terça-feira, 27 de novembro de 2018

Amazônia: seminário sobre sustentabilidade realizado no Amazonas alerta sobre o risco eminente por conta do delicado contexto político


INPA e UFAM sediaram o encontro organizado pela Embrapa Amazônia Ocidental que homenageou o professor Alfredo Homma

Quais os projetos de desenvolvimento mais adequados para a (s) Amazônia (s), é possível a convivência harmoniosa entre diretrizes antagônicas, que mecanismos são necessários para se dinamizar as economias locais protagonizadas a partir de populações historicamente marginalizadas, qual o papel das instituições de pesquisa, ensino e assistência técnica, foram  algumas das indagações mobilizadoras do Workshop Serviços Ambientais: Perspectiva e Desafios Para o Desenvolvimento Sustentável e Bem-Estar das Comunidades de Agricultores Familiares no Amazonas, ocorrido entre os dias 21 a 23 nas sedes do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA) e da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). 



Mesa de abertura com representantes da comissão de organização do evento. Foto: Fernando Goss - assessoria Embrapa Amazônia Ocidental

Coube a Embrapa Amazônia Ocidental a organização do evento, em parceria com a UFAM, INPA, UFPA e o Conselho Nacional de Seringueiros (CNS), e contou com o patrocínio do CNPq e do governo do estado do Amazonas. O evento ocorre em momento histórico, tanto por conta do atual contexto histórico, que coloca sob a mira dos setores mais retrógados da sociedade algumas conquistas auferidas por indígenas, quilombolas e outras populações da Amazônia na Constituição Federal de 1988, quanto pela passagem dos 30 anos da execução do seringueiro Chico Mendes. 


Da esquerda para a direita: Romero (Unicamp), Homma (Embrapa), Taveira (Fundação Amazônia Sustentável), Torquato (CNS) e Fearnside (INPA).  Foto: Fernando Goss - assessoria Embrapa Amazônia Ocidental

O assassinato do extrativista acreano resultou em reconhecimentos de algumas demandas a partir da diversidade do que se convencionou chamar de Povos da Floresta, a exemplo da criação do Ministério do Meio Ambiente, a efetivação de uma reforma agrária aos moldes das realidades da floresta, com o reconhecimento de reservas extrativas, cooperação internacional em diferentes campos, o surgimento do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), que chegou a aglutinar centenas de representações de variados campos políticos da (s) Amazônia (s), efetivação de vários projetos experimentais a partir do Proambiente.


Ao microfone o pesquisador Lindomar Sousa - Embrapa Amazônia Ocidental. Foto: Fernando Goss - assessoria Embrapa Amazônia Ocidental

Outro elemento é a celebração dos 30 anos da tese produzida pelo pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, o filho de migrantes nipônicos, Alfredo kingo Oyama Homma.  Dono de vasta obra e um dos mais respeitados pesquisadores na Amazônia teve como pares durante o seminário novos e antigos pesquisadores, onde constam Romero Ximines (UFPA), Edane Acioli (IEB), Rafael Porto (Embrapa Roraima), Ana Luísa (UFRGS), Rosa Rocha (GESPAFIR/CNPq), Tania Miranda (UFPA), Luciano Mattos (Embrapa) e Ademar Romero (Unicamp), dentre outros.

No conjunto foram cinco seções de debates, mais a mesa de abertura e a apresentação de trabalhos, que mobilizou além de professores e investigadores, ONGs e representantes de movimentos sociais.  Uns mais alinhados ao mercado, outros nem tanto. 

Algumas perspectivas

Em meio ao incremento da taxa de desmatamento na região e ao aumento das desigualdades no país, que o coloca entre os 10 piores países do mundo na categoria, o jovem extrativista Dione Torquato invocou o humanista pernambucano Josué de Castro, notório pelas suas reflexões sobre a fome para iniciar a sua reflexão entre os “bambas” da pesquisa. O secretário da juventude do CNS além de lembrar Chico Mendes, sinalizou para a necessidade de um modelo de desenvolvimento a partir dos Povos da Floresta.

“O território é primordial para a manutenção do nosso modo de vida. Terra, territórios, nossos saberes sobre a região são fundamentais para a construção de um modo de desenvolvimento para a Amazônia, em oposição do modelo instalado desde os anos de 1970” defende Torquato.
O jovem de Alvarães, região central do estado do Amazonas defende um modelo de produção sob a inspiração da agroecologia, um processo em que não predomine a dicotomia eurocêntrica que separa o homem da natureza. “Há milênios convivemos com a floresta. Temos um conhecimento ancestral, exigimos o reconhecimento dele e pelos serviços que prestamos a todo o planeta”, enfatiza o seringueiro.

