igarapés tornando as comunidades rurais ainda mais vulneráveis. A Reforma Agrária no Oeste do Pará é bandeira que não pode ser esquecida pelos companheiros, pois significa território, bem viver, natureza protegida e garantia de soberania e segurança alimentar.

Por esses motivos, nós, entidades abaixo assinadas, repudiamos a falta de diálogo, a baixa transparência e a ausência de participação na gestão do Incra Oeste do Pará.

18 de junho de 2024

 STTR de Santarém

FEAGLE

CNS - Conselho Nacional de populações extrativistas

Grupo Mãe Terra Guardiões do Bem Viver

FASE

Amazônia Terra de Direitos

Coletivo Maparajuba

CPT Itaituba

Movimento Tapajós Vivo

Movimento de Atingidos/as por Barragens

quarta-feira, 5 de junho de 2024

Rua sem saída

Agosto amazônico. Calor causticante.  Sol inclemente. Uma leseira toma o corpo como se malária fosse. Como se cardume de puraquê acertasse o corpo em cheio num nocaute elétrico. Abrupto esporão de arraia cravado no pé bom de bola.

O suor da testa alcança o olho. Cega. Trópico. Úmido e quente. Quente pra burro. Tal uma buceta em anseio na festa da carne. Bingo de quermesse.  Catedral do amor. Abismo de rosas. O corpo reclama igarapé.  Banho de bubuia. O cio balbucia.

A rua do bairro distante é de terra batida. A rua é assim em todo bairro distante, onde o esgoto viceja como se furo encarnasse. Quando o sol derreia, bacurizinhos tomam as portas das casas de madeira. A sombra rareia. Os adultos disputam um punhado. É assim todas as tardes.  A rua sem saída avizinha um shopping e um condomínio fechado. 

As crianças soltam pipas, brincam de futebol, tocam campainhas de outras casas em estado menos precário, mães e pais fazem barricadas de fofoca. Tiram meleca do nariz. Cospem no chão. Coçam o saco, ajeitam as calcinhas, ao menos as que usam o apetrecho. Tomam um trago de café quente.

Na rua sem saída, as casas são de madeira e cobertas por telha Brasilit. Inferno de Dante.  É a casa que a fome possibilitou erguer. Casas de gente pobre. Humilde. Barracão de zinco, que a lua quando alumeia toma as frestas do teto; e quando em chuva, irriga a miséria.  Casa de gente de outros mundos. Casa de penca de filhos.

Os gitinhos se misturam com a terra. Capitães de areia e de terra. Um exército.  Celebram a vida em meio a cães, aves, urubus e a fome.  Mais urubus que cães.  A fome é robusta por estas bandas. A fome mata. A fome não dá trégua, enquanto uma mulher vasta em toalha mínima estende roupas no varal que fica à rua. Cães e aves convivem em harmonia.

As crianças das bandas de cá seriam anfíbios como os filhos do Arapiuns? Os bacurizinhos da rua sem saída estão longe do rio.  O rio não dista tanto assim da rua sem saída. Na rua sem saída, sem asfalto, o esgoto corre a céu aberto. Uma escola municipal homenageia uma família de Confederados.

Uma frutaria poderia ser montada em uma das casas. O quintal vasto abriga açaí, carambola, jambo, manga, jaca, coco, goiaba e outras árvores que não sei identificar. Em um canto da rua sem cercas, abundam pés de mamão, goiaba e banana. Qualquer um é livre para apanhar. Um monte de cheiros.

A dona do quintal de muitas frutas é uma mulher baixinha. Coleciona enlaces amorosos. Pelo menos uns três. É temente a Deus. Vez em quando entoa louvores. Os netos a seguem. Todos desafinados. Os galos fazem a segunda voz.

quinta-feira, 30 de maio de 2024

Romaria celebra saga dos extrativistas Zé Cláudio e Maria em Nova Ipixuna/PA

 O casal foi executado no Projeto Agroextrativista Praialta Piranheira em maio de 2011

 

Foto: Felipe Milanez

José Cláudio e maria foram executados em uma tocaia promovida por grileiros de terra no dia 24 de maio de 2011, no Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Praialta Piranheira, localizado no município de Nova Ipixuna, sudeste do Pará. Como o vasto rosário de execuções e chacinas que marcam a história de luta pela terra na Amazônia, e em particular no estado do Pará, todos sabiam das ameaças que o casal sofria. 

