segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

A Mira partiu


A Mira nos deixou numa manhã de domingo ensolarado. Tinha um pouco mais de 60 anos. Era uma negra magra. Mais de 30 anos de Ver o Peso. Solteira. Tinha uns seis filhos. Todos criados com a venda de comida e cerveja de uma barraca.  Não sei que matemática operou para tal proeza. 

Nunca a vi com a face amarrada. Ela jogava no bicho, tomava cerveja, disputava no palito com os convivas. Todos os “malucos” estão amuados: André, “Doutor”, Chicão, Tadeu, Vanzeler, “Careca”, Miltinho, a Negona do Bicho, a Gordinha do DVD Pirata....

Chicão é um negro que trabalha com embarcações. Tem mais de cem quilos e altura superior a 1.80m.  Talvez fosse o frenquetador mais carinhoso com a Mira. Pagava refeição para ela. As vezes comprava peixe e pedia a ela fazer uma peixada. Compartilhava com quem quisesse. Sempre que Chicão visitava o Ver o Peso tomava bença da barraqueira. Um sinal de afeto e respeito. As vezes a tratava de mãe.

Tudo foi muito rápido após o diagnóstico. Pouco mais de duas semanas. O mercado ficou menos alegre com a ausência da Mira. O box dela fica próxima à área de embarque dos barcos que levam a Barcarena. Frente para a Baia do Guajará.  Sempre que chove molha os frequentadores. O vento é forte. O que torna o ambiente agradável.

Não tive coragem de ir visita-la no hospital. A filha informou que ela havia definhado rápido. Falava com a voz embargada sobre o quadro. Esses anos de Ver o Peso não recordo do carinho dos filhos. Um ou outro passava lá. Os homens pareciam mais próximos. 

A visita de um deles sempre a alegrava. Ela dizia que ele nunca causara problemas para ela. Ele aparenta uns 30 anos. Parece calmo. Esses dias ele apareceu por lá. Os próximos dias serão sem graça.

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