Preservação do peixe-boi no interior do INPA. Foto: R. Almeida

Homma argumenta desde a sua tese a necessidade da domesticação de espécies  demandados pelo mercado, e a produção em escala, e que urge para a incrementar a produção do pequeno produtor a inserção tecnológica e da mecanização, além da colaboração de setores da pesquisa.


Visita  monitorada  de um grupo de estrangeiros ao interior do INPA. Foto: R Almeida

“Defendo a busca de alternativas econômicas que gerem renda e emprego como saída para a crise do que se convenciona chamar de sustentabilidade. No cenário atual a tendência é aumentar a demanda por serviços ambientais; mas, a longo prazo, isso pode ser uma situação delicada” argumenta o professor, que advoga que os países desenvolvidos devem pagar pela preservação ambiental da Amazônia.

Há 40 anos radicado na Amazônia, o estadunidense vinculado ao INPA, Fearnside ressalta as ameaças que a região enfrentará com o dueto Trump/Bolsonaro nos próximos anos, e a aliança com os setores mais conservadores do país. “Este setor não reconhece as pesquisas que advertem para as mudanças climáticas, as ameaças que nublam a sobrevivência de futuras gerações caso o modelo de produção baseada no uso intensivo dos recursos naturais se perpetue” alerta o pesquisador que acabou de lançar obra sobre os impactos das hidroelétricas na região.

Ele adverte que a redução de chuvas já compromete e ameaça a redução em até 50% das megas usinas de geração de energia aos moldes de Belo Monte, no rio Xingu no estado Pará, Santo Antônio e Jirau instaladas no rio Madeira no estado de Rondônia. O professor sinaliza, ainda, para o conjunto de revisões de normativas que garantem em certa medida a sobrevivência das populações tradicionais. “O conjunto da obra pode ter o resultado catastrófico para a região” arremata. 

Com relação ao mundo de águas da (s) da Amazônia, Carlos Durigan, pesquisador vinculado ao WCS Brasil provoca que existem pelo menos 150 projetos de edificação de hidroelétricas na Amazônia, e que isso, ladeado com outros projetos de infraestrutura ameaçam a diversidade e a sobrevivência das populações locais. “O cenário pode agravar o fenômeno do el nino. No rio Madeira  as usinas alteraram de forma radical o processo de migração das espécies endêmicas, a exemplo do tambaqui e do pirapitinga” realça o geógrafo.

Ele atenta para a quase total ausência de monitoramento sobre a contaminação das águas da região, com exceção para os rios Tapajós, no município de Santarém a oeste do Pará, e do rio Madeira, em Rondônia. No caso da cidade paraense, há um monitoramento com relação à contaminação por mercúrio promovida pela garimpagem, que teve maior intensidade nos anos de 1980.

Cumpre ainda ressaltar que parte da equipe de organização anima a publicação de livre acesso TerceiraMargem Amazônia.

Manaus em gotas 
Dois milhões de habitantes é a população estimada de Manaus. Nuvens de fumaça cobrem a capital do Amazonas. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) registrou 4.936 focos de queimadas até setembro deste ano, contra 3.192 do ano passado. O aumento é estimado em 54,6%. Lábrea, Manicoré, Boca do Acre e Apuí, ao sul do estado, concentram mais da metade dos focos de calor.   



Imagens de bairro próximo ao INPA. Foto: R.Almeida


A capital concentra as atividades econômicas, em particular por conta da Zona Franca de Manaus, instalada como projeto de desenvolvimento no período do estado de exceção na década de 1960, que a partir de renúncia fiscal promoveu a instalação de indústrias estrangeiras.



Faz 31º. A maior unidade da federação em extensão territorial concentra boa parte da população. Ladeiras e becos serpenteiam a cidade natal do escritor Milton Hatoum.  Andar a pé é um desafio. Em sinais e avenidas de grande fluxo de pessoas e carros venezuelanos clamam por emprego e ajuda financeira. As principais rodovias são as federais BR's 174, 210, 230, 307, 317, 319 e algumas estaduais, principalmente na região polarizada pela capital Manaus, tais como AM-010, 254, 352 e 363.

As manchetes da mídia local estampam situações de tráfico de drogas. Ano passado 60 detentos foram mortos, 184 fugiram em rebeliões em quatro presídios do estado.  A BR-174 (Manaus-Boa Vista) abriga o Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), o Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat) e o Centro de Detenção Provisória Masculino (CDPM).