Inúmeros foram os boletins de ocorrência registrados, bem como cartas denuncia publicizadas e registros nos relatórios da Comissão Pastoral da Terra (CPT).  A execução poderia ter sido evitada. Assim como tantas outras.

Em novembro de 2010, em Manaus, por ocasião da realização do evento Ted Amazônia, José voltou a registrar as ameaças que vinha sofrendo: “sou castanheiro desde os sete anos, defendo onde moro com minhas forças, denuncio, vou pra cima. Por isso vivo com a ameaça de levar uma bala na cabeça. Por isso eles acham que não devo viver”. Em outras ocasiões também já havia denunciado em entrevistas televisionadas nacionalmente sobre o risco que sofria. Nada foi feito.    


A Romaria Mártires da Floresta, que inicia amanhã, 31, na cidade de Marabá, e encerra no município de Nova Ipixuna, no dia 02, nasce como ato em defesa da memória da militância em defesa da floresta empreendida pelo casal.  

Além de celebrar a trajetória dos extrativistas, a agenda da Romaria contemplará debate sobre mudanças climáticas, e contará com o lançamento do livro assinado pelo jornalista e professor da Universidade Federal do Bahia, Felipe Milanez, no dia 31. A obra, Lutar com a floresta:Lutar com a floresta  resulta da vivência do ex editor da Nacional Geographic Brasil junto ao casal do PAE Praialta, uma exceção no expressivo universo de assentamentos rurais na região onde mais de se mata na luta pela terra no país.

Leia a programação AQUI

Mais informações Claudelice Santos

94 98196-9760

 

sexta-feira, 12 de abril de 2024

IV Prêmio Frei Henri de Direitos Humanos homenageará mulheres ativistas

 A chancela é uma iniciativa da OAB de Xinguara/PA e da Comissão Pastoral da Terra (CPT) 


 

Como forma de homenagear ativistas e defensores de direitos humanos, a Ordem dos Advogados do Brasil, Subseção Xinguara, localizada no sul do Pará, realizará neste sábado (13) o IV Prêmio Frei Henri de Direitos Humanos.

O prêmio é concedido a pessoas que de alguma forma possuem atuações relacionadas aos direitos humanos, em nível municipal, regional e nacional. Por levar o nome de Frei Henri, a premiação é uma forma de resistência em uma das regiões que possui histórico de violações aos direitos humanos, principalmente no que tange à violência no campo e desmatamento.

Frei Henri

Da ordem dos dominicano, formado em Direito, Frei Henri atuou como advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT) em Goiás e no Pará, tornando-se um dos maiores defensores dos direitos dos trabalhadores rurais e camponeses na região de fronteira agrícola da Amazônia brasileira.

Como advogado, teve atuação no Brasil a partir de 1984, quando obteve registro na OAB Goiás, e pouco tempo depois foi para o estado do Tocantins e em seguida mudou-se para o estado do Pará. Frei Henri atuou na condenação dos assassinos dos líderes sindicais João Canuto, morto em Rio Maria (PA) em 1985, e de seu sucessor, Expedito Ribeiro de Sousa, assassinado em 1991.

Em 1994, o dominicano foi condecorado com a Legião de Honra da França, e recebeu vários prêmios nacionais e internacionais por sua atuação em prol dos direitos humanos.

Por defender os pequenos agricultores e os sem-terra do Pará, Frei Henri foi ameaçado de morte na região de Xinguara (PA), onde residia, pelos fazendeiros locais. Na lista dos “marcados para morrer”, a sua cabeça valia R$100 mil. A da irmã Dorothy Stang, assassinada em 2005, R$50 mil.


O frade dominicano faleceu em Paris, aos 87 anos, no dia 26 de novembro de 2017. Em 2018 as cinzas de Frei Henri foram sepultadas no assentamento Frei Henri, localizado na PA-275, em Curionópolis (PA).

Premiação

A ideia do prêmio foi ocorreu em 2009, por ocasião de uma redação vencedora em âmbito nacional, sendo a partir daquele momento, suscitado a premiação para pessoas que vivenciam em seu cotidiano alguma contribuição na defesa dos direitos humanos. Em 2016, o Conselho da OAB de Xinguara formalizou a criação da premiação tendo Frei Henri a denominação do prêmio.

