sábado, 25 de julho de 2020

85 anos de Manoel da Conceição, o lavrador de utopias



Manoel Conceição - Foto|: Marcelo Cruz 

Oeste do Maranhão, dedo de prosa no Centro de Formação do Trabalhador Rural (Central), cidade de João Lisboa. Lisboa foi grande jornalista, historiador e político, filho de Pirapemas, juntinho de São Luís.

O oeste do estado é conhecida como Pré Amazônia maranhense, na ilharga entre a Amazônia e o Cerrado. onde Balsas, já ao sul do estado, puxa Floriano, no Piauí. Balsas representa um polo de soja. O projeto atual é a expansão do monocultivo no Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, ideia materializada no projeto MATOPIBA.

A soja dominada por migrantes do Sul detonou com o Cerrado. É no Cerrado que os rios afloram. A soja, ladeada por outros projetos, expropriou camponeses, alimentou a gusa com carvão, que desenvolveu o trabalho escravo, que turbinou a riqueza em outras paragens, que alimentou o capital e semeou a fome.

A soja se instalou na região anos 1980. Neste período o território da região experimentou uma abissal reconfiguração por conta da instalação de grandes projetos (teerritorialilzação do capital)  baseados em polos de desenvolvimento, além da soja, polo de gusa e a cultura de eucalipto dominaram o ambiente.

Aqui Manoel da Conceição sentou  praça após ter corrido meio mundo. E, correu mesmo. Valendo!. No dia 24, no derradeiro sábado, o semeador de ideias, barricadas em defesa dos trabalhadores e das trabalhadoras em diferentes frentes: sindical, ambiental, educação e sonhos somou 85 anos. A saúde não é das melhores. Mas, para quem encarou prisões, atentados, tortura e o exílio, o combatente segue de pé.

Fim dos anos de 1990 e início dos anos 2000, passei a ter contato com o educador popular inspirado na letra da luta de classes. A gente fazia parte da rede Fórum Carajás, e assim, passei a conhecer o  Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural (Centru). Iniciava-se a minha salvação como ser humano. 

Certa vez, num intervalo de reunião, regado a dois dedos de prosa e pinga, estava eu macambuzio. Mané indagou o motivo da amofinação, dei um despiste, acho. Ele retrucou: “Fique assim não. Você ainda é jovem. Ainda vai morrer várias vezes antes da vida findar. Vais morrer de mal de amor. Morrer de decepção de “amigos”, morrer de desencantamento com companheiros e políticos. Morrer de mil coisas. ”   Nunca esqueci da prosa e da sabença.

No recente livro de memória lançado pelo igualmente combatente camponês Luiz Vila Nova, é recorrente a referência ao educador popular Manoel da Conceição, como estrategista sagaz na luta pela terra, Ouvi umas prosas dessas de táticas de guerrilha. Vila enxerga na prosa e na canção elementos poderosos de formação. É dele o verso que reza: "O risco que corre o pau corre o machado. Não temos o que temer. Aquele que mata, também pode morrer". 

No dia do natalício de Mané, na véspera do Dia do Trabalhador Rural, o MST fez uma ciranda remota em loa ao mestre. Falou peão de trecho, falou companheiros de batalha da luta sindical, falaram filhos, a esposa, a neta recitou poema. Falou gente de paletó e pé rachado da roça, dirigente sindical e educador. Falou João Pedro do MST, inté o governador.

Manezinho, o filho educador, assim o resumiu: “Mané é isso, coletividade e luta, Mestre da esperança, um educador popular, um mestre da vida. A luta contra todas as formas de opressão, dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, de negros e mulheres, de toda forma de  adversidade. O que nós estamos fazendo hoje, agora, é uma poesia coletiva. Mané é um semeador. “

Veja a live AQUI

Quando Mané somou 40 anos de luta, o IBASE publicou uma reportagem sobre o maranhense que foi um dos fundadores do PT nacional, da CUT, do Centru e do Cetral, etc...Leia AQUI

segunda-feira, 20 de julho de 2020

95 anos de Clóvis Moura, pensador negro e nordestino que refletiu sobre a quilombagem

