quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Pistolagem e grilagem no Pará: é terra grilada a fazenda Santa Tereza, acusam defensores da reforma agrária


Rafael Saldanha grilou terras de antigos  castanhais, e não cumpre função ou respeita a reserva legal 


 Resultado do ataque de pistoleiros ao acampamento do MST em Marabá, no sudeste do Pará - foto das redes sociais

Na noite da última sexta feira, cerca de 20 pistoleiros fortemente armados, contratados pela família Saldanha, invadiram o acampamento do MST, localizado nos limites da Fazenda Santa Tereza, município de Marabá e, por cerca de uma hora, aterrorizaram homens mulheres e crianças que se encontravam no local.

O grupo armado chegou anunciando que eram policiais e usavam uniformes e armas iguais às usadas pela polícia. Dezenas de tiros foram disparados, várias pessoas foram espancadas, celulares e dinheiro foram roubados, documentos pessoais, utensílios, motos e carros foram queimados. Pela forma como se desencadeou a ação violenta, o MST não tem dúvida da participação de policiais civis e militares na operação criminosa. Dezenas de policias civis e militares do sul e sudeste do Pará tem extensa ficha criminal por atuarem como pistoleiros a serviço dos fazendeiros da região.

A imprensa local, controlada pelos latifundiários, sempre que se refere ao fato afirma que é uma fazenda titulada e produtiva. Na verdade, o título de propriedade expedido pelo ITERPA referente à Fazenda Santa Tereza, foi resultado de uma fraude grosseira. Analisando o procedimento administrativo 2011/76613 que tramitou no ITERPA, constatamos inúmeras ilegalidades. De acordo com o Art 1º do Decreto 1.805/2009, o prazo para o resgate dos títulos de aforamento era até 23 de julho de 2009, no entanto, o pedido de resgate da área data de 23 de julho de 2010. O requerimento foi feito pelo fazendeiro Rafael Saldanha de Camargo, que não reunia a condição legítima de enfiteuta, já que o Estado do Pará não havia sequer aprovado a transferência de aforamento do foreiro anterior para ele. Nesse caso, o correto era o Estado recuperar o domínio útil da área, utilizando o direito de opção, nos termos do disposto no Art. 41 da Lei 913/1954 e destiná-la para o assentamento das famílias.

No procedimento administrativo de titulação não há certeza quanto a correspondência entre o título de aforamento e o imóvel pleiteado, havendo três pareceres no processo, informando que a área pleiteada não corresponderia a área do título de aforamento, mesmo assim, o ITERPA decidiu expedir o Título.

O artigo 8º, III da Lei 7.289/2009, proíbe a regularização de imóveis onde há conflito social. Na data do protocolo do pedido de regularização, já havia conflito na área com o processo nº 0006106-17.2008.8.14.0028 tramitando na Vara Agrária de Marabá. Mesmo tendo conhecimento da existência desta ação na Vara Agrária, o ITERPA prosseguiu com o processo de titulação.

Devido o imóvel possuir área de 2.600 hectares, o Estado precisaria de autorização do Congresso Nacional, nos termos do disposto no Art.188, §1º da Constituição Federal. No entanto não houve sequer consulta ao Congresso.

Não havia meio legal para requerer o resgate do título de aforamento mediante a via dita normal, já que isso só é possível nos casos em que não houve desvio de finalidade. No caso da Fazenda Santa Tereza, o desvio de finalidade ficou comprovado no próprio procedimento do ITERPA (transformação da área de extrativismo para pecuária extensiva, desmatamento ilegal, destruição das matas ciliares e nascentes, etc), mesmo assim o fazendeiro Rafael Saldanha foi beneficiado pelo Estado com uma benesse tão absurda que ele próprio (o fazendeiro) não teve coragem de pedir em seu requerimento inicial e não o fez em nenhum momento do procedimento administrativo.  Desvio de finalidade que fundamentou a sentença do juiz da Vara Agrária de Marabá na ação possessória, na qual, negou a reintegração de posse ao fazendeiro, alegando que: “Mesmo assim, nessa condição de detentor, a função social não foi satisfeita, em vista da utilização e exploração irregular das áreas de reserva legal e de preservação permanente, conforme constatado nos autos”.

