sábado, 7 de novembro de 2015

Mineração na Amazônia - nossos transbordamentos e a economia de enclave


Desde a década de 1980 a atividade registra acidentes de grandes proporções
A atividade mineral rege a economia paraense. O ferro é o principal produto, ladeado de bauxita, caulim, cobre, níquel, manganês, ouro e por ai vai. Data dos anos 1960 o início da atividade em escala industrial. Vale, Alcoa, Belo Sun, Norsk Hidro, Votorantim, Ymeris, Xstrata são algumas das empresas que protagonizam o saque das riquezas locais.
A atividade não dinamiza a economia do estado. A exportação de produtos primários ou no máximo semielaborados conforma o mercado. Recursos naturais em abundância, energia subsidiada, financiamento público, renúncia fiscal, mão de obra barata, ausência de controle social e insuficiência ou fragilidade total no monitoramento da atividade pelo setor púbico são alguns fatores que animam a presença de grandes grupos do mercado mundial.
Numa perspectiva que aprofunda a condição colonial da região, marcada pela expropriação e a espoliação das populações ancestrais, que socializam os passivos sociais e ambientais.   
Cadeia do alumínio – A Albrás e Alunorte representam o maior complexo de produção de alumínio do mundo, sediado na ilha de Barcarena. A empresa Norueguesa Norsk Hidro é a maior acionista. O empreendimento data da década de 1980, e inicialmente foi tocado pela Vale e um grupo japonês. A matéria prima, o minério da bauxita, foi encontrado no final dos anos de 1960, no Vale do Trombetas, município de Oriximiná, distante uns 900 quilômetros de Barcarena.
A atividade no Trombetas protagonizou o desastre ambiental do Lago do Batata, que foi utilizado como depósito dos rejeitos do processo da extração mineral por uma década (1979 a 1989). O desastre do Lago do Batata é considerado um dos mais graves acidentes ambientais na Amazônia. Neste momento histórico, a legislação ambiental ganhava forma.
Transbordos das bacias de rejeitos Em Barcarena- Em qualquer canto do mundo, a atividade minerária é indutora de passivos sociais e ambientais. Os acidentes continuaram a acontecer nos anos 2000, na cidade de Barcarena, como o transbordo da bacia de contenção de efluentes da fábrica Albrás e Alunorte. Um registrado em 2004, e o outro em 2009, que feriram de morte o rio Murucupi.
O rejeito do processo químico Bayer, filtra entre outros reagentes danosos à saúde humana, aos furos, igarapés e rios, o óxido de ferro insolúvel, titânio, sódio a sílica.  O produto final é chamado de lama vermelha. Somente em 2010, após seis anos do acidente, a justiça estadual condenou as empresas Alunorte e Albrás a pagar para 15 famílias quatro salários mínimos (por danos materiais) e R$ 30 mil (por danos morais). A sentença foi dada pelo juiz da 1ª Vara da Comarca de Barcarena, Raimundo Santana.
Em visita ao Distrito Industrial é possível visualizar que outras bacias de contenção de rejeitos estão sendo construídas. Isso resulta da saturação das antigas e ampliação da produção da cadeia de alumínio.
A verticalização de parte da produção da cadeia vem sido realizada pela Alubar Metais e Cabos S\A, que produz vergalhões de liga de alumínio para fins elétricos e siderúrgicos desde o início da década.
Produção de Caulim e acidentes- Já a francesa Ymeris opera com Caulim desde 1996. Em 2010, a empresa adquiriu a Pará Pigmentos S.A. (PSSA), que pertencia ao Grupo Vale. Com estrutura duplicada, a mineradora passou a ter a maior planta de beneficiamento de caulim do mundo e 71% de participação na produção de caulim no Brasil.
Em junho de 2007,  os tanques de contenção de rejeitos da empresa transbordaram  e 200 mil m³ de efluentes  tomaram as águas do rio das Cobras, e os igarapés  Cururperé e do Dendê, entre outros. Por conta do acidente, a Semas multou a empresa em R$ 5 milhões.
Em março de 2008, novo vazamento da bacia de rejeitos agravou ainda mais a situação dos moradores da Vila do Conde, que mais uma vez se viram impedidos de usarem os recursos hídricos da região - foram atingidos os igarapés Curuperé, Dendê e São João, além da praia de Vila do Conde e o rio das Cobras. Em 2014 moradores denunciaram outro vazamento. Os acidentes integram o Mapa da Injustiça Ambiental da Fiocruz.
A empresa assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) junto ao Ministério Público Estadual (MPE), com mediação do promotor de justiça, Raimundo Moraes. Os valores somados ultrapassam a casa de R$ 5 milhões.
Como medidas compensatórias e indenizatórias pelos danos ambientais e morais coletivos, o MPE, recomendou à mineradora o financiamento do Projeto de Desenvolvimento de Capacidade Social para associações formais ou informais da região atingida para fortalecer a capacidade de organização, planejamento e execução de projetos.
 
