sexta-feira, 17 de junho de 2022

Amazônia, um rio de sangue sem fim...

 O livro Luta pela terra na Amazônia: mortos na luta pela terra!Vivos na luta pela terra! Conta parte das violências contra camponeses e seus apoiadores. A obra de ver lançada na semana que vem (versão digital). 


Raimundo Ferreira Lima, mais conhecido como “Gringo” foi executado por pistoleiros em maio de 1980, quando somava apenas 43 anos, em São Geraldo do Araguaia, sudeste paraense. Além de sindicalista em Conceição do Araguaia, Lima era agente da Comissão Pastoral da Terra (CPT).

Gringo foi o primeiro dirigente sindical assassinado na região imortalizada como a mais violenta na luta pela terra no país. O principal suspeito pelo sequestro e execução do sindicalista, quando o mesmo retornava de evento em São Paulo, recai sobre o fazendeiro Neif Murad, relata uma das edições do boletim Grito da PA 150.

João Canuto de Oliveira foi assassinado com 18 tiros desferidos à queima roupa, na tarde do dia 18 de dezembro de 1985, em frente ao cemitério da cidade. O crime sucedeu por encomenda dos fazendeiros Adilson Carvalho de Laranjeira (ex-prefeito de Rio Maria) e Vantuir Gonçalves, proprietário da fazenda Estrela do Pará. Dois pistoleiros não identificados realizaram a missão.

Como em outros casos, estima-se que pelo menos 20 pessoas empenharam recursos para viabilizar a execução do sindicalista, entre eles, fazendeiros, políticos e comerciantes.  Vivia-se sob a ameaça constante das ações da União Democrática Ruralista (UDR), entidade articulada pelo médico, fazendeiro e político Ronaldo Caiado, governador de Goiás.

O poeta, sindicalista e militante do PC do B Expedito Ribeiro tombou no dia 02 de fevereiro de 1991, no município de Rio Maria, sul do Pará, quando presidia o Sindicato dos Trabalhadores Rurais do município.  O pistoleiro Serafim de Sales (Barrerito) foi o encarregado da encomenda realizada pelo fazendeiro Jerônimo Alves de Amorim.

As execuções de outros dirigentes e ativistas precederam a morte de Ribeiro, a exemplo dos assassinatos de Gringo e membros da família Canuto, João (patriarca), José, Paulo e um atentado à bala de Orlando (filhos).

Filho de camponeses da cidade de Votuporanga, São Paulo, nascido no ano de 1952, João Batista antes de tornar-se advogado de camponeses, foi vaqueiro e boiadeiro.   Ainda criança correu São Paulo, Minas Gerais e Goiás com o pai Nestor Antônio Batista a tocar tropa de cavalos, burros e bois.

Após escapar de inúmeras emboscadas, o deputado estadual João Batista foi morto em dezembro de 1988, no fim da tarde, quando chegava em sua casa. O jornalista e militante Pedro, irmão de João, conta a trajetória do advogado dos camponeses, morto quando somava apenas 36 anos.

No próximo dia 18 de julho o assassinato do advogado Gabriel Pimenta somará 40 anos. Gabriel foi morto em via pública no final da convenção municipal do PMDB de Marabá, sudeste do Pará. Ao sair à rua, Gabriel Pimenta foi covardemente assassinado com três tiros de revólver, desferidos a curta distância pelo pistoleiro José Crescêncio de Oliveira, contratado pelo chefe de pistolagem José Pereira Nóbrega, o Marinheiro, sócio de Manoel Cardoso Neto, o Nelito, que vinha a ser irmão do governador de Minas Gerais, Newton Cardoso (PMDB). Gabriel Pimenta tombou sem vida aos 27 anos de idade. Paulo Fonteles, igualmente advogado foi morto no ano de 1987 na região metropolitana de Belém. Todos os advogados eram defensores de posseiros.

Ninguém escapava à sanha dos fazendeiros, que articulados a partir de consórcios elegiam quem deveria morrer.  Assim também fomentaram chacinas.  A CPT indica em seus registros a existência de cerca de 40 chacinas na década de 1980, com o saldo de 212 mortes. Dos 40 casos, em apenas dois foram iniciados os processos de apuração: as chacinas do Castanhal Ubá e da Fazenda Princesa ocorridas no Pará.

Josimo Tavares, o padre negro de sandálias surradas, foi assassinado quando somava 33 anos, na cidade de Imperatriz, no oeste do Maranhão, região do Bico do Papagaio, quando atuava na Comissão Pastoral da Terra (CPT), no dia 10 de maio, de 1986, por volta do meio dia. Josimo foi executado no dia dedicado às mães, quando adentrava a sede da CPT. Irmã Adelaide Molinari foi morta nos anos de 1990 em Eldorado do Carajás, enquanto Dorothy, também uma agente da CPT foi assassinada em fevereiro de 2005. 

Em 1996 a PM do Pará foi a ponta de lança do Massacre de Eldorado. Oficialmente 19 homens foram brutalmente executados. Alguns com tiros à queima roupa.  A Amazônia tem se configurado como um rio de sangue sem fim.  Rio seguido por uma pororoca de impunidade.

 

Os que defendem a reforma agrária, o meio ambiente e os direitos humanos possuem a morte como sombra. Sempre a espreitar. Os que se alinham a estas bandeiras  correm o mesmo risco.

O sangue não conhece cercas na Amazônia. A História da “conquista” da fronteira é uma história de expropriação de suas populações e assassinatos. Situações amalgamada por precárias investigações, processos morosos e inconclusos no Judiciário – quando os mesmos chegam a ser instaurados -, este celebre por sua parcialidade em situações de conflitos que envolvem grandes corporações, grileiros de terras e fazendeiros e a sociodiversidade local da região.

“Quem não vive na Amazônia não sabe como o perigo nasce e descamba com o sol e vem ainda com a noite, cotidianamente” esclarece o belo texto de Júlia Iara, militantes do MST/MA, quando da passagem de 21 do Massacre de Eldorado, em 2017.

Na Amazônia posseiros, sem terra, indígenas, quilombolas e demais categorias e seus simpatizantes e apoiadores vivem sob risco constante. Risco turbinado com o presente governo, que acena com a licença para matar.

Parte destes casos consta no livro Luta pela terra na Amazônia: mortos na luta pela terra! Vivos na luta pela terra!, a ser lançado na semana que vem.  A obra resulta de projeto de extensão da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) em parceria com o MST, Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará (Fetagri), Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT). Rogerio Almeida (UFOPA) e Elias Sacramento (UFPA), filho do sindicalista Virgílio, morto em Moju, Pará, em 1987, são os professores responsáveis pela obra que soma mais de 700 páginas.

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