Todos esses fatos já foram levados ao conhecimento do Ministério Público através de denuncia. O MST aguarda agora o protocolo da ação de cancelamento do título de propriedade que foi expedido mediante essa fraude e que o imóvel seja revertido ao patrimônio público estadual.

O MST e as entidades que assinam essa nota exigem que todos os responsáveis por essa ação criminosa sejam identificados e punidos.


Marabá, 31 de julho de 2018.

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST.
Comissão Pastoral da Terra – CPT da diocese de Marabá.
Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB.
Centro de Assessoria Sindical Popular – CEPASP

segunda-feira, 30 de julho de 2018

Pistolagem no Pará: o grileiro Rafael Saldanha foi o responsável pelo ataque contra o MST em Marabá, no acampamento Hugo Chavez


Apesar de noticificada,  a PM não tomou nenhuma providência, acusa nota das Brigadas Populares




imagens retiradas das redes sociais



Com 450 famílias, no ano de 2014 o MST organizou e realizou a ocupação de uma área denominada fazenda Santa Tereza, no município de Marabá, no sudeste do Pará. A área havia sido apropriada por membro da família Mutran e há poucos anos repassada ao grileiro Rafael Saldanha.

Rafael Saldanha é um dos maiores usurpadores de terras públicas no sudeste do Pará, membro do grupo que articula policiais, milícias e pistoleiros para atacar trabalhadores rurais na região, é suspeito de participar da articulação que na década de 1990 mandou assassinar duas lideranças do MST, Fusquinha e Doutor.

Em novembro e dezembro de 2017 sob o comando do juiz da Vara Agrária de Marabá e da polícia militar do Estado, especializada para fazer os brutais despejos no campo, foram feitos despejos de entorno de 2.000 famílias, de suas áreas, para atender os interesses dos latifundiários.

Dentre estas áreas das famílias despejadas foi atingido o acampamento Hugo Chaves, com 450 famílias, que se deslocaram para área próxima onde tem escola que pudesse as crianças continuarem estudando até o final do período letivo.

No dia 26 de julho, após o dia de comemoração do trabalhador rural, as famílias resolveram retomar a área de onde foram despejadas. Na madrugada do dia 28, quando ainda estavam instalando os barracos do acampamento, as famílias foram surpreendidas por um contingente de homens que chegaram atirando e gritando para que todos deixassem o acampamento.

Foram três horas de terror. As famílias desprotegidas, em desesperos iam abandonando os barracos ao mesmo tempo em que os pistoleiros derrubavam e ateavam fogo, sem que as pessoas pudessem tirar seus pertences. Movidos pela fúria de destruição os pistoleiros atearam fogo também nos veículos que ali se encontravam (carros, motos...).

A direção do movimento recorreu à Delegacia Especial de Conflitos Agrários. O Delegado deixou claro que não iria intervir, segundo relato de uma das coordenadoras do movimento. Há denúncias da participação de policiais da DECA nessa covardia contra as famílias acampadas.    

Não temos dúvidas de que esta ação faz parte do plano montado para a região no qual fazem parte latifundiários, governo do Estado e empresários reacionários, para destruírem com a luta camponesa no Estado do Pará. É tanto que recentemente o candidato a presidente da república, Bolsonaro, juntamente com o ultra-reacionário deputado federal Elder Mauro, fizeram um comício na curva do S conclamando os fazendeiros a destruírem os movimentos da região.

Curva do S, símbolo da resistência camponesa da região, onde em 1996 o governo do PSDB autorizou o grande massacre de militantes do MST, com o assassinato covarde de 19 trabalhadores. Assim como também, no governo do PSDB, em maio de 2017, 15 policiais, também de forma covarde, assassinaram 10 trabalhadores e uma trabalhadora, no município de pau D’Arco, no sul do Pará. Os policiais assassinos estão soltos para mais execuções.

