quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Ver o Peso – rascunhos de uma tarde de sábado

Sábado de sol escaldante. Ver o Peso. Meio dia. Casa cheia. Aparelhos de TV ligados em canais diferentes. Um barulho dos diabos é a trilha sonora que embala a praça de alimentação. Não existe sofisticação. Bancos rotos acomodam bundas nativas e de além rio-mar. 

A barraca controlada pela Thais tem lugar privilegiado. Recebe o vento que vem da baía do Guajará. Fica perto do banheiro e de onde se embarca para o município de Barcarena. A cidade é conhecida mundialmente por abrigar plantas industriais de alumínio.  

Misturados aos comerciantes e visitantes do lugar, uma horda de zés e marias  ninguém se vira por lá. Uns pedem uns trocados, alguns assaltam, outros simplesmente enchem a cara de cana. A famosa buchudinha. 

A Tatá é uma morena simpática. Riso fácil. Menos de 40 anos, mãe dois filhos. Uma já taluda. Sempre trata os visitantes de meu amor. Ela não trabalha nas terças e quartas. Alega que o movimento não paga a empreitada de dia inteiro.

Além de cerveja ela vende cigarros, refrigerantes e tira gosto de queijo, azeitona e presunto. Tatá gosta de dançar. Namora com moço casado. E diz não ter mais ilusões com o amar.

Num banco da barraca da Thais um senhor atarracado e barrigudo puxa um cochilo. Noutro banco o sax alto repousa dentro do estojo. Ele integra uma banda que anima as tardes do mercado. Além dele o time de músicos é composto por um surdo e um trompete. O titular da percussão está atrasado.

O trompetista chega após o despertar do saxofonista. Ele reclama de ressaca. Ligam para o dono do surdo, são informados que o mesmo não irá ao mercado por conta da extração de um dente. Um deles exclama: “logo hoje que o mercado tá cheio”. Apelam para o plano B.

Não tarda o reserva da percussão chega. O saxofonista escolhe a melhor palheta antes de começar. Afina o surrado instrumento. Um outro senhor, veterano de guerra no mercado entoa canções antigas. O pontapé para a festa foi dado.  

No portfólio de canções tem de tudo: músicas antigas, merengues, salsas, e em particular hinos de futebol. E não se pode deixar de executar os hinos dos escretes locais Remo e Paysandu. A moça que repara as unhas dos pés e mãos dos populares troca carícias com o namorado. Deu folga para os alicates e esmaltes.  A rodada do boné entre os biriteiros banca o cachê da trupe.

Sapo, um negro encorpado comercializa bolas e peixeiras. Estranha combinação. Reclama da ex esposa. Faz graça com a jovem que atende na barraca do Tadeu, vizinho de Tatá. Ele como a mãe, uma antiga barraqueira dedicada à boêmia, coleciona filhos.  A mãe nunca deixou de beber, mas, mora hoje num interior.

Ao sair de cena, a banda toca uma canção top dos dias de glória do rádio: “recebi um telegrama do meu velho pai, me pedindo para voltar...o meu pai é fazendeiro na ilha do Marajó no estado do Pará...”

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