“O projeto do governo é
um projeto de morte para os povos da floresta, para os indígenas, quilombolas e
ribeirinhos”, alertava Alessandra korap, indígena Munduruku, por ocasião de um dos
diversos debates que tomam a agenda na Universidade Federal do Oeste do Pará
(UFOPA), onde cursa Direito. Recentemente
a indígena teve a casa assaltada e o seu computador levado.
A avaliação da
guerreira indígena tem se materializado de diversas maneiras durante esses
meses de desmandos do governo. As execuções dos indígenas Guajajara, concessão
da base de lançamento de foguetes de Alcântara para exploração dos EUA, - ambos
os casos no estado do Maranhão -, o assassinato de Emyra Waiãpi, no estado do
Amapá, o esvaziamento e desmantelamento de instituições que tratam da questão agrária,
indígena e quilombola cimentam um caminho em oposição às pautas dos povos da
floresta.
Nesta sombria aquarela
despontam ainda o aumento do desmatamento na Amazônia, a demissão do pesquisador
do INPE, Ricardo Galvão e a nomeação de militares para chefias de cargos
como Funai. Sublinhe-se ainda o circo
midiático montando em torno de “nebulosa”
investigação policial, que resultou na prisão dos brigadistas da reserva de
Alter do Chão, no município de Santarém, no oeste paraense e o discurso preconceituoso
contra indígenas e quilombolas do procurador do estado do Pará, Ricardo
Albuquerque.
O quadro nebuloso é
composto ainda por um conjunto de medidas no campo jurídico que tende a extinguir
ou fragilizar algumas garantias efetivadas na Constituição de 1988. A permissão
para que fazendeiros possam andar armados, concessão de mineração em
territórios dos povos tradicionais, azeitamento do processo do já frágil licenciamento ambiental em nome da “segurança
jurídica” para o mercado integram um pacote de mediadas que visa beneficiar a
base rural de apoio ao governo, ladeada pela bancada fundamentalista religiosa
e a da bala e a “indústria” de notícias falsas.
Em síntese, de diversas
formas, o governo acena a seus aliados uma concessão para matar, para indiferença
às leis, como no caso ocorrido em Novo Progresso, também no estado do Pará, onde
fazendeiros organizaram um incêndio. A trilha de violência conta ainda com ataques
frontais a servidores públicos dos órgãos de fiscalização da área ambiental e
afins, onde queima de veículos públicos e ameaças fazem parte do modus operandi de madeireiros,
fazendeiros e grileiros.
É notória a condição
colonial da Amazônia na trama da economia mundo. Ocorre que nos dias atuais,
sob o signo do medo, esta respira o bafo da fúria, e se exacerba sob o manto do
discurso do ódio e da intolerância.
O capital em terras
nacionais é uma parada de sucesso. Desde sempre expropria, mata e saqueia as
riquezas que cá abundam. Páginas e mais páginas registam a saga desde tempos imemoriais. Há sangue de indígenas,
quilombolas, e de não indígenas e não quilombolas empobrecidos sobre as
batinas, fardas e togas.
É como expressa o verso
do samba da Mangueira deste ano: “Há sangue retinto pisado atrás do herói
emoldurado”. E as notícias tristes não cessam de brotar. Uma se sobrepõe a
outra, provoca perplexidade e desencanto, sem tempo de processar a mais recente.
A mais recente foi a morte
do mototaxista Marcio Rodrigues dos Reis, principal testemunha de defesa do
caso da prisão do Padre Amaro. O religioso é agente pastoral da Comissão
Pastoral da Terra (CPT), na cidade de Anapu, outra quebrada do estado do Pará,
um triste emblema da brutalidade do avanço do capital sobre a Amazônia. Amaro é
substituto da missionária Dorothy Stang, executada em fevereiro de 2005.
O governo brasileiro
deu licença para matar. E desde então, as mortes se amplificam no campo
nacional. Em todas as latitudes. No entanto, desde sempre ocorreram insurgências.
Aqui cumpre realçar a autodemarcação de seus territórios empreendidas pelos indígenas Munduruku, a
construção do Protocolo Consulta como ferramenta de defesa territorial, a expulsão
de garimpeiros e madeireiros de seus territórios, as greves nos canteiros das
grandes hidroelétricas na Amazônia, a ação solidária dos indígenas do povo
Munduruku do Baixo Amazonas, com os parentes no enfrentamento contra Belo Monte,
em Altamira, e a celebração de festivais de diferentes modalidades dos quilombolas.
Uma vez mais, invoco a
sabedoria popular na composição do samba da Mangueira de 2019: Salve os
caboclos de julho/Quem foi de aço nos anos de chumbo/ Brasil, chegou a vez/De
ouvir as Marias, Mahins, Marielles, malês/[...] É na luta que a gente se encontra”.
As ameaças contra os povos
da floresta continuam. Como a denunciada pelos professores da UFPA, caso
ocorrido no município de Altamira/PA. Veja o vídeo AQUI
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