quinta-feira, 22 de agosto de 2024

Ovo gelado

O dia caiu. A noite não acudiu. Ruídos de animais. Sombras de palmeiras. Assobio de vento invoca curupira, matinta, boitatá. O mundo não tem solução. Temerária equação em carnaval de lama. Cozido, em um canto, logo cedo, o ovo foi resgatado.  Ele escapara de ter virado recheio de pastel em dias pretéritos. O ovo que sonhara em ser astronauta, navegava em  galáxias de solidão em geladeira sem luz. Alvo. Quase transparente, nunca tomou um fio de sol.  Não foi à praia. Nunca flertou em samba ou fez serenata, ofertou flores à musa. Aos pés da Santa Cruz jurou honrar os pais. Mal sabia que iria virar desjejum de faminto de amor. Um ovo só, é apenas um ovo só. Ovo gelado combina com doce, Docinho?  O que passou pela cabeça do ovo ao ser destroçado, untado por sal de segunda, e em seguida sufocado por um bom punhado de farinha? Farinha baguda. Bruta.  O ovo cozido, em breve, será adubo, coco, sem nunca ter tocado uma gaita ou flauta. Usado óculos escuros para as suas lágrimas esconder.

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