domingo, 16 de setembro de 2012

Relatos sobre as terras do Maranhão


São Luís é uma ilha cercada de bosta por todos os lados. As placas nas praias avisam que o mar não está para gente. Ainda assim nativos e estrangeiros desfrutam do caldo fecal, que não existia quando os franceses aportaram num 08 de setembro de um distante 1612.  Assim reza a lenda.

O fim era erguer uma Paris nos trópicos.  Daniel da La Touche, o senhor de La Ravardiére é o acusado pela peripécia, que fundou o forte, que foi por muito tempo o palácio do governo. Ravardiére batiza avenidas ruas, escolas.....o nome da cidade é um mimo para o rei Luís XIII. Dos fundadores restou apenas o nome. Os portugas tomaram de conta do quinhão. A eles é creditado o mérito do rico casario colonial.

O Atlântico Sul banha a Ilha Grande (Upan-Açu), espremida entre as baías de São Marcos e São José de Ribamar.  No mar coalhado de coliforme fecal o banhista pode avistar uma penca de navios. Quando estive na capital do Maranhão foi possível contar pelo menos uns 20. São eles que colaboram com o saque do minério extraído do coração da Amazônia, na Serra do Carajás, sudeste do Pará.  

Nos trilhos da Ferrovia de Carajás correm por dia cerca de 30 milhões de reais. Os trens da Vale serpenteiam sem cessar por entre aldeias, projetos de assentamentos rurais, vilas, pobres cidades até alcançar o porto em São Luís.   

A capital de um dos estados mais ferrados da nação somou 400 anos. Ela tem se verticalizado vertiginosamente.  A cidade parece congelada no tempo. Os governos se sucedem e insistem em propagar a capital do Maranhão como um bibelô turístico.

A parada soa estranha. As fezes reinam nas praias, enquanto nos feriados prolongados os atrativos históricos ficam fechados. Para não falar no atendimento limitado. Equação complicada nas vésperas de eleições, onde tudo parece velho. Sem falar no precário abastecimento de água. Um dia sim. Outro dia não.

O atual prefeito, João Castelo, que busca reeleição foi governador na década de 1980, quando a cidade passou a sediar a fábrica de alumínio estadunidense Alcoa. Cabia ao professor Nascimento Morais botar a boca no trombone sobre os abusos do capital internacional, e os desastres ambientais que a mesma fomentava, e ainda produz.   

Uns colegas da cidade haviam informado que tudo estava uma bela merda. Calculei que iria encontrar uma cidade bem pior, se comparando com Belém, uma hecatombe administrativa. Talvez por São Luís ser menor, as mazelas não saltem tanto aos olhos, como na capital paraense: lixo, trânsito caótico, informalidade e má educação.   

Em breve Belém somará os mesmos 400 anos que os governantes do Maranhão celebram da capital dos Sarneys. Enquanto no interior um surto de meningite assola o sul do estado, que abriga um polo de soja, artistas nacionais como Ivete Sangalo, Alcione, Zeca Pagodinho e até o Rei Roberto Carlos cantam na concha acústica da Lagoa da Jansen.

O logradouro é uma máquina de grana. Tantos foram os projetos de saneamento ao longo dos anos. Explica o poeta, cordelista, jornalista, cantor, compositor e dramaturgo César Teixeira, o fedor da Lagoa resulta do processo de urbanização da cidade, que vedou o fluxo das águas do lugar com o Atlântico.

Teixeira soma mais de 50 anos. É dono de um corpo franzino. Tem a fala mansa e sem pressa. Lembra Martinho da Vila. O encontrei no Centro Histórico de São Luís, conhecido como Reviver. Apresentava o lugar para a paraense Maria Trindade, quando deparei com o poeta amansando o calor com uma cerveja no Restaurante Antigamente.  Havíamos deixado uns exemplares do Pororoca pequena na Livraria Poeme-se, do amigo Riba.   

Na livraria é possível encontrar uma série de publicações sobre a cidade. Tudo motivado pela celebração da data redonda.  Umas possuem financiamento público ou da mega mineradora Vale, que bem sabe neutralizar mídia, intelectuais e governos com as suas estratégias de marketing ou responsabilidade social.   

Voltei a esbarrar com o poeta. Desta feita no Bar da Dica, perto do antigo puteiro da Faustina, no mesmo Reviver. A prosa foi mais longa. Falamos de música, política, putaria, cenário cultural de Belém e outras coisas. O sol já repousava sobre o mar que leva até Alcântara, quando nos despedimos amistosamente.

Alcântara abriga a base de lançamento de foguetes da Aeronáutica.  Alcântara é terra ancestral de negros. A população quilombola tem sido continuamente desrespeitada pelo estado brasileiro, e tem colecionado sérios problemas para a garantia de sua reprodução social, cultural e econômica.  

Dizem que São Luís é uma cidade encantada. Talvez isso explique a esdruxula aliança que consagrou o PT na vice governança do estado, que tem como chefe nada mais, nada menos que a filha do Sarney, a Roseana.  Já até perdi as contas de quantas vezes a moça foi chefa da província.

É ela quem endossou a candidatura do dirigente sindical de servidores públicos federais Washington Luiz ao cargo majoritário nas eleições municipais. Disputa que aprofundou a crise de disputa interna do partido de Lula. Luiz contrariado vetou a veiculação no horário da TV e Rádio os reclames do candidato a vereador Marlon Botão.

O motivo da censura é que Botão não insere em suas peças de campanha o nome do majoritário. O candidato a edil conseguiu reverter o quadro, e visibilidade no horário eleitoral do partido que antes defendia a liberdade de expressão. Ao menos em tempos de ditadura.

Nenhum comentário:

Postar um comentário