sábado, 18 de maio de 2019

Mineração em Carajás: movimentos sociais realizam mais uma rodada de debates sobre impactos


O evento ocorre na sede do SINTEPP de Canaã dos Carajás

Mineração em Carajás-PA

Prestes a Vale contabilizar mais um crime ambiental nas Minas Gerais, inicia hoje na sede do Sindicato dos Trabalhadores na Educação Pública do Pará (SINTEPP), em Canaã dos Carajás, sudeste do Pará, mais uma rodada de diálogos sobre os impactos da mineração na região.

O objetivo do evento, que ocorre durante os dias 18 e 19 é a promoção de informações sobre os impactos da mineração nas principais cidades da região, Parauapebas, Marabá e Canaã dos Carajás. A última abriga nos dias atuais o maior projeto de extração de minério de ferro da Vale, o S11D.  

Inesc, Sintepp, Cepasp, Movimento pela Soberania na Mineração (MAM), MST, Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR) estão entre os organizadores. O educador popular Raimundo Gomes (Cepasp), os professores da Unifesspa Fernando Michelotti e Rogério Miranda, Batista Afonso (CPT de Marabá), Daniela Castro (PUC/MG) estão entre os animadores dos debates que busca dialogar com o conjunto da sociedade local. Saiba mais AQUI

quinta-feira, 16 de maio de 2019

Mineração em Pauta - Charles Trocate do Movimento pela Soberania na Mineração avalia o que representa a concentração da economia nacional na base de exportação de produtos primários


“A Vale S/A organiza o modelo de mineração no Brasil, portanto deve ser responsável pela ´imprevisibiidade” que ele provoca”

Mineração em Carajás/PA

A exportação de commodities representa a base da economia nacional. Soja e minério de ferro são os principais produtos da balança comercial, o que não representa a possibilidade de horizonte de desenvolvimento para o país. Muito pelo contrário, aprofunda a condição colonial como exportador de produtos primários, concentra terra, renda e socializa todo tipo de desgraça ambiental para o conjunto da sociedade, como os crimes ocorridos em Mariana e Brumadinho/MG, e Barcarena/PA. Na avaliação de Charles Trocate, Integrante do Movimento pela Soberania Popular na Mineração-MAM, o modelo colapsou e a sociedade necessita de criar alternativas.