A IV edição do Prêmio homenageará mulheres defensoras dos direitos humanos inspiradas na pessoa do religioso e advogado Frei Henri: Sueli Aparecida Bellato, advogada e integrante da Comissão Brasileira de Justiça e Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) foi conselheira da Rede Social de Direitos Humanos e compõe o Grupo de Trabalho Araguaia (GTA); Luana Tomaz de Souza, Diretora Adjunta do Instituto de Ciências Jurídicas da UFPA, e Ayala Lindabeth Dias Ferreira, pedagoga e dirigente do setorial de direitos humanos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra no Estado do Pará (MST).

Programação

A premiação será a partir de 19h no auditório da OAB Xinguara com tema da palestra “O protagonismo das Mulheres na Defesa dos Direitos Humanos”.

A realização do evento conta com a parceria da Comissão Pastoral da Terra e do MST, que realizará no dia 14, no assentamento Frei Henri, em Curionópolis, celebração ecumênica, aula pública sobre o tema “Lutar não é crime! Movimentos sociais e a Democracia!”

Informações enviadas pela OAB de Xinguara/PA. 

Mais informações

Rivelino Zarpellon

94 99240-1313


segunda-feira, 4 de março de 2024

Raimundo Gomes da Cruz Neto, manifesta suas impressões sobre o livro Crônicas sobre o trecho.

 A cultura, a arte, a revolução: um passo adiante.

 

Bar da Ana e do Orlando, Cabelo Seco.  Lançamento do livro Crônicas sobre o trecho. Gilberto Leite, no primeiro plano e o educador Raimundo Gomes, no plano de fundo. 



Rio Tocantins, Marabá/PA. .Foto: Eric Belém

Esta noite de sábado, segundo dia do mês de março, do ano de 2024, não deverá cair no esquecimento tão cedo. Noite de poucos barcos navegando no rio Tocantins, de poucas estrelas, sinais de chuva, uma brisa leve, um calor amazônico tolerável, no cabelo seco, “bar da Ana”(da Ana e do Orlando).  Ali chegavam pouco a pouco, professores, estudantes, militantes históricos das lutas populares para prestigiarem o glorioso lançamento do recente livro do companheiro Rogério Almeida. Um dia após o lançamento do belíssimo livro do companheiro Ceará, intitulado: A destruição da Amazônia pela besta fera do capital e outros cordéis.

Sob o som de músicas de diversos gostos aos arredores de nossa concentração, com prazerosos goles de cerveja, cachaça, refrigerante, água,  acompanhados de tira gosto à moda da casa, servido pela sorridente companheira Ana, transeuntes movimentando a noite daquele trecho, a companheira Rose Bezerra com precisas palavras fez a abertura do que foi o lançamento do livro AMAZÔNIA: crônicas sobre o trecho, bulinações e alguns afetos.


Como em 2012, quando do  Lançamento do Pororoca Pequena, os educadores Rose Bezerra e Raimundo Gomes  foram fundamentais para o nosso encontro. Foto: Eric Belém

O autor, com sua simplicidade que lhe é peculiar, discorreu sobre a simbologia do lançamento ser naquele trecho, bairro que mesmo com todas as influências do avanço devastador do capital, não perdeu muitas de suas características de onde inicia a cidade, pelos idos de 1898. Bairro composto de grande maioria de negros e negras, que em lutas procuram manter tradições do trecho onde surgiu o boi bumbá, o rouxinol, as lendas como a “porca de bobe” e a primeira escola de samba de Marabá.

Tratou sobre a construção do livro, das influências e sugestões brotadas das encruzilhadas e trincheiras de dias e noites vividas entre desprazeres e prazeres, próprios de quem se propõe a “cair no trecho” sem se perder nos impostos limites do cotidiano, mas ter como princípio norteador para a vida de labor e afeto, o horizonte.


Bar da Ana e do Orlando, por ocasião do lançamento Crônica sobre o trecho. No primeiro plano, Gilberto Leite, amigo de Almeida, desde os tempos de república, na década de 90; e Raimundo Gomes, ao fundo.Foto: Eric Belém 

É como diz Rogério Almeida: “O Trecho nasce no caldo do desmatamento, da floresta que sucumbe em nome do saque, colocando sob ameaça todos os seus encantados e saberes ancestrais com os quais ela conflui. Saque permanente: vidas, terra, floresta, minério, água, energia...”

