domingo, 15 de abril de 2012

Garimpo de Serra Pelada - o Diário de Bordo de Ismael Machado

"Garimpo é uma cachaça da moléstia. A gente sempre fica na esperança de que vai achar a pedra que vai mudar a vida da gente, mas é difícil isso acontecer”. O autor dessa frase é Petronilo Alves Reis. Me foi dita em 2008, durante minha segunda ida ao garimpo de Serra Pelada. Petronilo tinha 75 anos e é personagem da reportagem que acabou entrando no meu livro ‘Sujando os Sapatos’. Procurei por ele na sexta-feira passada quando retornei a vila. Petronilo havia morrido.

Foi o que me disseram os ex-garimpeiros, enquanto jogavam conversa fora e deixavam o tempo passar sob o escaldante sol. Estavam no mesmo lugar de antes, a frente da vendinha de Antonio Bernardes de Souza, o Godô, também personagem da mesma matéria. Godô, hoje com quase 76 anos, luta contra a hanseníase e serve uma das mais geladas latinhas de cerveja que provei nos últimos tempos.

Ali os garimpeiros antigos tentam congelar o tempo. Esperam do governo uma definição final a respeito de uma indenização ou algo parecido que permita a eles um final de vida digno. Sobram as histórias.

Um velho garimpeiro, apelidado de Baiano, preto retinto, de cabelos e barbas brancas, parecendo o Tio Barnabé do Sítio do Pica pau Amarelo, me diz que um dia não cabe para ouvir as histórias de Serra Pelada. É a mais pura verdade.

Saímos de Curionópolis cedinho, logo depois do café no hotel. Sexta-feira, 13. Aniversário do Lui, meu filho mais velho. Ele nasceu exatamente numa sexta-feira, 13, vinte e dois anos atrás. Mando um email afetuoso a ele. Saudade do moleque.

Olho para a topografia de serras, enquanto Janis Joplin canta  Me and Bob McGee, a música que fala em pegar estrada, em liberdade, em nostalgia.

O que percebo é que na entrada da vila, o cenário mudou. Há um canteiro de obras da Vale. A empresa fincou pés no local. O que resultará disso...? Moradores da vila reclamam das detonações explosivas. ‘Treme tudo’, me diz um deles.

Mais pro outro lado, há o canteiro da Colossus. Entre as duas gigantes, os homens pequenos, com suas histórias épicas. Cláudio Moraes, por exemplo, me reconhece. Ele é dono de uma loja bem organizada no centro da vila. Anda bem vestido. Tem boa aparência aos quase 50 anos. Mas levo Uchoa para os fundos da loja e mostro a foto de Moraes, à época do garimpo. É uma das fotos clássicas, com o garimpeiro todo enlameado, jovem ainda. Conheci Moraes em 2010. E ele parece melhor que seus companheiros.

Sento e converso com os garimpeiros. Sobram reclamações. A minha intenção é falar sobre Curió, mas não entro logo de cara no assunto. Vou rodeando, assuntando...quando falo o nome do homem, os garimpeiros mostram que ele ainda é um mito. É compreensível.
Não vou ficar fazendo valoração moral aqui, mas é fato que Curió falou a língua deles. Num lugar onde os homens só andavam armados, conseguiu desarmá-los e impor disciplina.

“Mas ele não era essa brabeza toda não”, me diz um ex-garimpeiro, segurando uma enxada e rindo solto a cada frase. É assim, o mundo anda complicado, mas o bom humor garante a sobrevivência. Isso sempre me fascinou. “Se fosse brabo não teria deixado passarem a mão na bunda da mulher dele aqui”. “Passaram a mão na bunda da mulher dele?”, me espanto. “Mas, rapá, num tô te dizendo?”, responde o garimpeiro. E rimos alto os dois.

Serra Pelada é assim, lugar de muitas histórias. Vamos até o lago que esconde hoje o que foi o formigueiro humano. Rogério pede pra que faça uma foto dele. Ao fundo, um velhinho lava as roupas no lago. “Porra, tem peixe aí. Como pode?”, pergunta Rogério. Mistérios da natureza.