O TAC estabeleceu também o financiamento de projeto de educação ambiental sob a responsabilidade da Associação Barcarenense de Educação Ambiental – ABEA, e aquisições de equipamentos necessários ao desempenho de atividades do Instituto de Perícias Científicas Renato Chaves e do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Pará.
 
As indenizações também foram dirigidas ao aperfeiçoamento da estrutura do Centro de Saúde da Vila do Conde, município de Barcarena, Associação dos Barraqueiros da Praia, comerciantes de Vila do Conde, amigos da Orla de Itupanema, moradores do Bairro Industrial, e famílias nativas do igarapé Curuperê.
 
Um antigo morador do local, que foi sindicalista, pontua algumas delicadas situações sobre o cenário da ilha. “Não existe controle social sobre os processos que ocorrem na cidade, o estado não possui equipamentos e pessoal qualificado para monitorar a produção e emissão dos rejeitos das grandes empresas. O que ocorre é um faz de conta. As empresas produzem relatórios e as instituições os endossam”, acusa o aposentado, que prefere não se identificar por colecionar processos por conta de denúncias de crimes ambientais que realizou.
Laudos científicos - O Instituto Evandro Chagas e o Departamento de Química da Universidade Federal do Pará (UFPA) produziram documentos sobre os riscos que corre a população. A doutora Simone Pereira, da UFPA, alerta que existe uma série de efluentes cancerígenos a ameaçar os comunitários, como o Cádio, o Btex compostos formado pelos hidrocarbonetos: benzeno, tolueno, etil-benzeno e os xilenos (o-xileno, m-xileno e p-xileno). Além de produzir artigos sobre o tema, a professora têm orientado dissertações e teses. “Os nossos rios viraram receptáculos dos efluentes das grandes empresas”, critica a pesquisadora. 
Enclave conforma a economia do Pará - O extrativismo mineral, o setor de serviços com ênfase no comércio e a administração pública integram o centro da economia do estado. Já na extração vegetal destacam-se a madeira, o açaí e o palmito.
“Em 2014, o Pará foi o sexto estado em exportação no país e o segundo melhor resultado na balança comercial na federação. Minério de ferro e boi vivo concentram as exportações”, apontam dados do Anuário Estatístico de Receitas do Pará de 2014. A exportação de produtos primários de baixo valor agregado para o mercado externo é a base da produção do estado, com efeito limitado sobre emprego e renda.
O mesmo minério que pesa no PIB é responsável por uma renúncia fiscal de 9 bilhões de reais por ano por conta da Lei Kandir (lei complementar federal n.º 87/1996), que desonera as empresas em recolher o Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviço (ICMS) dos produtos primários e semielaborados.
Nas terras dos Carajás, a exploração da mina de ferro na Serra Sul, no município de Canaã dos Carajás, sudeste do Pará e a duplicação da ferrovia escrevem mais um capítulo de uma história marcada pelo saque.

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Barcarena - ao celebrar o primeiro mês de aniversário do acidente que matou mais de 4 mil bois, distribuição de água e cesta básica não existe mais


Prestes a celebrar o primeiro mês de aniversário do acidente que matou quase cinco cabeças de gado, a população de Barcarena continua desassistida pelas instituições públicas e as empresas responsáveis pela compra e transporte da carga viva na Vila do Conde.

Conforme informações de moradores da Vila do Conde, a distribuição cesta básica e água não existe mais. “O que ainda estavam fazendo era distribuir arroz”, declara um morador da comunidade.

A ação desordenada entre os diferentes atores públicos marcou a ação reativa do Estado em relação ao acidente. Apesar do polo industrial, a cidade não conta com plano de contingência.  Até o acidente com o navio, não existia defesa civil.  

