sábado, 13 de dezembro de 2008

O legado de Chico




Qual o legado de Chico Mendes, passadas duas décadas de sua morte? O empate se constituiu como uma estratégia que os seringueiros encontraram para enfrentar o desmatamento provocado pela pecuária.

Assim germinaram as ações e os debates que vieram a desaguar numa política pública de unidades de conservação. No primeiro momento foram as Reservas Extrativistas (RESEX), que no decorrer do tempo ganhou outros desdobramentos com várias modalidades.

Isso se desenvolveu num contexto do regime militar e posteriormente na transição política, quando o Estado exerceu papel como indutor da economia através de uma política de renúncia fiscal.

Os camponeses da floresta protagonizaram a história num embate com o Estado, as representações do poder econômico local e fora da região, como o frigorífico Bordon, sediado em São Paulo, como esclarece o documentário Quero Viver (1989), de Adrian Cowell.

Na seiva da luta nasceu o Conselho Nacional de Seringueiros (CNS), o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), entre tantas redes de mobilizações da região.

Após a efetivação da reserva, a inquietação pela educação, saúde, cooperativismo e políticas de desenvolvimento voltadas para a reprodução do povo passava a ser a agenda de luta.

Hoje as Resex´s representam 4.4% do território da Amazônia, são cerca de 80, onde vivem milhares de pessoas. A peleja do homem da floresta do Acre ganhou o mundo.

Por conta da construção da BR 364, que abre a região para o pacífico, Chico foi aos states argumentar com representantes do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), sobre os impactos sociais e ambientais que a construção da rodovia resultaria.

Tal ação é colocada como um dos motivos da execução de Chico Mendes no dia 22 de dezembro de 1988 pela família Alves.

Ocorre pontuar que ainda que as condições fossem as mais adversas, os viventes dos seringais lograram em definir um território, desenhar um sinal de desenvolvimento onde eles sejam os agentes principais.
Chico não inventou a roda. Mas, tinha a vantagem de ter comungado da convivência de um refugiado político que colaborou no seu aletramento. Chico herdou a trajetória do seringueiro Wilson Pinheiro, entre outros.

As singelas pinceladas sobre o universo de Chico foram colhidas na sessão especial, coordenada pela antropóloga Mary Alegretti, que conviveu com o seringueiro entre 1981 a 1988.

A homenagem ao ambientalista Chico Mendes ocorreu no Seminário Internacional Amazônia e Fronteiras do Conhecimento, organizado pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA), da Universidade Federal do Pará (UFPA), que celebra 35 anos de ensino, pesquisa e extensão.
A homenagem foi no dia 10, no salão de eventos Carajás, em Belém, no hotel Hilton. Contradição?

O gado na RESEX - inúmeros meios de comunicação têm noticiado com alarde a presença de gado na reserva Chico Mendes. Descuidando de sublinhar que desde os primevos tempos a atividade da pecuária foi um dos pólos de desenvolvimento agendados para a integração da região ao resto país, ao lado de incentivos à atividade madeireira e mineral. E que mesmo sem o incentivo do governo, o gado convivia ali.

Cristiane Ehringhaus, que defendeu tese de doutorado sobre a Resex Chico Mendes, adverte que no contexto atual da reserva o gado ganhou no imaginário local status de riqueza e poupança, que antes era exercido pela seringa.

Para se manter gado, faz-se necessário desmatar, e isso ocorre, mas, não em grandes proporções salienta a pesquisadora.

Ehringhaus sinaliza ainda que a atmosfera do lugar é de especulação da fundiária e que muito se deve à presença de migrantes oriundos do Sul do país e à má vontade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), que boicota as resex's.

Os indicadores da pesquisa apontam entre 60 a 80% da população afirma que melhorou de vida e de renda, que 80% se sentem seguras na terra e que entre 80 a 90% desejam ficar na resex.

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