Usando da possibilidade de fala, o militante das Brigadas Populares, em nome da equipe do CEPASP (Centro de Educação, Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular), Raimundinho, agradeceu por mais uma contribuição que Rogério Almeida para a região de Carajás, com a entrega pública de mais um livro com grandioso  conteúdo, depois de nove anos atrás ter lançado o valioso Pororoca Pequena, não mais e nem menos maior que o de agora.

Enfatizou a tamanha perspicácia com que Rogério Almeida trata o cotidiano, na forma de observar, registrar e relatar, dando visibilidade às pessoas, aos gestos, aos tratos com solidariedade, que se somam e se dividem no trecho. Próprio de um militante, marxista, revolucionário, que avança fronteiras convivendo e compartilhando saberes necessários para os grandes saltos rumo a humanidade, rompendo as amarras impostas pela ideologia burguesa.

Pausamos com a poesia, pag. 149, Alguém Mandou. No morro, entre rimas, lágrimas, zincos e madeiras/Balas, balas, balas, aos montes/Como se fossem nuvens e gafanhotos/Balas, balas, balas em toneladas/A cada instante, todos os dias, durante todo o ano/Balas, balas, balas de todos os calibres/Sobre o alvo do corpo negro/Balas em crianças, balas em adultos e balas em velhos/A bala mata toda a família com único disparo/A bala abala a quebrada inteira/O surdo/Cansado, silencia velório das derradeiras crianças alvejadas/Flor da idade/Morte à queima roupa/Alguém mandou.../Mandou matar de bala, de raiva e de fome...

Recomendamos a imediata aquisição e leitura dos valorosos livros. Como disse o próprio Rogério, no lançamento: “não tem fins econômico, o que for arrecadado é para tomarmos de cerveja e cachaça, passem a grana ao companheiro Eric.”

Marabá 02 de março de 2024.

Brigadas Populares

terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

Puxirum de Ideais – docentes e técnicos da UFOPA organizam lançamento de livros de forma coletiva

 

Operários, 1933. Tarsila do Amaral

Puxirum de ideias é uma iniciativa de docentes do curso de Gestão Pública e Desenvolvimento Regional e convidados.  O princípio é tornar pública a produção da Ufopa para além dos muros da instituição, com vistas a estabelecer trocas e s diálogos com a sociedade do município.  O lançamento coletivo também consiste em uma singela homenagem aos 43 anos de existência do Instituto Cultural Boanerges Sena (ICBS), iniciativa animada pelo Cristovam Sena e família.

O evento ocorre na noite do dia 07 de março, a partir das 19h, no Quintal Sapucaia, localizado na Av. São Sebastião, nº 1233 (entre 7 de Setembro e Morais Sarmento), na semana da agenda pela passagem do Dia da Mulher.

Entre os livros que serão comercializados e expostos, constam:

Autora: Lene Oliveira – técnica da assessoria de comunicação da UFOPA – Doutora Universidade Fernando Pessoa (UFP) e a UFRGS

“O mundo encantado do Catalendas” é resultado da dissertação de mestrado defendida pela jornalista e pesquisadora Jorgelene Santos, em 2008, no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais – área de concentração Antropologia Social – do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, da Universidade Federal do Pará.  A obra foi editada e produzida pela Imprensa Oficial do Estado (IOE).

 

Autora: Gisele Alves – Gestão Pública

Pós-desenvolvimento e Bem Viver na Amazônia: aspectos teóricos e perspectivas aplicadas é fruto de um trabalho colaborativo entre docentes e discentes da Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA, que nasceu a partir das atividades do grupo de pesquisa CADES – Críticas e Alternativas ao Desenvolvimento na Amazônia, criado em 2017. O grupo nasceu com o objetivo de estudar, descrever e analisar as práticas sociais comunitárias vivenciadas na Amazônia, em específico na região Oeste do estado do Pará, sob a lente teórica do pós-desenvolvimento, e sob a perspectiva prática das experiências de Bem Viver ao redor do mundo; registrando práticas sociais de comunidades que possuem formas alternativas de organização da vida social, distantes dos ditames do desenvolvimento hegemônico.

Autora: Raimunda Monteiro – docente do curso de Gestão Pública cedida ao governo federal, ex reitora.