Barcarena, uma ilha industrial, vive sob o signo de risco de grandes acidentes ambientais. Faz uns 10 anos que acidentes de grandes proporções fazem parte da rotina de moradores tradicionais da cidade e vizinhança. 

Grandes corporações do setor de alumínio da cadeia de alumínio controladas pela norueguesa Hidro, o extrativismo do caulim pela a francesa Ymeris, a estadunidense Bunge do setor de grãos e fertilizantes são algumas estrelas da constelação.

Investigações da UFPA e do Instituto Evandro Chagas atestam o comprometimento dos recursos hídricos da cidade por conta da emissão de rejeitos dos processos químicos e dos acidentes com os transbordamentos da bacias dos mesmos em furos, igarapés e rios.  

Há o comprometimento da saúde de trabalhadores, moradores e das populações rurais. As últimas consideradas as mais vulneráveis, posto, que acabam por socializar os prejuízos causados pelos acidentes, que colocam em risco a segurança alimentar.

No Furo do Arrozal, por exemplo, pescadores compartilham os prejuízos por conta do acidente com o gado e outro com as balsas de soja da Bunge.  

Um antigo ativista ambiental analisa que “as instituições públicas responsáveis pela fiscalização e monitoramento do setor de saúde e meio ambiente não possuem estrutura e quadro de pessoas para fiscalizar de forma séria e isenta as grandes empresas que atuam na cidade”.

“Morar aqui é como dormir no pé de um vulcão ativo”, crava um técnico industrial que prefere não se identificar.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

III Chamado da Floresta, mesmo antes do evento o Movimento Tapajós Vivo alertava sobre limites

O Pe Edilberto Sena, Membro do Movimento Tapajós Vivo e coordenador da Comissão Diocesana de Justiça e Paz de Santarém assina o texto abaixo.  
Chamado da Floresta no rio Arapiuns quem ouvirá os clamores?
 
A Comunidade São Pedro fica a oito horas de barco, saindo de Santarém indo pelo rio Arapiuns. É uma das dezenas de comunidades da Reserva Extrativista Tapajós Arapiuns. De hoje  até amanhã estão reunidos cerca de 2 mil pessoas, vindas de diversas reservas extrativistas da Amazônia. É o terceiro Chamado da Floresta.
 
Se para os participantes que vieram de longe e de perto, o evento parece importante, para outros amazônidas há um certo ceticismo quanto aos resultados de tanto esforço. Segundo um dos lideres locais do Conselho Nacional dos Seringueiros, que promove o evento, esse Chamado da Floresta é um encontro de diálogo interno dos moradores das reservas extrativistas que pretendem fazer várias demandas necessárias para sua sobrevivência. Mas frisou ele que não será um confronto, mas diálogo com os convidados do governo federal.
 
Até ontem havia questionamentos na cidade de Santarém sobre a anunciada vinda da presidente Dilma ao encontro dos povos da floresta. Viria ela ou não? Se viesse, o que diria aos participantes? Além dela estavam confirmadas presenças de quarto ou cinco ministros de  governo, entre outros estariam a ministros, de Minas e Energia, do Meio Ambiente, Ministro das cidades, etc.
 
O Movimento Tapajós Vivo da cidade de Santarém que luta na defesa dos povos e do rio Tapajós, que não foi convidado ao Chamado da Floresta, preparou um manifesto a ser distribuído durante o evento. O organizador local avisou que estava fechada a programação e  não estava incluída  fala do Movimento Tapajós Vivo em público porque o evento era interno só dos extrativistas.
 
No curto e direto manifesto, o Movimento afirma que resistir é preciso custe o que custar. “Não podemos aplaudir a presidente e seus ministros, que continuam insistindo em construir sete hidroelétricas em nosso rio Tapajós”. Continua o manifesto com outra dura crítica – “ com a maior frieza a presidente Dilma assinou a medida provisória 558/2012, reduzindo em 10 mil hectares a área do Parque NACIONAL da  Amazônia e deixando desprotegidas mais de 100 mil hectares de florestas de outras áreas de proteção permanente, tudo isso consciente de que serão áreas inundadas pelas barragens no rio Tapajós”. Se a presidente diz que não abre mão das hidroelétricas no Tapajós, como podem os povos da floresta aplaudir ingenuamente quem trabalha contra eles?
 