FURO: Qual o pano de fundo da atual fase da indústria da mineração no Brasil?
Charles Trocate: Há muitas transformações no interior da sociedade e na organização do sistema mundo capitalista e sua rede ideológica estimulando a inevitabilidade do capital, redução do estado, privatização e leis de mercado. Toda essa austeridade sistêmica provocou reações atípicas numa mineração industrial fundada no pós-guerra com agitações políticas de âmbito nacionalista que marca o nascimento da CVRD como empresa estatal.
Se pensarmos que todas as empresas eletrointensivas e poluentes estão alocadas no sul e não no norte do globo, isso tem como questão de fundo, a razão de sermos uma sociedade submetida pelo capitalismo periférico e dependente e, portanto, produtores de matéria prima para as economias industrializadas.
Nesse sentido, o que está por trás dessa fase destrutiva da mineração é uma tríade, que desmontou a primeira e que se inicia nos anos de 199o, suas raízes mais evidentes a meu ver, são o Plano Econômico Real de 1994, quando hipotecamos os nossos recursos naturais em nome do equilíbrio da balança comercial e geração de superávit primário, porque, convenhamos o [Fundo Monetário Internacional-FMI] não emprestaria dinheiro para nos livrar da hiperinflação que tem origem na ditadura militar, caso o Brasil não efetivasse uma segurança jurídica aos capitalistas transacionais.  Seguido disso, vem a Lei Kandir, de 1996, que isenta de pagamento de imposto todo produto para exportação. É esta lei que vai originar a crise do pacto federativo como também a crise fiscal dos estados exportadores, assim como dela também deriva a PEC do congelamento dos gastos públicos quase 2o anos depois, em 2017 durante o governo Temer.
Veja, se situamos a mineração em dois parâmetros, de um lado ela está estruturada apenas para gerar equilíbrio da balança comercial, e não desenvolvimento local e regional como se disseminam, estas regiões ficam fora da maior parte da renda da mineração e do outro a maximização dos lucros transacionais com a existência de uma lei como é a Lei Kandir, além de  um conjunto de substantivos jurídicos, grandes incentivos fiscais, sonegação de imposto e evasão de divisas.
E por fim, no que estou querendo afirmar, entra o terceiro fator, que é a privatização da CVRD em 1997, que em maio, dia 6 agora, completou 22 anos da sua transferência para o capital financeiro animada pelo ideário da economia de mercado. A falta, mesmo com todos os limites do estado brasileiro, de um maior controle, colabora de maneira contundente para a flexibilização das leis ambientais para empreendimentos da Vale SA. e das suas associadas e por outro lado, transforma a obtenção do lucro extraordinário dos acionistas num vale tudo. Devemos mirar nesses pressupostos que estruturam essa fase, a luta de classes na mineração do território ao mundo do trabalho, a transformação e a circulação do objeto industrial passam por estes sustentáculos.
FURO: Mais esse sistema não entrou em colapso em menos de três décadas?
Charles Trocate: É possível dizer que sim, em parte, mas continua sem controle. As transformações nas economias globais, a busca pelo controle das fontes energéticas do globo entre EUA e a China, impuseram à África e a America Latina, e nesse caso, com destaque para o Brasil, um super ciclo de mineração. É a exterioridade sistêmica. Estudos apontam que a atividade minerária cresceu dos anos de 2oo3 a 2o12 aproximadamente 460% e desse ponto vista sim, colapsou e entrará em derretimento. É incalculável o desperdício de natureza que essa fase produziu, só em três eventos poderíamos assinalar esse colapso: vazamentos de poluentes no polo petroquímico em Barcarena no [PA], rompimentos de barragem em Mariana e agora Brumadinho em [MG]. São rupturas metabólicas impossíveis de mensurar e valorar em finanças.
No entanto é necessário dizer que colapsou em parte, no complexo do eixo sul da mineração, que compreende os estados de Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro. Nessa região a mineração, ou a minério dependência dilui na economia e na política alternativas que não passe pela condenação, e isto, às vezes implica deixar de ser, desaparecer, de quem ganhou com isso. As chantagens [antigas e recentes] das mineradoras devem ser questionadas pela mobilização popular pela saída da economia do minério dependência.
Na ponta desse colapso está à ampliação do sistema norte, a mineração na Amazônia paraense, pois o polo de estrangulamento só mudou de geografia, a Vale continuará a bater todos os recordes de exportação na Amazônia nas minas de Carajás e Canaã dos Carajás, em particular na mina do projeto S11D, no sudeste paraense. É preciso em nome de algum projeto civilizatório futuro, conte-la. Os amazônidas e a sociedade de modo geral precisam conter o antropocenismo da Vale SA!
FURO:  Com os crimes técnicos científicos da Vale há mudanças em curso no modelo mineral Brasileiro?
Não.  A Vale representa um bloco de poder, no poder, ela independe das conjunturas políticas internas e os tecnocratas dentro e fora do país atuam de livre arbítrio. É impossível contê-la com leis nacionais, e até mesmo internacionais. Ela é uma mescla dessa difícil conjuntura política que estamos atravessando. Ela controla o imaginário social, e até parte da nossa democracia de baixa intensidade. Não tivemos chance pela intransigência da Vale de abrir uma CPI mista no Congresso Nacional para averiguar o crime de Brumadinho. É perceptível que houve um esvaziamento do debate parlamentar.
Mais é preciso insistir que mesmo a frágil lei nacional ganhe algum sentido nessa conjuntura e que recoloque a questão da justiça social e ambiental como protagonista.
 A Vale SA. organiza o modelo de mineração no Brasil, portanto deve ser responsável pela ´imprevisibiidade´ que ele provoca.
E sobre perspectivas que se ajustam há esse tempo teremos que fazer lutas que pressupõem agendas dos anos 9o, sem querer reduzir as contradições do modelo de mineração, vejo que a lei Kandir é o calcanhar de Aquiles dessa atual fase da mineração e da Vale SA. É preciso desmontá-la urgentemente!
E ao mesmo tempo possamos refazer o nosso sistema de mineração, qual o modelo se adéqua a esse período, que reflita na sociedade, na natureza e na economia de outra forma, que não seja essa que podemos tomar como fracasso total.