Em todas elas ocorreram motins. É creditado ao Primeiro Comando da Capital (PCC), o controle do narcotráfico no estado, que tem como concorrentes o Comando Vermelho (CV) e a Família do Norte (FDN), antes associada ao CV. Agora as três disputam o controle do tráfico no rio Solimões, denuncia a mídia local.

A capital manauara coleta 10,18% do esgoto, e trata somente 23,80%, o que a ranqueia em 5º lugar entre as maiores cidades do país em ausência de cobertura em saneamento básico.  Igarapés, lagos e o rio Negro recebem o esgoto sem tratamento.

O Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento (SNIS) a coloca entre as dez piores cidades em saneamento do país. Para análise o SNIS considera abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto. Entre as piores Manaus rivaliza com Ananindeua/PA (0,75%), Porto Velho/RO (3,39%), Santarém/PA (4,29%), Macapá/AP (8,91%). Na aquarela de problemas, o transporte coletivo, desemprego, saúde e segurança integram o quadro.

Assim como Belém, a urbe cresceu de costas para os rios, e guarda vestígios dos festejados anos de abundância do ciclo da borracha por parte de uma fração da sociedade. O teatro municipal cravado no centro da cidade é um deles, ladeado por sobrados e igrejas. Em perímetro próximo, não raro, mesmo durante o dia, é comum o comércio do sexo. Aos sábados o grupo de samba Couro Velho entoa sambas clássicos.

 Teatro Municipal. Foto: R Almeida

Vitral do Mercado Municipal. Foto:R.Almeida


Grandes projetos no Amazonas
R$1,2 bilhão era a estimativa do custo da obra do gasoduto Urucu-Coari-Manaus em 2006. O projeto tem como meta sanar o problema de abastecimento de energia do estado, que usa usinas termoelétricas, que consome diesel em demasia, e é considerado danoso ao meio ambiente.


A obra tocada pela construtora OAS é eivada de irregularidade, e ao fim da construção, turbinada por aditivos irregulares, fechou os custos em R$4,5 bilhões. O gasoduto tem a extensão de 663 km quilômetros e capacidade para escoar até 5,5 milhões de metros cúbicos por dia de gás natural. 

O Tribunal de Contas da União (TCU) encontrou pelo menos 26 irregularidades entre a Petrobras e a OAS. O caso integra o rosário de crimes da Lava Jato. Desde a década de 1980 a Petrobras opera na região com exploração de petróleo.

Em 2013 a produção de energia elétrica aportou os estados do Amazonas e Amapá. Os linhões 238 e 241 alcançam os estados a partir das margens do Rio Amazonas a partir da cidade de Almeirim, município paraense localizada na fronteira do Pará com o Amapá, marcada pelo monocultivo de eucalipto do Projeto Jari.

As torres possuem perto de 300 metros de altura e vão de 2.130 metros entre elas. São quase tão altas quanto à Torre Eiffel,, em Paris. As torres de transmissão de energia são consideradas as mais altas das Américas.

Porto de Itacoatiara – inaugurado em junho deste ano, o porto integra o Arco Norte [Amazonas, Rondônia, Amapá e o Pará], que visa dinamizar a partir de um diverso modal de transporte e portos o escoamento de grãos do Brasil Central, com vistas a alcançar o novo Canal do Panamá, o que resultaria na economia de 15 dias de transporte.

O nome oficial do porto é uma homenagem ao Engenheiro Antônio Nelson Ade Oliveira Neto, filho da cidade. Na década de 1990 o Grupo Amaggi construiu um terminal flutuante com capacidade de 60 mil toneladas. Além do porto, o grupo viabilizou a empresa de transporte Hermasa.  

Considerado o maior porto fluvial do Amazonas, custou R$66,1 milhões, e conta com a capacidade de atracação de balsas e navios de até 35 mil toneladas e pátio para receber 5 mil contêineres. O Maranhão também integra a logística.

Ásia e Europa configuram o destino da produção. Portos de Barcarena, Santarém e de São Luís integram o complexo.  Todas estas grandes obras em infraestrutura fazem parte da Iniciativa de Integração em Infraestrutura Sul-americana [IIRSA].

Elas tendem a criar situações de agudas disputas por territórios entre o grande capital nacional e estrangeiro e as populações locais, em particular as consideradas tradicionais. Outro elemento é aprofundar a condição colonial da região como exportador de matérias primas, commodities. 




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