Nós, das Brigadas Populares, repudiamos esses atos covardes e assassinos! Repudiamos o papel do Estado em defesa do latifúndio e omissão em defesa dos trabalhadores! Conclamamos todos os movimentos sociais, sindicatos, estudantes e professores, para uma grande unidade em defesa da luta camponesa e pelo fim do latifúndio!
Mátria Livre!
Venceremos!
Marabá, 30 de julho de 2018.
Brigadas Populares - Pará


domingo, 29 de julho de 2018

Luta pela terra no Pará: dedo de prosa sobre pistolagem e resistências camponesas


Massacres e ataques contra sem terra  marcam a história de luta pela terra no sudeste do estado, bem como a resistência camponesa
 
“ A gente é que nem bambu, verga, mas não quebra”.  A máxima fazia parte da oratória de sindicalistas ligados à luta pela terra na bacia do Araguaia-Tocantins. É terra encharcada de sangue de posseiro. É terra onde mais se matou gente na peleja da luta pela terra no Brasil desde os anos de 1980. Período considerado o mais violento. 

Passados mais de 40 anos, a violência se mantém, a exemplo dos ataques de pistoleiros no acampamento Hugo Chaves, na cidade de Marabá, ocorrido na madrugada do último dia 27. 

Barracos, lavouras, roupas foram queimados e os sem terra ligados ao MST expulsos. Não é a primeira vez que o episódio ocorre. Soma-se ao fato, a chacina de Pau D´arco, ocorrida em maio de 2017, que terminou com o massacre de dez sem terra ligados à Liga dos Camponeses Pobres.  

Ao se deparar com as presentes ações, soa que estamos a visitar registros de jornais da burguesia e boletins populares que denunciaram a grilagem de terras, violência de pistoleiros e policiais da década de 1980, entre eles o Jornal Resistência e o Grito da PA 150, este último produzido na região de Marabá.

O cenário externaliza a fragilidade da nossa democracia. Sob o caos fundiária, morosidade e anuência do judiciário, coerção pública e privada, endosso de cartórios uma imensidão de terras foi grilada. Mas, apesar das adversidades, parte deste campesinato da fronteira se territorializou. 

Tanto resultado da organização dos “de baixo”, quanto pelo movimento contraditório do capitalismo, que o cria e recria.  Ele controla mais de 52% de mais de 30 municípios do sul e sudeste do estado Pará. São mais de 500 projetos de assentamento.

Assim, sob o decreto de número 3938, no dia 15 de janeiro de 1987, numa área de 5.058.4728 hectares foram assentadas 92 famílias do que veio a ser o primeiro PA da reforma agrária no sudeste do Pará, o Castanhal Araras, localizado no município de São João do Araguaia.  Dava-se o início da desconstrução do que ficou conhecido como polígono dos castanhais. Fruto de atos de ocupação por posseiros da terra indígena do povo gavião e inúmeros acampamentos em órgãos públicos. 

Cupuaçu, castanha do Pará, pupunha, açaí constavam na flora do lugar. Um experimento de modelo de organização social e política através de fomento de caixa agrícola, organização de movimento de mulheres, realização de festival ecológico foram realizados no PA Araras, 40 km de Marabá. A ONG Centro de Educação, Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular (CEPASP) foi um dos principais animadores no PA. 

Pelo pioneirismo a comunidade acabou por servir de berço a vários dirigentes que ocuparam e ainda ocupam cargos na Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará (Fetagri) e na central de cooperativas da região. Conseguiu eleger vereadores e até um vice-prefeito. A experiência de Araras se alastrou para os municípios vizinhos de Nova Ipixuna e Eldorado do Carajás.  

O prognóstico na fronteira não previa a permanência do campesinato. Sucedia afirmar que o mesmo seguiria em itinerância cedendo lugar à “eficiência capitalista”. Mas, o que se desnudou no sudeste seguiu o sentido contrário,  partir da mediação de frações da Igreja Católica, partidos políticos, intelectuais orgânicos, ONGs, e por aí vai, feito bambu, que verga, mas, não quebra.