“Amazônia: espaço-estoque, a negação da vida e esperanças teimosas”. A obra trata do modelo de integração da Amazônia ao Brasil e ao mundo, e das consequências para os seus povos, no contexto dos 50 anos de construção da Rodovia Transamazônica. Exploração, ocupação desordenada, violência contra os povos, devastação e destruição ambiental ocupam muitas das páginas, que abrem espaço também para falar de esperança. O livro é o resultado no âmbito de estágio pós-doutoral na Universidade de Coimbra.

Autores/organizadores: Anselmo Alencar Colares e Maria Lília Imbiriba Sousa Colares

“A Pérola do Tapajós em Verso e Prosa” a publicação é uma homenagem à cidade de Santarém, reúne trabalhos em diferentes formatos cujo enfoque é a Pérola do Tapajós. Os professores organizadores são do  Instituto de Ciências da Educação (Iced).

Autores: Florencio Vaz e Luciana Carvalho – docentes do curso de Antropologia

 “Isso tudo é encantado: Histórias, Memórias e Conhecimentos dos Povos Amazônicos”.  Produzida pelo projeto de extensão “Hora do Xibé”, vinculado ao Núcleo Sacaca, a publicação reúne relatos feitos por indígenas e moradores de comunidades tradicionais da região sobre suas crenças e suas culturas.

Autor: Márcio Benassuly – docente do curso de Gestão Pública

“Santarém: dinâmicas da ocupação e uso do território (1542 - 2020). Editora CRV, Curitiba, 2021”. A publicação é abordado as dinâmicas da ocupação e uso do território em Santarém, estado do Pará no período entre 1542 - 2020, o que é justificado por ser 1542 a data do primeiro relato de contato entre europeus e os índios Tupaius em território santareno, a pesquisa de tem como marco temporal final o ano de 2020. A obra está estruturada em sete capítulos.

Cristovam Sena, editor e mantenedor do Instituto Cultural Boanerges Sena (ICBS)

"Tupaiulândia" - Paulo Rodrigues dos Santos é uma das principais obras que contam a história do município fundado em junho de 1661, pelo padre jesuíta de Luxemburgo, João Felipe Bettendorff. Publicado originalmente em 1972, ganhou outras edições em 1974 e 1999. Foi o resultado de mais de 40 anos de anotações e pesquisas do escritor Paulo Rodrigues dos Santos, falecido ainda nos anos  70, mas que deixou um profundo legado para a memória e cultura local.

Autor - Rogerio Almeida – docente do curso de Gestão Pública

“A Destruição da Amazônia pela besta fera do capital e outros cordéis”, do dirigente sindical e ambientalista Francisco Valter Pinheiro Gomes, o Ceará do Pará é o segundo livro do projeto de extensão Luta pela terra na Amazônia.  Coordenado pelo coordenador pelo Rogerio Almeida, teve  a contribuição das extensionistas Glenda Flávia Guimarães Cunha, Luana Vitória de Sousa Brito, Bianca Emanuelle Bezerra da Silva e Yasmin de Souza Corrêa em dialogo com o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Marabá e docentes da Faculdade de Educação do Campo da Unifesspa (Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará).

“Crônicas sobre o trecho”.   70 crônicas reunidas ao longo de várias jornadas em diferentes regiões do estado do Pará e vizinhança dão corpo ao livro.  As anotações encarnam uma espécie de diário de bordo. Em períodos curtos e urgentes, assim como a maioria dos parágrafos, os escritos são registros telegráficos, como se o escriba estivesse em fuga. Em suas errâncias (flanêur), Almeida manifesta o zelo pela arte da escuta e da observação.

 

Maiores informações

Rogerio Almeida (93) 99228 1379

Rita Peloso -93 99122 6622

Márcio Benassuly - 91 982111961

 

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

Livro de crônicas sobre a Amazônia tem no trecho a sua inquietação central.

70 crônicas dão corpo à obra do professor da Ufopa, Rogerio Almeida, do curso de Gestão Pública



70 crônicas dão corpo ao livro Amazônia: crônicas sobre o trecho, bulinações e alguns afetos. Assinado pelo professor Rogerio Almeida, do curso de Gestão Pública,  da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), o projeto foi selecionado pelo edital da Lei Paulo Gustavo. 

