Liberato de Castro é acusado de contratar pistoleiros para expulsar moradores e impedi-los de pescar ou caçar. Ele também teria usado policiais para amedrontar a população
O Ministério Público Federal no Pará ajuizou ação civil pública com pedido de liminar (decisão urgente) para impedir o fazendeiro Liberato Magno da Silva Castro de invadir terras quilombolas que ficam entre os Igarapés Murucutu e Caju, em Cachoeira do Arari, na ilha do Marajó, há 75 quilômetros de Belém. Ele é acusado de usar pistoleiros fortemente armados para expulsar as famílias da região onde moram há séculos.
Além do processo na Justiça Federal, existe também um procedimento aberto na Corregedoria de Polícia Civil do Pará apurando a participação de servidores públicos nas ameaças à comunidade. Vários quilombolas chegaram a ser intimados a comparecer à delegacia ou mesmo presos, para responder a acusações falsas do fazendeiro, que é pai da prefeita de Ponta de Pedras, Consuelo Castro.
A data da fundação da igreja da comunidade é a mesma da "abolição"
Para o MPF, por se tratarem de terras de quilombo em processo de reconhecimento pelo Governo Federal, a Justiça Federal deve obrigar o fazendeiro a se retirar imediatamente. Nos últimos meses, o terreno de um dos moradores foi invadido por homens de Liberato, que cortaram todo o açaizal e depositaram material de construção na área. O procurador da República Felício Pontes Jr, responsável pelo caso, teme pela segurança dos quilombolas. “ Trata-se de uma clara demonstração de que haverá conflito se não houver rápida intervenção judicial”, diz. A ação será julgada pelo juiz Antonio Carlos de Almeida Campelo, da 5ª Vara Federal de Belém.
O processo se baseia, principalmente, nas denúncias dos moradores, em documentos da Gerência Regional de Patrimônio da União, que comprovam a posse legítima dos quilombolas, e em um relatório científico assinado pela pesquisadora Rosa Acevedo Marin, da Associação das Universidades da Amazônia (UNAMAZ), em parceria com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O relatório confirma que as terras quilombolas de ocupação secular somam 12.852 hectares e começaram a ser invadidas há trinta anos pelo fazendeiro.
“A intervenção de Liberato Magno da Silva Castro, suposto proprietário da Fazenda São Joaquim Ltda, provocou clima de terror na região, nos termos dos relatos dos moradores”, registra o pedido do MPF ao juiz, para logo em seguida citar os testemunhos de alguns quilombolas expulsos. “Quando a gente nem bem pensou, eles chegaram lá, a equipe que foi derrubar, com quatro soldados e um oficial de polícia. Chegaram lá e derrubaram a nossa casa. Nós ficamos lá em baixo da árvore com quinze crianças, inclusive a mãe dessa menina aqui ficou de parto dela, embaixo das árvores sofrendo todas as conseqüências ali, quer dizer uma humilhação muito grande que nós sofremos nesse tempo”, contou Augusto Batista, expulso das margens do rio Arari pelo fazendeiro.
O processo de expulsão violenta das famílias foi gradativo. O estudo da Unamaz e do Incra contabiliza que pelo menos 70 delas já tiveram que se retirar das vizinhanças da fazenda São Joaquim. “Merece destaque o fato de que os quilombolas foram alijados de uma de suas mais preciosas fontes de sobrevivência: a pesca, especialmente aquela realizada nos lagos da região”, acrescenta a ação do MPF. De acordo com os comunitários, a proibição de pescar nos lagos foi imposta pelo fazendeiro.
“Ele prefere ver os urubus comendo os peixes mortos do que a gente pescando, denuncia um quilombola que é um dos poucos a resistir até hoje com a sua família ao lado da área da fazenda, sofrendo ameaças e pressões de todos os tipos. Sebastião Lalor se tornou um símbolo para o restante da comunidade e é citado como exemplo pelo MPF do que pode acontecer se não houver rápida intervenção da Justiça.
“Em sua luta pela permanência na área, Teodoro Lalor de Lima já foi preso inúmeras vezes, de forma injusta e ilegal, bem como foi obrigado a atender diversas ocorrências policiais, sob as mais variadas acusações, que vão desde a suposta prática de crime ambiental, em razão do trabalho de manejo do açaí até o suposto porte ilegal de armas, em razão da utilização de apetrechos voltados à caça para subsistência. Tudo porque resiste em entregar o lugar onde vive”, diz o procurador Felício Pontes na ação.
FOTOS: Rogério Almeida, durante a apresentação da pesquisa no dia 14 de dezembro no sítio do Sr. Lalor.
Helena Palmquist
Procuradoria da República no Pará
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