Clovis Moura principiou seus estudos militantes acerca da questão da resistência negra e escravista no Brasil na década de 1940, redigindo aos 34 anos “Rebeliões na Senzala”, obra que se tornaria um clássico da historiografia e análise sociológica marxista brasileira. Esta é a primeira de suas grandes obras, publicada em 1959, e declara guerra contra toda a interpretação simplista, rasteira e racista sobre a forma como os negros e negras enfrentaram o sistema de dominação escravista. O livro é o extremo oposto das teses contidas em “Casa Grande e Senzala” e, por sua profundidade crítica e analítica, encontrou grande resistência das organizações de esquerda e inclusive dentro do PCB na época e na chamada “Sociologia oficial” difundida pela academia. Considerado um autor importante para estudo das relações raciais no Brasil nos EUA, também foi traduzido em vários outros idiomas, tendo grande repercussão inclusive na China. Leia artigo completo AQUI

domingo, 19 de julho de 2020

Pará lidera mortes de quilombolas no país.


Organizações quilombolas e Ufopa monitoram a situação da pandemia em comunidades no estado



Até o dia 19, domingo, o Pará contabilizava 38 óbitos de quilombolas, 1495 casos confirmados, 1108 casos suspeitos, 969 casos recuperados e 02 pessoas internadas. O estado lidera os casos no Brasil, que soma 137.  

Os números constam no boletim  produzido pela Malungu (Coordenação Estadual das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombo do Pará) e a Ufopa (Universidade Federal do Oeste do Pará), a partir do Núcleo de extensão Sacaca, coordenado pela professora Luciana Carvalho, do curso de Antropologia.  

A coleta dos números é ativada a partir de uma rede mobilizada junto às lideranças comunitárias. Os dados podem ser bem maiores, esclarece a coordenação da iniciativa. O poder público não tem realizado ações e monitoramento com relação às populações indígenas, quilombolas e similares. Nem mesmo monitorar. 

O Pará tem aproximadamente 550 comunidades quilombolas, distribuídas em 65 municípios, com uma população estimada em 400 mil pessoas. Em todo o Brasil calcula-se em 5 mil comunidades de remanescentes de quilombos.

O quadro pode se agravar por conta dos vetos do governo federal ao socorro emergencial a indígenas e quilombolas. Acesso á agua, álcool gel, cesta básica, saúde, materiais de higiene, cesta básica  foram alguns dos pontos vetados pelo  do governo Bolsonaro no dia 08 de julho ao PL 1142/2020.

O projeto foi  construído a partir das representações politicas de indigenas e quilombolas em dialogo com os parlamentares Rosa Neide (PT/MT), Joênia Wapichana (Rede/RR) e  Rondolfo Rodrigues (Rede/AP). 

“A medida expressa  o que representa este governo para nós quilombolas. Um governo de morte. Uma ação de aquinilação do nosso povo”, reflete Valéria Carneiro, quilombola do município de Salvaterra, no Marajó, no estado do Pará, durante live que debateu a vulnerabilidade das comunidades quilombolas no estado. O evento remoto ocorreu na última sexta feira, dia 17.

O debate  é uma iniciativa da Malungu e do Núcleo Sacaca, que contou com a reflexão da professora Zélia Amador, emérita professora da UFPA, e uma referência nacional no combate ao racismo. Para a educadora a condição de vulnerabilidade e de empobrecimento das comunidades quilombolas resulta de uma construção econômica, política e social ancorada no racismo. Uma negação da vida.

O racismo, nos tira as oportunidades de vida digna, escolaridade, saúde e de uma cidadania plena. O racismo se estabeleceu com o colonizador. Foi a colonização que decidia quem era humano e quem não era. Desde sempre a nossa luta é cotidiana na afirmação na nossa humanidade. Desde a diáspora fomos transformados em mercadoria e em máquina. Não éramos pessoas.  A nossa luta é antirracista.  Todo dia”, interpreta Amador.