Os lançamentos ocorrerão em Marabá e Santarém. Na primeira cidade o evento será na noite do dia 02 de março, no Bar da Ana, no bairro do Cabelo Seco, núcleo Velha Marabá, a partir das 19h. Já em Santarém, ocorre na noite do dia 07, no espaço cultural Quinta Sapucaia, localizado na Av. São Sebastião, nº 1233 (entre 7 de Setembro e Morais Sarmento), a partir das 19h.  O livro fará parte de evento coletivo denominado de Puxirum de Ideias, que contará com lançamentos de obras de professores/as  e técnicos/as da Ufopa.  

Peão de trecho, assim é tratada a polissêmica categoria fronteira pelas pessoas que se mobilizam em busca de trabalho em grandes obras na região. Bem como por riqueza “fácil” em garimpo, fuga de secas e outras privações ou algum tipo de oportunidade longe de seus locais de origem.  

No livro, os períodos curtos imperam. Urgentes, assim como a maioria dos parágrafos. Registros telegráficos, como se o escriba estivesse em fuga. Em suas errâncias (flanêur), Almeida manifesta o zelo pela arte da escuta e da observação. Andar só é uma preferência. Ele acredita que a opção favorece o deslocamento. Referências a feiras, botecos fuleiros e puteiros são recorrentes em sua escrevivência.   

 Entre coisas vividas, vivenciadas e inventadas, o “vadio”, tal uma tia velha fuxiqueira, tece, uma aquarela dos vencidos em lonjuras (fronteiras) marcadas pela gula do capital, que a tudo fagocita, até o sorriso da tapuia após o coito matinal.  O recado consta em um poema.  

Nas geografias das errâncias, as estações do ano na Amazônia emergem ao queixar-se do sol inclemente, ou ao retratar as agruras dos tempos de cheia. O trecho é a questão que o inquieta, bem como os personagens que conferem forma, moldura e possível poesia e alma à obra.  

No trecho, o filho chora, e a mãe não faz ideia dos aperreios. Garimpos, grandes obras de infraestrutura, empreendimentos agropecuários funcionam como uma espécie de imã de errantes.  Tais sujeitos migram em busca de dias menos doridos. As privações que a maioria experimenta é combustível de canções populares, muito bem sublinhadas em suas anotações. Zé Geraldo, Elino Julião, Adelino Nascimento, Raimundo Soldado, Bartô Galeno estão entre os cantadores citados.

O trecho é bruto, avalia o autor. Todavia, para além das agruras, como acredita uma filha de garimpeiros de Itaituba, a educadora Rose Bezerra, a quem a obra é dedicada, é possível encontrar laços de solidariedade e amizades que perduram ao longo do tempo. Rogerio crê que as andanças representam uma faculdade sem parede. Em conversa sobre a origem da cria, ele explica que após atividades laborais precárias, havia uma necessidade de fazer apontamentos sobre o que observara.  

Em escrita ligeira, o professor tece a trajetória de garimpeiros, donas de bar, bravas mulheres que o iluminam, a exemplo da genitora e o matriarcado em que foi criado.   

Em texto de orelha, Charles Trocate, filosofo e poeta, sobre a obra considera “este livro tem a totalidade de uma obra inigualável, seja pela experiência de escrever reportagens – a primeira experiência literária do autor e a sofisticada paciência de compor o enredo que a vida transborda aos que vivem mais da falta do que do excesso. Diria que este livro expõe uma espécie de filosofia do trecho ou manual do que é não viver vivendo. Do começo ao fim, de trás para frente, ou inverso, ou do meio para o início, é como se percorrêssemos os milímetros, sem cansar, uma jornada de desapego”.

O pdf do livro pode ser baixado AQUI

Projeto Luta pela terra na Amazônia lança livro do cordelista e dirigente sindical Ceará do Pará (Francisco Gomes) do Movimento de Pequenos Agricultores (MPA).

Lançamentos ocorrerão em Marabá e Santarém em março




O livro A Destruição da Amazônia pela besta fera do capital e outros cordéis, do dirigente sindical e ambientalista Francisco Valter Pinheiro Gomes, o Ceará do Pará, será lançado no dia 01 de março no Hall Central do Prédio da Reitoria, Unidade/Campus 3, da Unifesspa (Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará), em Marabá, no dia 01 de março, a partir das 9h. 

Já em Santarém, o evento ocorrerá na noite do dia 07, no espaço cultural Quintal Sapucaia, localizado na Av. São Sebastião, nº 1233 (entre 7 de Setembro e Morais Sarmento), a partir das 19h.  O livro fará parte de evento coletivo denominado de Puxirum de Ideias, que contará com lançamentos de obras de professores/as da Ufopa.  

