Quem
hoje é vivo corre perigo dos inimigos do verde, da sombra, o ar.
A parada
fundiária/agrária é um dos maiores abacaxis no mundo Amazônia. E, em torno dele
um catatau de redes de ilegalidades flutua. Este angu de caroço mobiliza escritórios
advocatícios com más relações com a ética, grileiros de terras de variadas
cepas e estampas daqui e de outras paragens, pistolagem travestida de empresa
de segurança, funcionários públicos em desalinho com o interesse público, e um judiciário
vigiante, ligeiro e engajado na manutenção e engorda do status quo.
Tenho dito. Nada de novo
no front. A grilagem de terras na região é um livro aberto escrito a sangue dos
mais ferrados da cadeia alimentar dos dias e noites darwianas em que
sobrevivemos. Sangue jorrado sobre as togas e ternos da fina flor da sociedade,
em particular na década de 1980.
Anos em que as ações da
União Democrática Ruralista (UDR) desembestaram a matar gente. A tropa de elite
dos fazendeiros foi forjada em terras do Goiás sob a batuta de Caiado. Nesta
época Dorothy desenvolvia atividades justo na região onde mais se matou
camponeses na Amazônia, o sudeste do Pará, na quebrada de Jacundá. Ali pertinho
de Marabá. Literalmente, o bicho comia.
Até escritório de pistolagem havia. Sebastião da Terezona e Quincas Bonfim eram
os “trezoitão” de fama.
Levanto a bola para
rabiscar porcas linhas sobre a prisão do migrante religioso, agente pastoral da
Comissão Pastoral da Terra (CPT), padre Amaro. O maranhense foi parça da
missionária estadunidense executada em 2005, Dorothy Stang. Com a execução da
missionária, caiu no colo dele a pelota em tocar o barco na quebrada.
Ele foi enquadrado e
encarcerado por três meses sob acusações similares que tentaram colocar Stang
para ver o sol nascer quadrado na escaldante cidade de Anapu, no ano de 2004. Num
junho de 2004 o agronegócio a denunciou na justiça por formação de quadrilha,
armar camponeses e esbulho possessório, e por aí vai. Ela depôs na “puliça” e
tudo. No caso de Amaro, turbinaram com lavagem de dinheiro e abuso sexual.
O crime Amaro reside em
ser aliada dos mais desvalidos no sertão amazônico, em território agudamente
disputado por grandes corporações de diferentes setores, entre eles os de
infraestrutura, pecuária, mineração, etc. Assim como Amaro, tem um balaio de
gente de várias frentes sendo enquadrada à régua e ao compasso da “lei” a serviço
do deus mercado.
No rosário de criminalização
pela luta por direitos existem ativistas do MAB, MST, professores, assessores,
advogados. A quebra de braço entre as
grandes empresas e as populações locais agrupa corporação do quilate da Vale,
que literalmente manda no estado do Pará. Ela sozinha processa meio mundo de
gente, são mais de 170 nos estados do Maranhão e no Pará.
Com relação à justiça são
emblemáticos alguns fatos ocorridos com relação às disputas territoriais nos grotões
amazônicos no interstício da prisão do padre Amaro. O Massacre de Pau D´arco
somou um ano de impunidade, os policiais envolvidos no episódio foram mandados
para casa, o juiz Marco Aurélio Mello da suprema corte mandou soltar Regilvado
Pereira Galvão, vulgo “Taradao”, o mandante da execução de Stang, condenado a
25 anos de prisão, e a “puliça” expulsou camponeses da região do Marajó de
acampamento.
O direito privado romano
é foda. A peleja para se levar um acusado em matar camponeses e seus apoiadores
é dura. Chega, em alguns casos, a durar mais de 20 anos, como os casos da
família Canuto e de Expedito Ribeiro. Sejamos vigilantes. O rio não tá pra
peixe.
E, desde os anos 1990
tudo parece mais nublado nos cenários sobre a região. A nova fase do capital tende
cada vez a subordinar as terras e as riquezas cá existentes aos seus
interesses. Afinal, o que foi a medida em normatizar o uso de veneno?
Rodovias, hidrovias,
ferrovias para incrementar a cadeia da soja, um pacote de hidrelétricas de
diferentes portes, mineração, e por aí vai, colocam em xeque o futuro da
floresta, dos rios e as suas gentes.
Como diz a canção: “ quem
hoje é vivo corre perigo dos inimigos do verde, da sombra, o ar..” Oxalá proteja Amaro e a todos nós!
Texto parido ao som do
disco Deus é mulher – Elza Soares