quinta-feira, 21 de novembro de 2019

Consciência Negra na Amazônia: quilombo de Bom Jardim, abrigou a celebração em Santarém, no oeste do Pará

Aldo Santos, quilombola do território Saracura, em Santarém/PA foi homenageado 


Aldo Santos [sentado], quilombola do território Saracura, o homenageado, e Dileudoo Guimarães [em pé], presidente da FOQS 

“Não tenho nada para dizer para vocês. Tenho para dizer ao INCRA e para este governo: nos respeitem!” vaticinou o senhor Aldo dos Santos, remanescente quilombola da comunidade de Saracura, do município de Santarém, no oeste paraense, em evento de celebração pela passagem Consciência Negra, ocorrida no território de Bom Jardim, distante cerca de 40 quilômetros da sede do município.

Santos foi o ativista homenageado pela sua dedicação à sua luta em defesa do povo negro no município.  No decorrer do discurso, visivelmente emocionado, ele rememorou ameaças de morte e enfrentamentos com fazendeiros. “Hoje todo mundo tem a sua casinha em nossa terra, conseguimos isso graças à nossa luta” realçou Santos.

Assim como Santos, outros e outras dirigentes passaram pela experiência de ameaça de morte, entre eles o senhor Pinto e Dileudo Guimarães.  O senhor Guimarães é o anfitrião da celebração. O ativista preside a Federação das Organizações Quilombolas de Santarém/PA, (FOQS).

Espaço de celebração do dia da Consciência Negra - Quilombo Bom Jardim, Santarém/PA

A representação aglutina as 12 associações dos territórios quilombolas da cidade. Ela resulta de um processo de luta iniciado no fim dos anos 1990. O reconhecimento territorial é a principal bandeira de luta da FOQS.  Para além da bandeira da terra, constam pautas da educação, saúde, moradia, direito, gênero e juventude.

Em número de 60, é a estima dos territórios quilombolas no Baixo Amazonas, estes espraiados nos municípios de Oriximiná, Óbidos, Alenquer, Monte Alegre e Santarém.

O jovem de prenome Henrique, estudante universitário, realçou a necessidade de maior engajamento da juventude, e da necessidade em alinhamento de ações que ocupem as escolas para que os mais jovens conheçam a luta quilombola.  

Ao redor do galpão que abrigou a celebração, professores das escolas em territórios expunham banners relacionados ao tema. Estudantes quilombolas da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) apresentaram resultados parciais de pesquisas relacionados com a memória de seus territórios. 

Além de estudantes e professores da UFOPA , assessores da ONG de Terra de Direitos prestigiaram o ato, que durou todo o dia. A ONG mantém uma parceria que ultrapassa uma década com a FOQS. 

Crianças no quilombo Bom Jardim e crianças da Praça da Liberdade, Santarém/PA

As representações de coletivos de mulheres advertiram sobre a urgência em reorganizar os grupos de mulheres em cada território, bem como delas ocuparem cargos na direção das associações.
Canções de exaltação da raça negra entremearam as falas dos dirigentes. Canções com Canto das Três raças, e musicas autorais dos próprios moradores dos territórios quilombolas.

Adversidades – no decorrer das variadas falas o adverso contexto político do país foi ressaltado, como o corte dos recursos das instituições como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Cabe ao instituto a elaboração dos laudos antropológicos nos territórios quilombolas.  

O avanço da cadeia da soja a partir da pressão provocada pelo projeto de obras de infraestrutura,  a exemplo de complexo portuário do Lago Maicá, projetos hidroelétricos, hidrovias, estações de transbordo de cargas. O pacote visa consolidar o Baixo Amazonas como um grande corredor de circulação de commodities.

O conjunto de obras tende a pressionar territórios já consolidados, a exemplo de quilombos, reservas extrativistas, projetos de assentamentos e um pujante mosaico de unidades de conservação.

Na sede da cidade, o coletivo quilombola protagonizou uma agitada agenda da VIII Semana da Consciência Negra, com o tema: “Negros, o Estado é racista! Ou reagimos ou morreremos!” que passou por debates na UFOPA, ocupação da Praça Liberdade, em bairro homônimo com apresentação artística e apresentação de pesquisas da universidade.

A professora da Universidade Federal do Pará, Zélia Amador, proferiu a conferencia de abertura da semana da consciência que se encerra na próxima sexta feira, com o lançamento do livro Uns contos iguais a muitos, resultado de pesquisa do professor da UFOPA, Luiz  Fernando de França.

Entre os organizadores constam  o Coletivo de Estudantes Quilombolas da UFOPA, Grupo de Pesquisa em Literatura, História e Cultura Africana, Kitanda Preta e o Ministério Público do Estado. 

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