Sobre o Pará liderar os casos, ela avalia que os quilombolas não possuem condições materiais em se guardar. Muitas das vezes são obrigados a se deslocarem em busca de serviços nas sedes dos municípios. “O racismo é uma mazela que mata. Em pleno século XXI ainda lutamos para conquistar a nossa humanidade”, arremata.

Em plena contemporaneidade as comunidades quilombolas buscam ter acesso a água potável, serviço de saúde, as suas terras reconhecidas, educação, adequada à nossa realidade,  condições para a produção, alerta a quilombola Gilvania Silva, doutoranda da Unb e integrante da coordenação da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas).

“Nenhum órgão de estado monitora as nossas situações de vulnerabilidade. Isso resulta de um racismo estrutural. Vivemos num governo de morte. Um governo genocida. Isso foi declarado logo no início do governo. Ele anunciou que não reconheceria terras de quilombos e indígenas. Esvaziou as instituições, cortou orçamento, cancelou concursos, nomeou pessoas sem compromisso e capacidade técnica para tratar das nossas demandas” avalia Silva.

Ao avaliar a situação de vulnerabilidade das comunidades quilombolas no Pará , José Galiza,  representante da Conaq no estado, calcula que a situação de empobrecimento, a localização, muitas das vezes de difícil acesso, a necessidade em buscar renda para além dos limites territoriais são elementos que favorecem a circulação do vírus.

Galiza acredita que pelo fato de algumas comunidades possuírem um grande apelo turístico, por conta dos recursos naturais com igarapés, rios e florestas, isso também colaborou para o aumento da pandemia nas comunidades.

‘Já estávamos a margem mesmo antes da pandemia. A crise só piorou tudo. Já éramos empobrecidos, com a pandemia, a pouca renda diminuiu ainda mais. Precisamos unir forças. Necessitamos de apoio de todos no combate do racismo”, encerra o quilombola do município de Acará.

Veridiana Nascimento, professora da Universidade Federal do Amapá (Unifap), enfermeira e voluntária no projeto, que pesquisou comunidades quilombolas na região do Trombetas, no Baixo Amazonas, avalia com preocupação o registro de 27 casos por dia de confirmação do vírus.

Para a pesquisadora o quadro de vulnerabilidade é um desdobramento de ausência de políticas públicas para as comunidades, que resulta em não instalação de unidades de saúde ou a prestação de serviço de um agente comunitário, sequer. “ Há locais que, assim como muitas favelas do país, não contam nem com água potável. Como ter medidas de prevenção de higiene e prevenção? ”, indaga Nascimento.

A live pode ser acessada AQUI

Debates territoriais: obra de grupo de pesquisa da UFOPA reflete sobre dinâmicas do Baixo Amazonas

A publicação reúne pesquisas oriundas de monografias de graduação e artigos de docentes e discentes da Ufopa, além de convidados externos, que trazem análises de políticas agrárias, agrícolas, aquícolas, educacionais, logísticas e ambientais e seus impactos no ordenamento territorial na região do Oeste paraense. Segundo o Censo Demográfico do IBGE (2010), a região abrange cerca de 500 mil km2, com uma população de mais de 800 mil habitantes. É um território dividido em duas porções: o Baixo Amazonas, localizado ao norte e de ocupação mais antiga; e o Tapajós, composto pelos eixos da Transamazônica e da BR-163. Baixe  o LIVRO

Vulnerabilidade Quilombola no PA: Ufopa, a partir do projeto Sacaca e comunidades debatem o tema

O pará lidera casos de Covid em comunidades quilombolas no país. 

O projeto de extensão “Sacaca e Malungu na luta contra o coronavírus nos territórios quilombolas do Pará” inicia o Ciclo de Debates “Vulnerabilidade histórica e futuro das comunidades quilombolas do Pará pós-pandemia”. A programação inicia-se nesta sexta-feira, 17h, com a mesa-redonda “Por que o Pará é "campeão" de casos de Covid-19 em comunidades quilombolas no Brasil?” no canal do Sacaca no Youtube. Leia mais AQUI