O manifesto do Movimento Tapajós vivo conclama os participantes do Chamado da Floresta a unir forças para resistir às violações de seus territórios. Diz a conclamação: “ Não abrimos mão do Tapajós, porque não queremos Povos expulsos de suas terras, nem dinâmica do rio alterada com a perda de várias espécies de peixes  de piracema, não queremos seca do rio abaixo das barragens o ano todo. Presidente Dilma, respeite nossos direitos.
 
Mas não só o Movimento popular Tapajós vivo é cético dos resultados do Chamado da Floresta. Os pescadores artesanais estão revoltados com a recente mudança da lei de salário do defeso. A Colônia dos Pescadores também se manifesta  descrente dos resultados do tal diálogo com o governo. Simplesmente o governo Dilma cancelou o pagamento do salário desemprego durante o defeso, quando os peixes recebiam descanso para desova. Para economizar recurso de seu orçamento o governo despreza os direitos dos pescadores que agora serão obrigados a pescar peixes ovados para sobreviver.
 
Revoltados os pescadores tentam  reverter essa criminosa atitude do governo. Por esse e outros atos de ignorar direitos dos povos da floresta é que a presença da presidente, não só é criticada como certamente ela não virá, pois não escuta o chamado da floresta. Não se trata de oposição política, mas grito de indignação dos povos conscientes da floresta.

domingo, 1 de novembro de 2015

III Chamado da Floresta, afinal de contas, o que foi?


Afinal, o que foi o III Chamado da Floresta, que ocorreu na Resex Tapajós-Arapiuns, no município de Santarém, nos dias 28 e 29 de outubro, organizado pelo CNS, uma grande ação social para assinatura de convênios pelo governo federal com o endosso do capital?

Em tempos de hiperconetividade, não encontrei um documento base ou uma carta final sobre o III Chamado. Alô Chamado. Chamando o Chamado: Existe uma avaliação sobre o grande combate sobre desenvolvimento da Amazônia, em tempos de PEC 215, que objetiva azeitar o controle dos territórios ancestrais por grandes corporações de mineração, monocultivos e construtores de hidrelétricas?

É possível explicar o financiamento do Consórcio Norte Energia, responsável pela construção do mastodonte Belo Monte, ao evento, justo ele, ponta de lança do maior caso – ou case, como preferem especialistas do mercado - de violação dos direitos humanos na Amazônia?

Afinal de contas, você samba de que lado, de lado você quer sambar?  A chapa está quente, e as forças conservadoras ganham musculatura de Norte a Sul do Brasil. Esqueleto assanha sair do armário, vestir o quepe, calçar o coturno e desfilar em avenidas centrais.  

O tempo é sombrio, achacador engessa a República, ruralistas certos da impunidade assassinam indígenas do Maranhão ao Mato Grosso do Sul, enquanto a mídia choca o ovo da serpente e turbina o ódio e o medo.  

O bagulho é doido, e o Planalto endossa o agronegócio ao abraçar a truculenta kátia Abreu, a agilizar financiamentos de grandes obras hidrelétricas, e facilitar licenças ambientais de grandes projetos na região.  
 
Em oposição, no Projeto de Assentamento Lago Grande, em Santarém, por exemplo, a população  reivindica há dez anos o georreferenciamento de seu território, para poder elaborar projetos e acessar financiamentos. O território sofre ameaça da empresa Alcoa, que opera no município de Juruti.  

Ante os meus míopes olhos, o Baixo Amazonas, que abrigou o Chamado, promete ser o que Carajás encarnou no século passado, um cenário de saque de riquezas e violência contra as populações locais.

Este tem sido o papel consagrado à Amazônia, uma grande colônia de matérias primas para os estados mais ricos do país, e dos países ricos da economia mundial. Um grande exportador de commodities, como diria um economista de grande diário em sua coluna matinal.

Interroga-se: tudo é pragmatismo político de segunda classe? Foi-se para as cucuias o caráter pedagógico dos encontros de base? O Chamado foi um encontro de base? Afinal, o que foi III Chamado?

E quem chamou na chincha as “otoridades’ foi Auricelia Arapiuns. Uma mulher. Uma indígena. Uma guerreira. Tinha de ser. Veja AQUI. Saravá!