Hercúleas são as
grandezas amazônicas, rios, biodiversidade, gentes, conhecimento, alegrias e
tristezas. E como tem gentes no vasto universo Amazônico. Anônimos,
invisibilizados, arrancados da horizontalidade do cotidiano por conta de
tragédias, como os massacres, ou algum feito raro, fora do comum, tal o do atleta
especial Alan Fonteles.
Tem gentes na Amazônia.
Um montão. Um mundo de gentes a contrariar a correnteza do rio da brutalidade
do capital e do autoritarismo do Estado. O par impõe uma lógica baseada em mega
projetos para a região, homogeneíza e expropria as populações nativas, devasta
a floresta, detona os rios, barrancos, e mais que tudo, vidas, histórias e
conhecimentos ancestrais.
No vasto mundo das terras
dos Carajás tem um mundo de gentes teimosa. Uma pororoca de Raimundos, a cruzar
o Tocantins, o Araguaia e Itacaiúnas. Nestes dias um deles soma seis décadas de
trecho. O bravo nordestino tem o sobrenome Gomes da Cruz Neto, entre os pares
tratado somente de Raimundinho.
A baiana Angelina é a
corda da caçamba do piauiense Raimundinho. Thiago e João são os filhos biológicos.
E sei lá quantos outros adotivos passaram pela asa do casal. Vítor é o neto. Raimundinho
tem um monte de irmão. Conta com pai e mãe ainda hoje. Na casa do agrônomo e sociólogo
nunca falta abrigo a um trabalhador rural ou urbano, um ativista ou dirigente
popular. Algum pesquisador ou jornalista. Ainda que seja de meia pataca, como
eu.
Tantas vezes ali fiz
pouso, filei boia e pinga, falei bobagens, ouvi canções, desafinei o canto do
trovador Peixinho, mexi com moças... O “comandante”, como tratam os mais jovens,
comporta no corpo franzino um grande coração. Ao seu jeito externaliza generosidade aos que
ali buscam uma ajuda para tentar compreender a complexa região de Carajás, ou
com quem cruza pelos bares ou encontros e desencontros da vida.
O educador de cabelo
black é do tempo da Guerrilha do Araguaia. Tem história para contar. Foi de partido
clandestino nos tempos da ditadura. Pós milicos, ajudou a organizar sindicatos
urbanos e rurais, refundar partidos, ONG´s, fóruns e coisa e tal. Incentivou publicações
e panfletos.
Passei uns dias nas
terras dos Carajás ao lado do educador. Dele nunca ouvi conselho. Seria o
exemplo da coerência política e a opção pela base a lição do nordestino; ao contrário
de muitos parceiros da antiga, que encontraram ou se perderam por outras
veredas, corredores, palácios e catedrais?
As seis décadas de
estrada não o impedem de encarar as esburacadas e arriscadas rodovias federais
e estaduais, até aportar nas quebradas do Xingu, em São Félix, para ter dedo de
prosa com as populações ameaçadas pelos projetos da Vale e de outras empresas. Vai
de van, onde o carro não pode alcançar encara moto, barco, burro ou vai a pé.
Outro dia Raimundinho
fez um monte de gente chorar. E como o povo chorou quando Raimundinho tombou na
orla cidade de Marabá. Sobrou lágrima para tudo que foi lado. Mais de uma
cerveja e desatenção o levaram ao chão. Machucou cabeça, costelas....não sei se
ferido saiu o coração...
Marluze Pastor, o
camponês Manoel Conceição, as quebradeiras de coco babaçu Querubina do Maranhão
e Raimunda do Tocantins, a educadora Rosa Acevedo, o ativista Jorge Néri, a jovem
socióloga Rosemary Bezerra, o comandante Raimundinho são algumas pessoas que
povoam o pensamento quando as coisas não estão lá muito bem, e tudo parece
perdido.
Assim como vários
padres da antiga, entre eles Roberto de Valicourt, o ativista Emanuel Wamberg
(Manu), o pesquisador belga Jean Hébette, e tantas outras gentes, Raimundinho
tem o nome cravado na história dos povos das terras dos Carajás.
Cá, distante mais de
500 quilômetros, envio as parcas e porcas linhas como manifestação de apreço e
admiração. Até a vitória.
Texto muito bonito e significativo professor Rogério.
ResponderExcluirAs Amazônias precisam de pessoas que tragam à baila textos sobre seus heróis cotidianos, aqueles que fazem de suas rotinas luta diária contra a hipocrisia e o controle do sistema Capitalista.
Bem vinda sua homenagem ao companheiro.
Abraço
Professora. Grato pelas palavras. A trajetória do compa é bem bacana.
ResponderExcluirOlá aqui é a Ryra amiga do Thiago do Rio de Janeiro, deixo aqui para o Comandante Raimundo um grande abraço fraterno e agradecimentos ao carinhoso gesto para com ele do amigo aqui. Esse gesto nos revela o quanto ambos são importantes, para nós, para Marabá, e na luta revolucionária.
ResponderExcluirCarinhosamente Parabéns pelo texto e obrigada pelo gesto de carinho, pois quem acarinha um militante ativista revolucionário acarinha todos nós!!!!
Olá Ryra. Agradeço o afago e a gentileza. As palavras em homenagem ao Raimundinho são modestas e pequenas se comparadas a contribuição do militante. Abraço
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