Na vila prefiro deixar o carro em algum canto e seguir caminhando. É melhor. Um homem nos chama. Conversa conosco. Repórteres chamam a atenção. Guto Costa tem 47 anos e foi moço ainda a Serra Pelada. Andava de namorico com uma menina rica e os pais dela, lógico, não viam isso com bons olhos. Pois foi atrás de fortuna no garimpo para se fazer digno da amada. Vejo a vendinha dele e nem preciso perguntar nada.

Com um chapéu na cabeça, Carlos Rodrigues me diz que não pensava em ser garimpeiro. Mas em Marabá foi convencido por um conhecido. “Foi o destino, me diz ele”. Pergunto o que faria se encontrasse hoje esse sujeito do destino dele, trinta anos depois. “Mostraria pra ele a desgraça que fez em minha vida”, resume.

Vou atrás de José Alfredo, personagem de duas reportagens minhas em Serra Pelada. Me contam que o poço cavado por ele foi embargado, tapado. Não pode mais cavucar em busca do ouro sonhado. Não encontro José Alfredo, garimpeiro que tenho carinho de amigo. Vi os olhos dele ficarem marejados quando me contou sobre o pai e ele encontrando ouro nos anos 80. E vi a emoção que teve quando lhe levei a página do Diário em que ele era a foto de destaque. A casa simples tem passado por transformações. Está se tornando de alvenaria.

Um dos filhos agora é funcionário de uma das empresas, percebo pela calça, típica dos funcionários de mineradoras. “Tá melhor assim?”, arrisco perguntar. Ele diz que sim. Natural. Em vez da indefinição do sonho do ouro, carteira assinada e salário todo fim de mês. É um ciclo natural.

Voltamos a Curionópolis. Na saída da vila, vejo o imenso escudo do Vasco numa das primeiras casas. Sorrio, certas coisas não mudam. Ainda bem. No meio do caminho o pneu fura com as pedras. Não mudam mesmo.

1 comentários:

Anônimo disse...

SERRA PELADA MONTANHA DE PATETAS
Por quais razões, por quais motivos alguém recusaria um entendimento com seus oponentes se tal entendimento representasse inquestionável vantagem, paz, segurança e lucro certo para seus empreendimentos? - Certamente que razões e motivos muito fortes, respaldados por sólidos setores de poder e decisões. Respaldo esse divorciado dos mais elementares princípios de ética e justiça. Criminoso respaldo que a todos nivelam, os trinta e oito mil sócios da Coomigasp à condição, do termo em moda, “patetas”. Não passamos de “patetas” para a diretoria da Coomigasp, servil aos interesses da Colossus, que mesmo avisados e exaustivamente convidados a por um fim aos nefastos episódios de espoliação e flagrante desrespeito aos instrumentos de regramento associativo anuncia desconhecer o abaixo assinado e a consequente convocação da Assembléia Geral pelos garimpeiros da cooperativa. Somos todos verdadeiros “patetas” por reconhecermos que a diretoria da cooperativa desconhece os Estatutos e Regulamento interno da Coomigasp e continuamos a nos submeter as decisões administrativas dessa diretoria agóra representada pela empresa Work que adota uma linha de trabalho, não ao gosto dos “patetas” sofridos e espoliados garimpeiros, mas ao gosto da Colossus. Acreditamos que os descalabros, todos, denunciados exaustivamente já estão por merecer o apontamento de onde se incerem no TAC celebrado entre o Ministério Público do Pará e a Coomigasp/SPCDM e que muito carecem das manifestações a respeito por parte do Digníssimo Promotor Hélio Rubens. A comunidade dos “patetas” garimpeiros aguardam ordeiramente, mas anciosos e impacientes que o Digníssimo Promotor se pronuncie com as devidas e objetivas respostas aos seus reclames.
Com os horizontes acenando para interesses escusos na baderna – o que ficou definitivamente demonstrado - no quanto pior melhor, no descumprimento da lei, na ilicitude, na violência, no medo, na violação da propriedade alheia açulados pela ignorância, recomendamos como imprescindível a cautela e a busca, com antecedência, de instrumentos legais junto as autoridades constituídas por ocasião do evento de protocolo do abaixo assinado de Convocação de Assembléia Geral que garantam a segurança que o momento requer. Duvidas não existem mais. Existem apenas aqueles que pensam, ainda, na possibilidade de estarem a enganar a todos como se “patetas” fossem. Existe algo bem a frente, espera-se apenas que cheguem lá.
PEDRO PAULO DELFINO
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