No dia dedicado à memória do povo negro e seus lutadores, que ainda
hoje padecem sob uma estrutura racista, houve luta. Fazia sol na manhã do dia
20, na Casa do Povo da COP, em Belém. O espaço dedicado a debates durante à COP
fica no Centro, próximo à Praça da República, que abriga o Teatro da Paz.
Uma territorialidade ao padrão do colonizador, que sufocou entre
outros povos, o Tupinambá. Em cada monumento erguido no que se convencionou
denominar de belle époque há sangue dos povos da floresta e dos que para cá
vieram. Como referencia o samba da Mangueira de 2019, “há sangue retinto,
pisado, atrás do herói emoldurado”. Há
sangue e a tentativa de apagamento dos que tombaram nestas jornadas “civilizatórias”.
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Ainda hoje o padrão colonial se impõe: violência, saque e pilhagem.
Os grandes projetos espelham tal realidade. Os saqueadores também estiveram na
COP, a vender uma estampa de “bom mocismo” verde.
Na contracorrente da ordem hegemônica, o livro/dossiê Assassinatos
e impunidade no campo do Pará: 1980-2024, autoria do advogado e defensor dos
direitos humanos, José Batista Afonso e do professor, Airton Pereira, do curso de
História da Universidade do Estado do Pará (UEPA), no município de Marabá,
sudeste paraense alerta para a pulsão pela morte que as experiências desenvolvimentistas
impuseram para a região. Uma terra encharcada de sangue e impunidade. A mais letal na luta pela terra do país.
Batista e Pereira são migrantes. Assim como boa parte dos casos que
o livro alumeia. Os autores são parceiros por entre as veredas e perigos da
bacia do Araguaia-Tocantins de velha data. A obra de cerca de 900 páginas passa
a contrapelo e registra as execuções de lideranças, assassinatos e chacinas. São
mais de mil casos. “Não são meros números.
São os nossos companheiros/as”, ratificaram os autores e colaboradores em
vários momentos do evento.
O acanhado espaço da Casa do Povo ficou lotado para o dedo de
prosa. Havia gente de pé. O procurador Felício
Pontes, o histórico militante da reforma padre Paulinho, Luzia Canuto, Elias
Sacramento, filhos de lideranças assassinadas na década, a ex deputada Sandra
Batista, viúva do deputado João Batista, defensor de posseiros igualmente
executado na década 1980, o deputado estadual Elias Santiago (PT), Carlinhos, presidente
da Federação dos Trabalhadores/es na Agricultura do Pará (Fetagri), o advogado
e defensor dos direitos humanos, Marco Polo, da Sociedade Paraense de Defesa
dos Direitos Humanos (SDDH), professores de várias universidades testemunharam
a apresentação dos autores.
Como se em uma missa estivessem, todos estavam atentos às explicações
dos autores. A peleja até materializar
durou perto de uma década, conta Batista, que explica que tudo começou no período
antes da pandemia. Os arquivos da Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Marabá,
Xinguara e Goiás são as principais fontes primárias, todavia, não a única.
Para a gira os autores convidaram notórios lutadores pela reforma
agrária e os direitos humanos no estado, entre eles, Pe, Paulinho, a professora
de História Luzia Canuto, o advogado e professor da UFPA, Girolamo Trecanni,
entre outros.
“A ideia é apresentar o documento às instituições públicas do
estado e da União que tenham relação com o tema, para que se estabeleça um diálogo
sobre reparação” vaticinou o advogado Batista. Ao longo dos anos, inúmeros trabalhos
acadêmicos e não acadêmicos têm empenhado esforços em recuperar aquilo que a
oficialidade tentou apagar.
O livro/dossiê pode ser adquirido no site da Editora
Dialética. Trata-se de um trabalho urgente
e necessário sobre os processos que engendraram a violência como padrão de
desenvolvimento, assim com a naturalização.
Mais uma vez, invoquemos o samba da Mangueira/2019: “Salve os
caboclos de julho/Quem foi de aço nos anos de chumbo/Brasil chegou a vez/ De
ouvir as Maria, Mahins, Marielles, malês”. Os/as sem terra, os/as posseiros/as,
indígenas, quilombolas....os povos da floresta...



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