Para a impressão da obra, o projeto contou com o apoio da Cese (Coordenadoria Ecumênica de Serviço) e a Cafod, uma agência internacional de desenvolvimento ligada à Igreja Católica. 

O livro resulta do projeto de extensão da UFOPA, Luta pela terra na Amazônia, coordenador pelo Rogerio Almeida, do curso de Gestão Pública, e a contribuição das extensionistas Glenda Flávia Guimarães Cunha, Luana Vitória de Sousa Brito, Bianca Emanuelle Bezerra da Silva e Yasmin de Souza Corrêa.

 No percurso do projeto, as discentes  além de entrevista com o escritor,  realizaram a leitura de artigos e debates sobre a questão da terra na Amazônia , o que teve como produto dois artigos a partir dos livretos de cordel, onde as autoras relacionam as conjunturas realçadas nos livretos, os sujeitos envolvidos nos processos e as políticas públicas. 

Ambos os trabalhos foram selecionados para a apresentação no Encontro Nacional da Rede Alcar (Associação Brasileira de Pesquisadores da História da Mídia), ocorrido em Niterói, no mês de agosto de 2023. Todavia, o elevado preço das passagens aéreas, além de outros custos inviabilizaram a participação de um autor no evento.  Além dos artigos, Glenda Flávia realizou o trabalho de conclusão sobre a obra do cordelista, a ser apresentado em março.

Para a produção do livro, o projeto estabeleceu diálogo com o escritor, educadores da Faculdade de Educação do Campo da Unifesspa, em particular com o professor Haroldo de Souza, com o Movimento de Pequenos Agricultores (MPA) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Marabá.   

Na jornada os professores e pesquisadores Airton Pereira (Uepa) e Fabíola Pinheiro doutorando da Unir (Universidade Federal Rondônia) colaboraram em debates sobre as disputas territoriais no sudeste paraense e sobre escrita científica.  O artista Rildo Brasil de Marabá assina a capa e outras ilustrações do livro, assim como Thulla Christina.

A obra reúne quatro livretos de cordel produzidos pelo escritor desde os anos iniciais da década de 2000. No conjunto da obra, Ceará registra as formas de r-existência dos seus iguais, a exemplo do cordel que recupera a ação direta dos camponeses no início da década de 2000.  Os grandes acampamentos de Marabá, como a ação ficou reconhecida, aglutinava perto de 20 mil pessoas na frente da sede do INCRA. O ato demonstra a enorme capacidade de organização do conjunto dos movimentos sociais ligados à luta pela terra, em plena conjuntura do avanço de políticas neoliberais.

As políticas públicas desenvolvimentistas impostas para a Amazônia também inquietam o cordelista. Nele, Ceará alumeia os sujeitos das pelejas das disputas pela terra, trata das violências, dos crimes contra os camponeses e camponesas e responsabiliza o Estado autoritário pelo avanço do capital sobre a fronteira.

Para além da pecuária, em outra obra, o migrante e sindicalista trata do poder da mineradora Vale, na região sudeste do estado, onde Ceará reside e r-existe.  Por conta da hipertrofia do poder da mineradora, ela é considerada uma empresa maior que o estado do Pará.  A mineradora expropria, proíbe acesso à terra, à floresta e ao rio. Vigia e processa os que ousam denunciar os seus abusos.

Ceará já foi cabra marcado para morrer, como conta em sua entrevista. Atualmente, é estudante do curso de Educação do Campo, da Universidade Unifesspa, Campus de Marabá. Segue a teimar contra os muros altos.

O presente livro encontra-se assim organizado: prefácio, apresentação, os dois artigos produzidos no projeto de extensão, uma entrevista com o autor e os respectivos cordéis. Como alerta o samba enredo da Mangueira de 2019, que exalta os sujeitos historicamente colocados em condições de subalternização: “É na luta que a gente se encontra!”.

Os cordéis de Ceará do Pará é uma lição, que a alerta a todos que a mão que lavra a terra, afronta as cercas do latifúndio e de terras griladas, também se indispõe com as palavras, antes, monopólio de poucos.

 Baixe o livro AQUI

Maiores Informações

Ceará do Pará – (94) 99155-7624

Rogerio Almeida – (93) 99228 1379

Haroldo de Souza – (94) 99145-7737

Glenda Flávia - 93 99653-8900